TPP sem acordo à vista

Após a última ronda de negociações da Parceria Trans-Pacífica (TPP), que decorreu na primeira semana de agosto, se ter revelado infrutífera na obtenção de um acordo, o foco está agora em assegurar a sua conclusão antes do desfecho das eleições presidenciais americanas, que poderão impedir o seu progresso. 

Os ministros de comércio estão focados em definir o acordo final da TPP ao longo dos próximos dois meses, depois de na última reunião, que teve lugar no Havaí na primeira semana do mês de agosto, se terem revelado incapazes de finalizar o acordo.

A divulgação pública de projetos de acordos tem sido ansiosamente aguardada, seguindo-se à aprovação da autoridade fast-track, recentemente concedida ao presidente dos Estados Unidos da América. Porém, caso os últimos entraves não sejam removidos nos próximos dois meses, qualquer acordo poderá ter de aguardar pela conclusão da próxima campanha presidencial americana, celebrada em novembro próximo. Isso poderá atrasar o acordo final da TPP para 2017, anulando, paralelamente, os acordos condicionais realizados até ao momento.

Um porta-voz do departamento de Relações Exteriores e Comércio da Austrália (um parceiro envolvido na negociação do pacto) adiantou que «foi alcançado um progresso significativo ao longo dos últimos 12 meses na resolução de questões pendentes», mas não adiantou qualquer possibilidade de conclusão iminente.

O governo da Nova Zelândia revelou-se mais otimista. O Ministro do Comércio, Tim Groser, anunciou que os ministros envolvidos na negociação da TPP prometeram, coletivamente, reunir-se novamente, o mais rápido possível, com o intuito de finalizar o acordo.

Embora admita que permanecem pendentes alguns obstáculos, especialmente sobre propriedade intelectual e acesso ao mercado dos produtos lácteos, Groser disse que «estou confiante de que vamos chegar a um acordo». Os seus funcionários acrescentaram que os negociadores «irão  continuar a trabalhar sobre as questões remanescentes nas próximas semanas e os ministros planeiam reunir-se em breve para finalizar o acordo».

Pontos de atrito
A cláusula de Resolução de Litígios entre os Investidores e o Estado (ISDS na sigla inglesa) a incluir na TPP é um dos problemas em destaque, permitindo que empresas processem os governos dos Estados membros, caso as suas políticas, ações ou legislação afetem injustamente  os lucros razoáveis de uma empresa ao abrigo do acordo.

Se um país proibiu uma substância utilizada no processamento têxtil ou instituiu regulamentações de conformidade que injustamente afetam os lucros, por exemplo, uma empresa pode recorrer à ação legal e indemnização no âmbito da ISDS.

Paralelamente, a falta de transparência em relação às negociações da TPP persistem. Valerie Cooper, CEO da consultora americana de vestuário internacional Heart-Hunters Consulting, afirmou que «a maioria das pessoas [na indústria], excetuando as grandes corporações, não está bem informada sobre a TPP, porque tudo tem decorrido em segredo».

Isso inclui detalhes propostos e acordados relativamente às regra de origem, disposições e listas de «fornecimento curto», ditando a percentagem de uma peça de vestuário que deve ser fabricada no bloco TPP, de forma a garantir o acesso às preferências comerciais, que aparentam não estar, ainda, concluídas.

Uma carta aberta ao Representante Comercial dos EUA, Michael Froman, anterior às negociações decorridas no Havaí, proveniente das associações de retalho e da indústria de fabrico que compõem a TPP Apparel Coalition, solicitou disposições específicas que garantam a proteção das cadeias de aprovisionamento globais e «flexibilidade para rever a lista de fornecimentos no futuro, de forma a garantir o acesso ao mercado, à medida que as condições evoluem».

Vietname em vantagem
Se o acordo for aprovado, o Vietname será um dos principais beneficiados. Herb Cochran, diretor-executivo da Câmara de Comércio Americana no Vietname, em Ho Chi Minh City, estima que as exportações de vestuário provenientes deste país com destino aos Estados Unidos, sob  a alçada da TPP, poderão atingir os 20 mil milhões até 2020.

De acordo com fontes da AmCham, Le Tien Truong, diretor do Vinatex, o grupo estatal Vietnam National Textile and Garment Group, antecipa que as exportações de têxteis e vestuário provenientes do Vietname com destino aos EUA poderão manter uma taxa de crescimento de 15% a 20% durante o período compreendido entre 2014 e 2017, atingindo, potencialmente, os 50 mil milhões de dólares em 2025, se a TPP for assinada num futuro próximo.

Em acréscimo, um acordo com regras de origem flexíveis poderá, também, beneficiar o principal fornecedor de matérias-primas do Vietname, a China, sublinhou Cooper. «Os produtos podem ser até 65% fabricados na China, pelo que eles podem enviá-los para o Vietname, etiquetá-los como “made in Vietnam” e levá-los, sem custos alfandegários, para os EUA», indicou Cooper. «Porém, uma vez que a China não integra o acordo, não podemos obter os nossos artigos na China. Por outras palavras, a China iria arrecadar os benefícios de vender os seus produtos sem tarifas, sem ter que abrir os seus mercados aos produtos americanos ou respeitar quaisquer outras regras da TPP».

O acesso preferencial e parceria crescente com o Vietname poderão transformar o pipeline de processamento de lã com destino à Austrália, o maior exportador de lã do mundo, de acordo com uma análise realizada em julho de 2014 pela Australian Wool Innovation. Porém, se o acesso chinês ao bloco da TPP for facilitado através de regras flexíveis de origem, esta parceria poderá sofrer outra transformação.

Dispositivos de segurança
Paralelamente, foram prometidos alguns dispositivos de segurança. A entidade Representante Comercial dos EUA (USTR) afirma que qualquer acordo no âmbito da TPP irá incluir «um mecanismo de salvaguarda direcionado para os têxteis, que permitirá que os Estados Unidos e outros países da TPP possam repor tarifas sobre determinados produtos, caso um aumento das importações ameace causar um prejuízo grave aos produtores nacionais».

Num relatório sobre as implicações comerciais da TPP para a Malásia, a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) estima que a categoria de malha e vestuário irá experimentar um aumento da balança comercial com os EUA de aproximadamente 88 milhões e 51 milhões de dólares, respetivamente, se a Malásia for libertada das restritivas normas  de “do fio em diante”, que obriga ao uso de fio produzido num país da TPP.

Concentrando cerca de 40% da economia global, ou 28,1 biliões de dólares do PIB, a TPP será o maior acordo de livre comércio do mundo. Os 12 países que participam nas negociações são os EUA, a Austrália, Brunei, Canadá, Chile, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Peru, Singapura e Vietname.

O acordo é significativo para o sector têxtil e vestuário, uma vez que envolve os EUA – o maior consumidor de vestuário a nível mundial – e o Vietname, o terceiro maior fornecedor do mercado emergente de vestuário, depois da China e do Bangladesh.