«Tentamos antecipar a tendência do negócio»

Fundado em 1978, o Centro de Ciência e Tecnologia Têxtil da Universidade do Minho é atualmente um centro de Excelência e uma referência internacional em I&D.

Na sua liderança conta, há 14 anos, com Fernando Ferreira, que além de ser alumni da instituição, está ligado à Universidade do Minho desde 1985, tendo assistido e impulsionado uma relação mais simbiótica com a indústria e com novas áreas de investigação.

Para os próximos anos, Fernando Ferreira antecipa que o futuro do 2C2T se fará do recrutamento de competências para áreas de vanguarda, uma proximidade cada vez maior com a indústria e de parcerias com outras entidades do sistema científico e tecnológico para rentabilizar recursos e manter o 2C2T na crista da inovação.

Como tem o 2C2T procurado evoluir?

Sou diretor do Centro desde 2003, o que coincide com o resultado da primeira avaliação dos centros de investigação nos termos atuais e, desde essa data, o Centro tem sido sempre classificado como Excelente. Temos um enquadramento focado na região e no sector e tentamos antecipar as suas necessidades. Procuramos fazer investigação cujos resultados se transformem em fonte de valor para a indústria, para a riqueza da região e do país.

Houve claramente uma mudança de foco naquilo que fazemos e investigamos hoje, uma atividade muito mais orientada para novos produtos, para sectores de aplicações diversas. Apesar de ser o Centro de Ciência e Tecnologia Têxtil, trabalhamos em materiais fibrosos – sempre muito atentos a novas aplicações que potenciam um valor acrescentado maior. Tentamos antecipar a tendência do negócio. Trabalhamos muito mais focados em produtos de maior valor acrescentado, na multifuncionalidade, de perceber o que está a acontecer noutros sectores e promover a transposição dessas tecnologias para produtos fibrosos. Os compósitos, por exemplo, era uma área que há uns anos atrás não tinha um foco tão grande. Ou os têxteis com aplicação na área da saúde, os chamados smart textiles.

Obviamente que isso significa conjugar a investigação fundamental com a investigação aplicada. Neste momento, e é algo que não acontecia até um passado recente, temos investigadores pós-doutorados contratados no âmbito do Projeto Estratégico do 2C2T. Atualmente o grupo de investigação é constituído por 30 investigadores doutorados, dos quais nove são pós-doutorados contratados. Contamos ainda com cerca de 30 bolseiros associados a projetos de investigação, alguns dos quais a fazer simultaneamente o doutoramento.

Como está o centro organizado?

No passado tínhamos uma estrutura e uma abordagem bastante tradicional: as áreas de física têxtil, química têxtil e design e gestão. Por ocasião da última avaliação, em 2014, efetuámos uma reformulação e estruturamos o Centro em dois grupos: engenharia de materiais fibrosos e design de produto de materiais fibrosos. Na atividade destes dois grupos, que reúnem pessoas com alguma afinidade nas suas competências, há uma zona de sobreposição, o que facilita a tão falada investigação multidisciplinar. Depois temos três grandes linhas temáticas: materiais nano e multifuncionais, processos sustentáveis e design e engenharia do produto.

Em média, por ano, quantos artigos científicos publicam?

No último triénio, em média, foram apresentados anualmente 32 artigos científicos, 14 livros ou capítulos de livros, 75 apresentações orais em conferências e nos últimos cinco anos, de 2013 a 2017, foram submetidos 20 pedidos de patente.

Em termos de tecnologia, o que tem atualmente o Centro para oferecer?

Compramos recentemente equipamentos laboratoriais de caraterização avançada de materiais, como o TGA (análise termogravimétrica), o DMA (análise mecânica dinâmica) e o FTIR (espectroscopia no infravermelho com transformada de Fourie). Além disso, dispomos dos equipamentos convencionais de laboratório e alguns equipamentos industriais para desenvolvimento de protótipos. Quando é necessário algum tipo de ensaio mais específico e complexo recorremos à aquisição desse serviço junto de outros parceiros científicos que detenham esse equipamento. Atendendo à multidisciplinaridade dos projetos e ao elevado custo de muitos dos equipamentos científicos não faz sentido adquirir e duplicar esses recursos

Como é financiado o 2C2T?

