Trabalho forçado aumenta «mais do que nunca» na Ásia

O risco de escravatura moderna nos centros produtivos asiáticos, que já se encontra a ritmo crescente, deverá piorar com o impacto da pandemia face à falta de proteção laboral e de supervisão regulamentar, alerta novo relatório.

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A mais recente edição anual do Modern Slavery Index da Verisk Maplecroft, que mede o risco de potenciais associações com tráfico humano e trabalho forçado nas cadeias de aprovisionamento, deu ao Bangladesh (18.º lugar em termos de risco global), China (20.º), Mianmar (23.º), Índia (25.º), Camboja (32.º), Vietname (25.º) e indonésia (44.º) as suas pontuações mais baixas desde que começou a classificação dos 198 países, em 2017.

O Bangladesh e a Índia, em particular, caíram na categoria de «risco extremo» do Modern Slavery Index pela primeira vez, juntando-se assim à China e ao Mianmar, num grupo de 32 países onde as populações enfrentam o maior risco de trabalhar em condições de exploração equivalentes à escravatura moderna, que podem incluir servidão involuntária, escravidão por dívidas ou recurso a práticas enganosas e coercivas para trabalho forçado. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, estima-se que 40 milhões de pessoas estejam sujeitas a escravatura moderna, incluindo 24,9 milhões em trabalho forçado.

O Bangladesh, o segundo maior exportador de vestuário depois da China, não só registou um aumento das violações, refere a Verisk Maplecroft, mas também evidenciou uma erosão das leis laborais nos últimos anos. Na Índia, um «declínio apreciável» na fiscalização é, em geral, responsável pela queda na classificação e consequente aumento do risco de «elevado» para «extremo».

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No entanto, o Vietname foi o país que conheceu o maior aumento de violações nos últimos anos, revela a organização. Embora a Verisk Mapelcroft tenha dado a este país asiático a etiqueta de risco «elevado» e não de risco «extremo», as consequências da pandemia podem facilmente colocar o Vietname nesta última categoria, especialmente à medida que cada vez mais trabalhadores, na sequência da crise económica, são levados para o sector informal, onde o risco de exploração é maior e não têm acesso a proteções laborais.

Já o Camboja, indica o relatório, registou a maior queda na classificação, baixando 32 posições em relação ao ano passado e 48 desde 2017, devido a um aumento nas violações e uma «deterioração significativa» nas capacidades de fiscalização. De igual modo, a pontuação mais baixa da China pode ser atribuída ao fraco cumprimento da legislação laboral devido, possivelmente, às restrições de movimento resultantes da pandemia.

Efeitos da pandemia

«As restrições de viagens e outras medidas para abrandar a disseminação da Covid-19 fizeram com que as empresas deixassem de poder realizar auditorias para garantir práticas de trabalho éticas nas suas cadeias de aprovisionamento», afirma Sofia Nazalya, analista de direitos humanos da Verisk Maplecroft, citada pelo Sourcing Journal. «O risco de reputação das marcas por associação à escravatura moderna é, por isso, maior agora do que em qualquer outro período dos últimos anos», aponta.

Os trabalhadores da indústria de vestuário asiática perderam quase seis mil milhões de dólares (cerca de 5 mil milhões de euros) em salários entre março a maio, quando algumas das maiores marcas do mundo cancelaram, suspenderam ou impuseram grandes descontos nas encomendas, segundo uma análise publicada em agosto último pela Clean Clothes Campaign, uma organização não governamental que luta pelos direitos dos trabalhadores.

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Qualquer apoio governamental ou ajuda internacional provou ser insuficiente em muitos países à exceção da China, que tem melhores medidas governamentais para colmatar as diferenças salariais. Os trabalhadores da indústria de vestuário do sul e sudeste asiático receberam 38% menos do que o habitual durante esses meses, adianta a organização. Em algumas regiões da Índia, este número ultrapassou os 50%.

As consequências têm sido «severas»: um inquérito junto de 1.269 trabalhadores da indústria de vestuário do Bangladesh, realizado em julho pela South Asian Network on Economic Modeling and Microfinance Opportunities, revelou que 25% dos inquiridos estavam a usar as suas economias para sobreviver, 18% pediram dinheiro emprestado e 9% recorreram a ajuda familiar. Apenas 18% reconheceram que a crise causada pelo Covid-19 não teve impacto nos respetivos meios de subsistência e 15% admitiram ter quebrado as regras de quarentena para obter rendimentos alternativos.