Etiópia quer fornecer a Europa

O país africano, que perdeu, o ano passado, o acesso preferencial aos EUA, tem feito mudanças para cumprir as exigências de sustentabilidade ambiental e social e acredita ter condições para servir o mercado europeu.

[©Hawassa Industrial Park Investors Association]

Hibret Lemma, CEO da organização sem fins lucrativos Hawassa Industrial Park Investors Association, acredita que a Etiópia é uma boa opção de sourcing para os compradores europeus de moda. Como explicou durante a sua intervenção num painel dedicado ao sourcing em África, que teve lugar na feira Source Fashion, desde que o país perdeu o acesso preferencial ao mercado americano, sob a égide do African Growth and Opportunity Act (AGOA), muitos produtores estão a tentar diversificar.

A Etiópia começou a reforçar a sua indústria têxtil e vestuário em 2015, quando o governo identificou o sector como um dos principais motores para a geração rápida de emprego. Para isso, criou incentivos e construiu parques industriais como o Hawassa Industrial Park para atrair investimento estrangeiro, revelou Hibret Lemma, citado pelo Just Style. Empresas como o PVH, que detém a Tommy Hilfiger e a Calvin Klein, decidiram investir (embora a unidade tenha fechado em 2021 após o anúncio da saída do país do AGOA).

Segundo Hibret Lemma e Ravi Jayathilaka, diretor-geral da empresa Sumbiri Hela Intimate, que também participou neste painel, os esforços governamentais tiveram resultados extraordinários, afirmando que desde 2017 a Etiópia terá registado um aumento de quase 50% nas exportações de têxteis e vestuário.

No entanto, a pandemia e o conflito interno no país, que levou à saída do AGOA, tem afetado o crescimento.

«Em 2021, o parque industrial representava 40% das exportações da indústria do vestuário do país. Se projetarmos esses mesmos objetivos para 2027, estimamos que as exportações de têxteis e vestuário serão a principal exportação da Etiópia, à frente da agricultura e de exportações clássicas como café», referiu Hibret Lemma.

Mão de obra abundante e eletricidade barata

Os dois responsáveis apontam que há inúmeras vantagens que a Etiópia oferece aos compradores, marcas e retalhistas europeus que procuram novas oportunidades de sourcing, a começar pela população de 120 milhões, a maioria jovem e passível de ser qualificada. Além disso, o país usufruiu de uma das tarifas elétricas mais baixas do mundo, com um custo de 0,03 dólares por kilowatt/hora, e está próximo de fontes de energia nucleares, assegurando o fornecimento elétrico para a laboração.

Ravi Jayathilaka assumiu que o motivo que o levou a investir na Etiópia foi a visibilidade, nomeadamente o facto de 50% do país ter uma força de trabalho jovem e desejosa de trabalhar e da Etiópia ter capacidades para aprofundar o seu negócio. «O fornecimento de energia é uma das principais fontes necessárias para a indústria e a Etiópia tem o preço mais barato», sublinhou.

Embora tenha uma unidade produtiva a operar na Etiópia, o diretor-geral da Sumbiri Hela Intimate garantiu que compreende o que os clientes europeus querem. Reconhecendo a necessidade de ter mais design e qualidade de produto, a empresa planeia diversificar a sua oferta, para produtos mais especializados, assim como responder às exigências de compradores europeus com menor escala.

Reforço da sustentabilidade

Em termos de sustentabilidade, os parques industriais funcionam, de acordo com Hibret Lemma, com 100% de energia renovável, proveniente de fontes hidroelétricas e eólicas. O compromisso com uma produção mais ecológica, indicou, estende-se a unidades produtivas com zero descargas líquidas e com práticas de minimização de desperdício de água. Além disso, acrescentou, muitos produtores etíopes estão envolvidos em iniciativas como a Better Work para assegurar o cumprimento de padrões ambientais e sociais.

[©Hawassa Industrial Park Investors Association]
«Temos também mecanismos internos centralizados para perceber se há queixas ou padrões de queixa por parte dos trabalhadores», sublinhou Hibret Lemma, adiantando que a maior parte das reclamações atuais se prendem com a incompreensão da cultura, pelo que há formação específica para ajudar os produtores a liderem com esse tipo de situação.

Em termos de logística, e sem acesso ao mar, o país tem procurado melhorar a rede de transportes terrestres, incluindo a criação de uma ferrovia que liga a Etiópia ao porto do Djibuti, que permitiu melhorar o fluxo de mercadorias e reduzir os tempos de trânsito e os custos. «Reduzimos o custo, mas pensamos que podemos reduzir mais com um aumento do volume», assinalou o CEO da Hawassa Industrial Park Investors Association.

No geral, acredita Hibret Lemma, África, com a sua população jovem e dinâmica, tem vantagens ao nível dos custos e encerra um grande potencial para o desenvolvimento da indústria têxtil e de vestuário, sobretudo em comparação com gigantes envelhecidos como a China, e a Etiópia, em particular, é uma opção viável para os compradores europeus que procuram qualidade e produtos acessíveis, graças à sua bem desenvolvida rede de empresas, condições favoráveis ao investimento, compromissos sustentáveis e acesso a uma grande força de trabalho.