Xinjiang prejudica exportações chinesas

A Lei de Prevenção do Trabalho Forçado Uigur, relacionada com Xinjiang, está a afetar as exportações de têxteis e vestuário da China, que está a perder quota de mercado não só nos EUA, mas também na União Europeia.

[©Pixabay-Jim Black]

A Associação Nacional de Vestuário da China (CNGA) alertou, num briefing sobre as operações económicas da indústria de vestuário da China para o primeiro semestre de 2023, que a indústria de vestuário do país está sob séria pressão, indica o Just Style.

A insuficiente recuperação da procura pós-Covid nos mercados internacionais devido à inflação e às políticas monetárias restritivas dos bancos centrais foi exacerbada pela transferência de encomendas de clientes estrangeiros para outros países.

A CNGA atribuiu esta situação parcialmente à implementação, no final de 2021, da Lei de Prevenção do Trabalho Forçado Uigur nos EUA, que, segundo a CNGA, não só está a afetar seriamente a exportação de produtos de algodão da China para os EUA, mas também teve um efeito em cadeia negativo noutros mercados importantes.

De acordo com as autoridades alfandegárias chinesas, no primeiro semestre de 2023, as exportações de vestuário de algodão da China para os EUA somaram 5,54 mil milhões de dólares, o que representa uma queda de 39,3% em comparação com o período homólogo do ano anterior. Já as exportações de vestuário de algodão para a União Europeia (UE) atingiram 4,47 mil milhões de dólares, equivalente a uma queda de 32,2% em termos anuais, enquanto as exportações de vestuário de algodão para o Japão foram de 2,09 mil milhões de dólares, o que significa uma redução de 15,9% face ao primeiro semestre de 2022.

Uma proposta de regulamento da UE que proíbe a venda de produtos fabricados com trabalho forçado pode afetar ainda mais o mercado chinês, se levar os reguladores da UE a restringir as importações de têxteis e vestuário feitos com algodão proveniente de Xinjiang.

De qualquer forma, destaca o Just Style, os declínios comerciais nestes sectores são já significativos e levaram a uma redução da quota da China nas economias desenvolvidas e nos principais mercados consumidores de vestuário. De acordo com dados da Câmara de Comércio da China para Importação e Exportação de Têxteis (CCCT), nos primeiros dois meses de 2023, a quota de mercado da China caiu nos EUA (-5%), na UE (-3,7%), no Japão (-7,4%), no Reino Unido (-3,4%), na Coreia do Sul (-0,9%), na Austrália (-5,4%) e no Canadá (-1,3%) em termos anuais.

Produção acelera em Xinjiang

Tendo sublinhado que o efeito Xinjiang não desaparecerá tão cedo, o jornal chinês Xinjiang Daily, noticiou no final de agosto que, apesar dos controlos regulatórios que impedem o uso do algodão da região em marcas ocidentais desde o início deste ano, Xinjiang acelerou a construção de clusters da indústria de algodão, têxtil e de vestuário. No primeiro semestre deste ano, o valor acrescentado da indústria têxtil de Xinjiang aumentou 7% em termos anuais, com o algodão a servir tanto o mercado chinês como os mercados estrangeiros, não sendo afetado pelas atuais restrições ocidentais.

No primeiro semestre de 2023, a produção de fios de algodão em Xinjiang atingiu 1,167 milhões de toneladas, um aumento anual de 9,8%, enquanto a produção de tecido de algodão aumentou 27,6%, para 558 milhões de metros, indicou a reportagem do jornal estatal. Ao mesmo tempo, Xinjiang está igualmente a aumentar a produção de fibras sintéticas, usando a capacidade de produção existente de paraxileno e ácido tereftálico refinado (PTA), indicou o Xinjiang Daily.

«O aumento dos preços da última década deixou muito claro que a China já não é um “fornecedor de baixo custo”, justifica, citada pelo Just Style, uma porta-voz da GermanFashion Modeverband Deutschland, a associação alemã da indústria da moda.

«Alguns compradores estrangeiros são muito cuidadosos e querem evitá-lo [o algodão de Xinjiang]», aponta, por seu lado, Renaud Anjoran, consultor industrial sediado em Hong Kong. «Isso significa que é vendido mais internamente e para países que não têm uma política forte sobre o assunto», acrescenta.

