Como tem evoluído a formação da área têxtil e moda na Universidade da Beira Interior (UBI)?
Temos estado sempre de acordo com o ciclo da Indústria Têxtil e Vestuário (ITV). Primeiro a indústria tinha as preocupações centradas na produção e, portanto, as universidades prepararam engenheiros têxteis para a produção das empresas. Depois veio a fase do produto, ou seja, as empresas começaram a perceber que tinham também de ser competitivas e pensar muito ao nível do produto. Depois vem a fase do design e dos designers. Hoje atravessamos uma fase em que isto está claramente interligado, ou seja, a produção, a tecnologia, com os produtos e os materiais. Estamos na fase da coabitação entre engenheiros têxteis e designers de moda, que é das coisas mais fantásticas que pode haver. O departamento têxtil da UBI tem acompanhado estes ciclos e esta evolução da indústria, foi capaz de passar de um departamento que essencialmente formava engenheiros têxteis para um departamento que, neste momento, forma designers de moda. Mantém uma área de investigação na área da engenharia têxtil, nomeadamente formação ao nível do doutoramento em Engenharia Têxtil e em Materiais Avançados. E portanto concilia estas duas vertentes da engenharia têxtil com o design de moda. Há um novo ciclo e o departamento conseguiu com isso reverter uma fase em que não tinha alunos para Engenharia Têxtil para uma fase em que temos muitos alunos para Design de Moda.
Tudo o que fazemos é a pensar nas empresas e na economia real. Por isso temos desenvolvido e melhorado os cursos, temos falado com os alunos e com os empresários.
De que forma está organizada a oferta formativa do Departamento de Ciência e Tecnologia Têxteis (DCTT)?
Temos uma licenciatura em Design de Moda e temos dois mestrados: um em Design de Moda e outro de Branding e Design de Moda, que é uma associação muito interessante com o IADE, da Universidade Europeia, em Lisboa, em que procuramos associar a gestão da marca ao design de moda. Ainda na área do Design de Moda temos o Doutoramento em Design de Moda, que é uma associação com a Universidade do Minho e é uma formação única em Portugal.
Na área da Engenharia Têxtil, temos um mestrado que abrimos todos os anos mas que, infelizmente, não tem captado alunos, e temos um doutoramento em Engenharia Têxtil e um doutoramento em Materiais e Processamento Avançados, em associação com o Departamento de Química, a Faculdade de Ciências e várias universidades nacionais de grande dimensão, liderado pela Universidade Nova de Lisboa.
O doutoramento em Engenharia Têxtil está a terminar porque decidimos fazer uma fusão de dois doutoramentos que havia na UBI: o doutoramento em Engenharia Têxtil e o doutoramento em Engenharia do Papel. Esses dois foram agora fundidos num só, o doutoramento em Ciência e Engenharia dos Materiais Fibrosos, que já está a abrir vagas e a aceitar alunos este ano, e é um trabalho conjunto entre a Faculdade de Ciências e a Faculdade de Engenharia da UBI.
Há outras mudanças que tenham sido introduzidas nos últimos anos?
Na última avaliação dos cursos, há cerca de dois anos, aproveitámos o processo para reformularmos com alguma profundidade os planos de estudo. O que fizemos foi torná-los mais fluidos, mais flexíveis em termos do processo de aprendizagem. Identificámos certas áreas que poderiam estar com alguma lacuna e criámos unidades curriculares novas, como por exemplo têxteis criativos, para pôr os alunos a pensar fora da caixa. Uma outra reformulação que fizemos tem a ver com o design de moda sustentável, pensando nas questões ambientais. Às vezes, para os alunos, a área da modelagem não é das mais apetecíveis, portanto procuramos criar unidades curriculares em que juntamos a modelagem com a confeção, por exemplo. Estas evoluções que fizemos foram ao encontro do que se estava a passar na aprendizagem e também nas competências que os estudantes tinham à saída. Nos mestrados, fundamentalmente, aquilo que fizemos foi criar-lhes uma maior flexibilidade e variedade de escolha nas unidades curriculares de opção, para eles poderem desenhar melhor o perfil e o percurso que querem fazer.
