Uganda proíbe importação de vestuário usado

O presidente do país africano considera que as importações de vestuário do Ocidente, que afirma serem de roupa de quem já morreu, estão a prejudicar o desenvolvimento da indústria têxtil e de vestuário do Uganda.

[©Yoweri Museveni X]

O presidente Yoweri Museveni referiu-se à proibição durante uma cerimónia de lançamento da construção de nove unidades produtivas no parque industrial Sino-Uganda na cidade de Mbale.

«São roupas de pessoas mortas. Quando uma pessoa branca morre, eles juntam as suas roupas e enviam-nas para África», afirmou, citado pela Reuters. «Temos pessoas aqui que produzem vestuário novo, mas não conseguem entrar no mercado», acrescentou.

Na sua página da rede social X (ex-Twitter), Yoweri Museveni agradeceu «aos nossos amigos chineses por encorajarem investimentos em África. Quero agradecer particularmente aos investidores que investiram na indústria têxtil porque nos deram a força para nos livramos de roupas em segunda-mão e, mais importante, darmos empregos aos nossos jovens».

De acordo com a associação britânica Oxfam, pelo menos 70% do vestuário doado pelos consumidores a associações na Europa e nos EUA acabam em África.

Tal como a maior parte dos países africanos, o Uganda importa grandes quantidades de vestuário usado, que alguns consumidores preferem por ter preços mais baixos. Mas os produtores queixam-se que a roupa em segunda-mão inunda o mercado e mina a possibilidade do país subir na cadeia de calor do algodão e da indústria têxtil.

Yoweri Museveni (de chapéu branco) na visita a uma fábrica [©Yoweri Museveni X]
O Uganda produz algodão, mas a maior parte é exportado em forma semi-processada, com as exportações desta matéria-prima a representarem entre 26 e 76 milhões de euros por ano entre 2012 e 2022, segundo o banco central do país.

A Comunidade da África Oriental, uma entidade económica regional da qual o Uganda faz parte, concordou em 2016 em proibir completamente a importação de vestuário usado até 2019, mas apenas o Ruanda aplicou a medida, tendo motivado uma resposta dos EUA em 2018, que suspendeu o direito do Ruanda a exportar vestuário sem taxas, sob o AGOA, para o mercado americano.

Vozes contra

Nem todos concordam com o presidente do Uganda. Francis Muhire, economista na Makerere University Business School, sublinha que embora a proibição das importações possa alimentar o crescimento da indústria têxtil do país, o grande número de pessoas que trabalha no sector da moda usada vai ser muito afetado.

Empresas do sector já mostraram a sua insatisfação com a proibição, com alguns a planear uma petição contra, segundo a NTV Uganda. «Os comerciantes dizem que se o plano do Presidente Museveni foi implementado pode acabar com milhões de empregos diretos e indiretos [cerca de 4 milhões, adiantam], num país onde o desemprego e a pobreza estão a aumentar», escreve o órgão de comunicação.

A associação destes comerciantes refere que, além do sector ser um dos grandes contribuintes no pagamento de impostos, serve uma população que opta por este tipo de compra para poupar dinheiro.

John Walugembe, diretor da Federação de Pequenas e Médias Empresas no país, referiu à NTV Uganda que a proibição pode ter muitas ramificações e que, no mínimo, deve ser introduzida faseadamente. «A indústria têxtil e vestuário tem muito potencial», afirmou, citando o exemplo do crescimento no Bangladesh. «Contudo, para isso, é preciso construir capacidade», sublinhou, acrescentando que o país vive também um momento difícil em termos económicos. Como tal, a medida, «não é uma boa ideia porque, primeiro, não temos capacidade e, segundo, o Uganda não pode atualmente pagar o custo para a ter novos produtos têxteis».