Diversificar dentro e fora do país

Uma investigação da Escola de Moda e Têxteis da Universidade Politécnica de Hong Kong confirma que tem havido uma diversificação de países de sourcing e do afastamento da China para aprovisionamento de vestuário por parte de empresas de países desenvolvidos. A pesquisa, que incluiu uma amostra de 340 parcerias comprador-fornecedor, indicou uma diminuição de 21,54% no valor das transações entre fornecedores chineses e compradores norte-americanos em 2019 em comparação com 2017, sugerindo que a guerra comercial EUA-China lançada pelo ex-presidente Donald Trump teve um impacto significativo. A tendência continuou após a pandemia, com o atual Presidente Joe Biden a manter em vigor muitas das taxas de importação sobre produtos chineses impostas por Trump. Os investigadores citaram uma redução anual de 6,8% no primeiro trimestre de 2023 observada no valor das exportações chinesas de têxteis e vestuário.

«Para mitigar o risco de incerteza do conflito político-comercial, os compradores diversificaram para o sudeste da Ásia, devido à vantagem de custo da região para o aprovisionamento, ao mesmo tempo que vários produtores chineses de têxteis e vestuário expandiram parte da sua base de produção para o sudeste da Ásia para aproveitar essa oportunidade emergente», destacou Fan Di, professor auxiliar na divisão empresarial da Escola Superior de Moda e Têxteis da Universidade Politécnica de Hong Kong. «Isso permitiu-lhes capitalizar os custos-benefícios da produção e obter vantagens políticas oferecidas pelas nações desenvolvidas às regiões do Sudeste Asiático», acrescentou em declarações ao Just Style.

No entanto, realçou Fan Di, «a indústria têxtil e de vestuário do país ainda oferece vantagens incomparáveis ​​em termos de infraestruturas, conhecimento especializado e adoção de tecnologia».

Entretanto, como salientou a CNGA no seu briefing, desde o início deste ano, a macroeconomia da China recuperou um pouco, com o Fundo Monetário Internacional (FMI) a prever um crescimento de 5,2% este ano (2023) e de 4,5% no próximo ano. Isto significa que o rendimento dos consumidores chineses tem aumentado de forma constante, auxiliado por políticas para expandir a procura interna e promover o consumo, aumentando por sua vez a produção chinesa para o mercado interno.

De acordo com o departamento de estatística da China, entre janeiro e junho deste ano, as vendas no retalho de vestuário aumentaram 15,5% no país em comparação com igual período de 2022, superando o crescimento geral das vendas a retalho, que se ficou por 8,2%.

Fan Di confirmou que tem havido uma tendência entre os produtores chineses de vestuário para se concentrarem no mercado interno. «Em primeiro lugar, a ascensão de marcas de moda locais que destacam a identidade chinesa levou essas marcas a preferirem que a cadeia de fornecimento completa [seja] dentro da China, alavancando fornecedores e produtores locais, apoiando e fortalecendo a produção nacional», apontou. «Em segundo lugar, o surgimento da tendência “China-chique” (國潮) [guochao], que envolve a incorporação do simbolismo tradicional chinês e de know-how especial, alimentou ainda mais este foco. Esses modelos exigem experiência e competências para as quais os produtores locais têm uma posição única de cumprir, garantindo uma maior dependência da produção nacional», acrescentou.

Ainda assim, a CNGA aconselha o sector do vestuário da China a explorar os mercados asiáticos e euro-asiáticos que estão a ser abertos pela Iniciativa Faixa e Rota e pelo acordo comercial de Parceria Económica Regional Abrangente (RCEP), que junta 15 países, para compensar os ventos contrários, cada vez mais fortes, nos mercados desenvolvidos. A associação sublinhou que, no primeiro semestre de 2023, os envios de vestuário para países emergentes no sudeste da Ásia e nas regiões relacionadas com a Iniciativa Faixa e Rota aumentaram 9,6% em termos anuais, com as exportações destinadas à Rússia a subirem 42,7%.

«As empresas de comércio exterior de vestuário da China podem explorar ativamente os mercados dos países ao longo da Iniciativa Faixa e Rota, aproveitar as oportunidades de implementação efetiva da Parceria Económica Regional Abrangente e explorar profundamente o potencial de crescimento comercial em mercados diversificados», resumiu a CNGA.