Waste2Biocomp à procura da próxima geração de biotêxteis

O projeto europeu Waste2BioComp, liderado pelo CITEVE, promete revolucionar a produção de materiais e produtos de base bio, nomeadamente na área têxtil, e abrange não só a criação de novas matérias-primas produzidas a partir de resíduos, mas também o desenvolvimento de tecnologias inovadoras.

Helena Vilaça

Batizado Waste2BioComp – Converting organic waste into sustainable bio-based components, o projeto internacional, no âmbito do programa Horizonte Europa, junta 13 parceiros de seis países – Alemanha, Espanha, França, Itália, Portugal e Suíça – e tem uma dotação orçamental de 5,8 milhões de euros, cerca de 40% do qual atribuído para as atividades dos parceiros portugueses, que além do CITEVE, que é líder do projeto, conta ainda com a MTEX, a Riopele, o INESC-Tec e a Magellan.

O objetivo do Waste2BioComp, explica Helena Vilaça, gestora do projeto, é «desenvolver materiais de origem natural ou bio-based», que serão aplicados em três sectores: calçado, embalagens e têxtil.

Iniciado em junho do ano passado e com término previsto em 2025, o Waste2Biocomp tem várias linhas de trabalho, indica a investigadora do Citeve, sendo a primeira focada no desenvolvimento de matérias-primas, uma área abrangente que inclui fibras mas também cápsulas e soluções de tingimento.

«Com biopoliésteres, ao nível das embalagens, temos a parte do desenvolvimento de filmes flexíveis e também as embalagens rígidas plásticas; para o calçado, vamos desenvolver solas e palmilhas, ou seja, basicamente desenvolver espumas; e no caso dos têxteis, vamos produzir fibras e não-tecidos», revela ao Portugal Têxtil

O biopoliéster será produzido a partir de resíduos de carboidratos, incluindo da indústria alimentar. Para as micropartículas e para as cápsulas, que irão conferir propriedades como antibacterianas, «vamos usar óleos essenciais e, depois, proteínas ou outros compostos bioativos que já existem e que são extraídos de componentes naturais. Alguns vêm de resíduos – já há algumas moléculas à venda no mercado que são extraídas de cascas de frutos secos», exemplifica Helena Vilaça, sublinhando que tudo será devidamente testado, incluindo ao nível da toxicidade.

Uma segunda área de investigação irá centrar-se na estamparia por jato de tinta, com o desenvolvimento de dispersões com corantes e pigmentos.

Revolução tecnológica

Irão ainda ser desenvolvidas tecnologias para aplicação destes novos materiais, nomeadamente a tecnologia de electro spray, que irá permitir fazer o não-tecido. «Vai ser um não-tecido depositado sobre outro substrato têxtil. Na verdade, é quase como se fosse um laminado», adianta a gestora do projeto. «Temos alguns estudos preliminares que indicam que é possível fazermos as fibras por spray com este tipo de biopoliéster, mas isto ainda tem de ser muito trabalhado até, efetivamente, termos fibras de tamanho suficiente para se conseguir depositar e fazer o não-tecido. Mas precisamente porque já prevemos que não vamos conseguir ter o não-tecido com resistência só por si, contemplamos esta questão de ser depositado sobre um tecido, para ter alguma resistência», acrescenta.

 

Ao nível da estamparia, «mesmo ao nível do tingimento mais convencional, há muito pouca coisa com os naturais. É um campo que ainda precisa evoluir bastante. E, então, a nível de ink jet, não há mesmo nada porque tem uns requisitos muito particulares – as cabeças de impressão requerem que os pigmentos tenham, por exemplo, um tamanho muito mais pequeno e, depois, a própria dispersão com cor que vai ser aplicada tem de ter uns certos requisitos a nível de, por exemplo, viscosidade», aponta a investigadora, avançando que está igualmente prevista a formação para profissionais. No projeto, o INESC-Tec vai também procurar desenvolver um braço robótico para estampar uma peça de vestuário ou calçado.

Desenvolvimentos do início ao fim de vida

O Waste2BioComp implica ainda o desenvolvimento de protótipos e até o fim de vida do produto, incluindo a possibilidade de eliminar o estampado de uma peça para voltar a estampar com outro desenho. «Vamos tentar desenvolver métodos para remover a cor e voltar a estampar – a ideia de as pessoas chegarem a uma loja, personalizarem a peça, porque teremos equipamentos em que facilmente a pessoa faz o desenho ou escolhe os padrões, levarem para casa, usarem e, passado uns tempos, quando já não gostam, poderem mudar. Se tivermos formas simples, no sentido em que possamos dizer que são sustentáveis, de remover a cor e voltar a estampar, isso já não será um problema tão grande como é atualmente», acredita Helena Vilaça.

Em alternativa, está a ser contemplada também a reciclagem química e a biocompostagem. «Vamos desenvolver os produtos, vamos simular condições de uso dos protótipos e vamos tentar a sua reciclagem. Não só a sua reciclagem, mas, no caso de algum não ser reciclável, vamos tentar estudar também a sua biodegradabilidade», desvenda a investigadora do Citeve. «Queremos ter aqui um processo completamente circular», salienta.