A licenciatura em Design de Moda surgiu no início dos anos 2000. O que distingue este curso?
O design é a disciplina que cria a interface entre vários sistemas: as pessoas/sociedade, a economia, as artes e a ciência/tecnologia. Deve ser, por isso, entendido como uma área que não pode ser apropriada. Ela é transversal a estas várias áreas do saber e da sociedade. O que percebemos foi que, se queremos estar ao lado da indústria, em que a indústria precisa de fazer desenvolvimento de produto e estar competitivamente no mercado com o produto, então temos de formar designers com este perfil. Designers que tenham uma capacidade de se inspirar, de pensar e de beberem a estética pelo lado das artes, mas que pensem sempre que o seu projeto vai ser para o homem, para a sociedade, e saber que têm de fazer o projeto entre dois limites claros: o limite do mercado e o limite da tecnologia e materiais. Portanto, a exploração da tecnologia e dos materiais é fundamental e indispensável para um bom projeto e o conhecimento do mercado e da economia real é fundamental para adaptar o projeto àquilo que são as necessidades dos consumidores. É esta virtualidade e esta forma de funcionar que percebemos e quisemos implantar numa Escola de Engenharia. E em que é que percebemos que podíamos ser diferentes dos outros? Fazendo uma formação com uma base teórica forte para os designers de moda, que não tem tanto a ver com as questões mais tecnológicas. Essa formação teórica é que lhes pode permitir entender o design enquanto projeto mas de uma forma absolutamente abstrata sobre qualquer área. Aquilo que dizemos sempre aos nossos alunos é que antes de pegarem no lápis têm de pensar. Achamos que essa formação teórica deve ser robusta, precisamente para lhes dar essa capacidade de pensar, de ver o mundo. E depois, então, a componente mais projetual, que é a do aprender fazendo. É potencializar todo este complexo oficinal que temos aqui, em que os estudantes podem fazer a conceção do seu projeto, depois de pensar, com base em sistemas CAD, e depois materializá-lo nas nossas oficinas com os materiais, alguns adquiridos e outros transformados. Esse ensino baseado no projeto e no fazer, é aquilo que nos diferencia.
Como têm procurado cultivar as relações com as diferentes entidades da ITV?
A UBI é associada da ATP. Isso já diz muito. Efetivamente, a universidade é para estar ao serviço do país, da indústria do país e das associações empresariais do país. Portanto houve esse convite e nós anuímos. Se houver outras associações que nos convidem, seguramente que iremos avaliar e com todo o gosto. Este é o sinal de que queremos estar próximos e que estamos próximos. O sermos associados da ATP revela a nossa procura constante de estreitar relações. Temos também uma relação muita próxima com a ANIL. E das empresas, quer pela via dos recursos humanos, quer pela participação em projetos conjuntos. Nós temos projetos conjuntos candidatados e aprovados em que somos parceiros das empresas e as empresas são nossas parceiras. É uma ligação forte.
Que análise faz da ITV da região?
Não há dúvidas nenhumas que a ITV é a que tem maior peso no produto, na economia e no emprego. São dados objetivos. Sofreu foi uma alteração enorme nos últimos 40 ou 50 anos. Passou de uma indústria horizontal claramente para uma indústria vertical. Neste momento, as empresas com sucesso são altamente verticalizadas.
Quais são as grandes linhas condutoras da atividade da UBI, e em particular do DCTT, para o futuro?
A consolidação dos cursos de Design de Moda é fundamental e, claro, perceber a oportunidade para a área de Engenharia Têxtil. A área da Engenharia Têxtil não está esquecida, pelo contrário, mas temos que perceber a oportunidade de poder relançar essa formação. A investigação, quer em Engenharia Têxtil, quer em Design de Moda, e a ligação às empresas das duas áreas são dois vetores que estão sempre presentes e que queremos aprofundar ainda mais.