Viagens com fibra

Depois da apresentação dos diferentes tipos de fibras (ver O império das fibras na TV), o segundo episódio da série “O Extraordinário Mundo das Fibras”, criada pela Universidade do Minho através do projeto Fibrenamics, levou os telespetadores numa viagem pela utilização das fibras nos transportes. Dos cintos de segurança nos automóveis, passando pelos pneus até aos aviões, as fibras de vidro, de carbono e até de poliéster fazem parte do dia a dia de todos nós e estão a revolucionar os transportes. A importância do cinto de segurança num automóvel é, hoje, indiscutível mas no segundo episódio da série “O extraordinário Mundo das Fibras”, a história assumiu o protagonismo, contada pelo administrador da Artefita, Gonzaga Oliveira. «A experiência foi feita durante a II Guerra Mundial, nos pilotos de aviação e por causa das aterragens rápidas e de emergência. A indústria automóvel foi à aviação, pegou no conceito e introduziu nos automóveis», esclareceu. Todos os anos saem da Artefita cintos suficientes para equipar 60 mil cadeiras, prontos a resistirem a cargas de 1.600 kg. «Temos de levar em consideração que num choque poderá acontecer que o peso do corpo se transforme numa força 10 a 50 vezes superior, logo temos que ter como referencial a resistência do cinto para satisfazer as necessidades do cinto de segurança», explicou Gonzaga Oliveira. No passado foi usada a poliamida, mas hoje a escolha recai no poliéster de alta tenacidade, porque além do preço, mais baixo, tem uma maior resistência para um menor alongamento. Mas antes dos cintos de segurança cumprirem o seu papel numa travagem, já os pneus entraram em ação. Com vários componentes de alta tecnologia, a carcaça é a parte mais resistente, composta por lonas de poliéster que suportam o peso do automóvel e da carga. Soma-se ainda as cintas – lonas estabilizadoras que suportam as cargas em movimento – e a banda de rodagem permite que o pneu adira à estrada. Na Indústria Têxtil do Ave são produzidos os tecidos usados nos pneus da Continental e a escolha da fibra depende do tipo de pneu a fabricar. A mais comum é o poliéster HMLS. «Desde há uns 20 anos a esta parte, os fabricantes de fios de poliéster começaram a desenvolver os poliésteres HMLS, normalmente entendidos como estáveis dimensionalmente quando sujeitos a temperaturas elevadas, exatamente para garantirem o melhor compromisso possível entre o baixo alongamento e, ao mesmo tempo, o baixo encolhimento quando sujeitos a altas temperaturas. Daí a aplicação deles na zona da carcaça ser muito importante», justificou Eduardo Diniz, diretor-geral da ITA-Continental. Impregnação e termofixação são algumas das fases por que passa o tecido antes de se impregnar com borracha e sofrer a vulcanização que dá a forma final aos pneus que todos conhecemos. Na busca por veículos mais leves, uma preocupação da indústria para que os veículos gastem menos combustível, as fibras e compósitos podem dar também uma ajuda importante. «Permite-nos reduzir o peso dos veículos, aumentar a segurança dos próprios veículos, porque são fibras altamente resistentes, permite-nos graus de liberdade geométrica que normalmente as peças em metal não nos permitem – hoje em dia conseguimos ter carros mais redondos do que aqueles que tínhamos antigamente», apontou Alexandre Teixeira, da CEIIA. Inclusivamente os postos de carregamento de automóveis elétricos têm fibras, nomeadamente a fibra de vidro, também usada nos autocarros. «Se hoje em dia quisemos substituir todas as peças que aplicamos no autocarro por peças em metal, poderíamos falar de três a quatro mil quilos de diferença de peso. Isso traria, a nível de consumo de combustível e do próprio desgaste do autocarro um custo muito elevado», referiu Norberto Almeida, da Fibrauto. Pelos céus, os compósitos tiveram um impacto atómico na redução do peso das aeronaves, que são hoje 20% a 30% mais leves do que os seus antepassados metálicos. «Os anos 90 foi quando se deu o boom das fibras na aviação. As fibras de carbono são as mais usadas na aviação, em especial para fuselagens, para as asas – no fundo as partes mais importantes do avião. As fibras de vidro são também muito usadas para outras superfícies menos relevantes, cuja performance não é tão importante, e ainda as fibras aramídicas, para partes do avião mais sujeitas a impacto, a tensões maiores», afirmou João Mortágua, do CEIIA. Com as peças de fibra de carbono integradas na aeronave, que constituem, em conjunto com novas ligas metálicas, 40% dos componentes, o Airbus A380 ficou mais leve 15 toneladas, o que permite voar mais tempo e com menor consumo de combustível. A redução das emissões de dióxido de carbono é outra das preocupações atuais quando se fala de transportes, até porque, todos os anos há 12 milhões de carros em fim de vida, onde os compósitos nem sempre podem ser reciclados ou reaproveitados. Neste capítulo, o desafio tem dois vetores: a reciclagem e a evolução para fibras naturais. «Tudo passa pela questão de melhorar as suas propriedades de interface com os polímeros. Neste caso podemos melhorar as fibras com tratamentos de superfície, para melhorar a aderência, mas podemos ir mais longe, ir à planta e trabalhar a parte de componente genética e garantir que no final vamos obter uma fibra que tem já as propriedades que necessitamos», revelou Raul Fangueiro, coordenador do projeto Fibrenamics e investigador da Universidade do Minho, citando as fibras com capacidade de autorregeneração. A viagem ao maravilhoso mundo das fibras terminou no capítulo dos transportes, mas o passeio segue já no próximo domingo pelas 13h na RTP2.