Neste triénio que agora termina foi atribuído pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) um financiamento de 1,3 milhões de euros, ou seja, cerca de 350 mil euros por ano. No entanto, o nosso orçamento é de cerca de 2 milhões de euros, integrando o financiamento de todos os projetos que estão a ser desenvolvidos no âmbito do Centro, não só sob responsabilidade direta, mas também aqueles que são responsabilidade dos investigadores, muitas vezes com promotores industriais.

Temos em média cerca de 40 projetos ativos anualmente e posso dizer que cerca de 80% do nosso financiamento resulta do envolvimento em projetos empresariais.

Quantas empresas estão envolvidas nesses projetos?

Cerca de 50 empresas de toda a fileira têxtil.

O que mudou na relação do 2C2T com a indústria têxtil para que tal sucedesse?

Atualmente temos muitos empresários que ligam a solicitar uma visita ao Centro. Muitas vezes não têm nenhum problema em concreto para resolver, querem somente ver o que está a acontecer. Isso começou a suceder há quatro ou cinco anos atrás, no pico da dificuldade. Hoje temos empresas interessadas em resultados, temos empresas disponíveis para assumir o risco e investir em inovação, em novos produtos, tentar novos mercados.

Por exemplo, foi lançado um programa de apoio à criação de núcleos de investigação. Trata de fomentar e apoiar uma parceria entre os centros de investigação das universidades e as empresas através da partilha de know-how e equipamentos. Pressupõe reuniões regulares entre os quadros dos dois parceiros, efetuar desenvolvimentos exploratórios utilizando as infraestruturas de ambos os lados, quer ao nível dos recursos humanos, quer tecnológicos, e com isso propiciar a apresentação de candidaturas ou o desenvolvimento de produtos. Mas o resultado mais importante é que no dia em que o projeto acabar, esteja instituída uma rotina de colaboração entre as duas entidades. Atualmente temos dois núcleos de investigação a funcionar: um com a Inovafil (ver A inovação fiada pela Inovafil) e outro com a Latino (ver Latino rentabiliza o conhecimento).

Que outro tipo de relações tem procurado fomentar com a ITV?

Procuramos participar nas iniciativas que envolvem o sector, como por exemplo no Cluster Têxtil e nos projetos mobilizadores. Estivemos no projeto demonstrador PTXXI e estamos agora no TexBoost, ambos com empresas do grupo Somelos (ver Somelos Tecidos sob o signo da inovação).

Estabelecemos também protocolos de colaboração com empresas, por exemplo, a Sonicarla acaba de doar um tear seamless para apoiar o ensino e investigação nesta área e vai ainda facilitar a participação dos futuros jovens licenciados em atividades em ambiente industrial.

Que aspirações tem para o futuro do 2C2T?

Sobretudo ter capacidade de recrutar e atrair competências e recursos que permita a este grupo continuar a trabalhar em áreas de ponta, desenvolvendo materiais e estruturas mais sustentáveis e funcionais, em estreita parceria com as empresas, contribuindo para uma maior competitividade do sector.

Quais serão as linhas de investigação mais interessantes no futuro?

Há hoje um grande interesse no desenvolvimento de sensores têxteis, para medição por exemplo de sinais vitais. Será importante trabalhar a sua integração no material de suporte e sendo condição determinante a condutividade elétrica, o desenvolvimento de sistemas de geração e armazenamento de energia para alimentação desses sensores. Outra área interessante será a conceção de produtos inovadores recorrendo a novas tecnologias, mais versáteis, por exemplo a impressão tridimensional.

A questão da sustentabilidade será também um tema sempre presente. Sendo os materiais fibrosos omnipresentes, importa investigar novos materiais e tecnologias mais sustentáveis e com menos impacto no nosso futuro.