Salários abaixo do mínimo no Reino Unido

O incumprimento no pagamento aos trabalhadores da indústria de vestuário não é um problema exclusivo dos países asiáticos com salários baixos. No Reino Unido, uma nova investigação mostra que há confeções a pagar menos de metade do salário mínimo do país e a produzir para marcas como a River Island e New Look.

As investigações continuam a encontrar empresas no Reino Unido e nos EUA que não pagam corretamente aos trabalhadores. Em 2014, a Ethical Trading Initiative, uma aliança de empresas, organizações e sindicatos, encontrou problemas «endémicos» na indústria de vestuário em Leicester, no Reino Unido, onde estimou que 75% a 90% do sector estava a pagar um salário médio de cerca de 3 libras por hora (3,5 euros), menos do que o montante mínimo legal na altura. Nos EUA, uma investigação recente do Departamento do Trabalho em fábricas em Los Angeles que produzem para grandes marcas descobriu violações laborais em 85% delas. Os trabalhadores ganharam 7 dólares por hora em média – menos 3 dólares do que o valor mínimo – embora alguns recebam apenas 4 dólares por hora.

A somar a estas preocupações, uma investigação secreta do Channel 4 no Reino Unido, que foi transmitida na passada terça-feira, 24 janeiro, como parte da série Dispatches, alega que confeções que produzem para conhecidas marcas de moda estão a pagar aos trabalhadores entre 3 libras e 3,5 libras por hora. O salário mínimo legal é atualmente 7,20 libras para os trabalhadores com 25 e mais anos.

As marcas implicadas no documentário do Channel 4 incluem a River Island, Boohoo, New Look e Missguided, todas com uma oferta de vestuário de moda para o mercado de massas.

Um jornalista infiltrado esteve a trabalhar para estas empresas a fazer diferentes tarefas. Na Fashion Square Ltd, por exemplo, que coloca as etiquetas nas roupas da River Island, o jornalista recebeu cerca de 3 libras por hora, de acordo com o documentário. Em resposta aos protestos do jornalista por receber bastante menos do que o salário mínimo, o seu chefe afirmou «não vai conseguir isso aqui… Não recebemos muito pelas roupas e temos de concorrer com a China e o Bangladesh. Eles conseguem mais barato lá. Como é que conseguem fazer mais barato aqui? Se pagarmos a toda a gente 10 libras ou seis libras vamos ter prejuízo».

Após as alegações, a River Island afirmou não ter conhecimento que esta empresa estivesse a produzir para a marca e indicou que cessou as relações comerciais com a empresa após esta ter chumbado em duas auditorias. «Os fornecedores foram informados para não usarem esta fábrica em mais nenhuma encomenda da River Island», revelou a River Island. «Estamos a investigar esta questão e vamos tomar as medidas apropriadas. Subcontratar sem a aprovação da River Island é uma séria violação aos nossos Termos e Condições», acrescentou.

O jornalista também trabalhou numa empresa que produz para a New Look, onde revelou que ganhou 3,50 libras por hora, e noutra que trabalha para a Boohoo e a Missguided, onde o salário era de 3,25 libras por hora.

A New Look também afiançou que não sabia que havia trabalho a ser levado a cabo por essa empresa, que foi evidentemente subcontratada por um dos seus fornecedores, a TS Knitwear. «Após uma auditoria que fizemos no verão passado, tornamos claro para o fornecedor, a TS Knitwear, que a empresa em questão não responde aos nossos padrões éticos e, como tal, não devia ser usada para produzir vestuário da New Look», revelou. «Desde então, tornou-se claro que a TS Knitwear subcontratou um pequeno número de encomendas a esta fábrica sem o nosso conhecimento ou consentimento e está em violação do acordo», afirmou, acrescentando que terminou agora a sua relação com a TS Knitwear.

O mesmo argumento é replicado pela Boohoo, que também garante não ter conhecimento que a empresa em causa fazia parte da sua cadeia de aprovisionamento. «O vestuário referido no programa Dispatches foi fornecido por um fornecedor auditado e aprovado que indicou por escrito à Boohoo em diversas ocasiões que todo o trabalho nos produtos da Boohoo foi feito na sua própria confeção», declarou a Boohoo em comunicado. «A Boohoo, por isso, não tinha qualquer conhecimento que a United Creation tinha sido usada por qualquer parte do processo de produção», reforçou.

Já a Missguided afirmou ao jornal The Guardian que leva muito a sério as alegações e exige «os níveis mais elevados de segurança, condições de trabalho e pagamento a todos os nossos fornecedores e subcontratados». A empresa adiantou ter iniciado uma investigação interna e «vai também assegurar que todas estas questões são respondidas urgentemente pelo fornecedor no melhor interesse dos trabalhadores.

Embora os consumidores possam ter dificuldade em acreditar que estas marcas não tinham conhecimento onde os seus produtos estão a ser confecionados, o problema tem-se disseminado na indústria de vestuário, pelo menos em países como o Bangladesh, e é resultado das políticas de subcontratação: uma marca contrata uma empresa para fazer um trabalho e essa empresa, estando demasiado ocupada para responder à encomenda, contrata outra empresa para o fazer.

A prática torna difícil para as marcas monitorizar as condições de trabalho nos seus fornecedores, mas também lhes dá a possibilidade de negação plausível quando surgem violações laborais. Foi isso que permitiu que muitas marcas tenham afirmado que não sabiam que as suas roupas estavam a ser produzidas nas fábricas destruídas durante o colapso mortífero do Rana Plaza, no Bangladesh, em 2013, destaca o artigo do Quartz.

A Ethical Trading Initiative, que conta com a New Look e a River Island como membros, afirmou em comunicado que os baixos pagamentos e outros problemas documentados na indústria de vestuário do Reino Unido em 2014 melhoraram desde então, mas claramente não o suficiente. A New Look, entretanto, indicou que desde 2011 teve de reduzir em 80% o número de fornecedores no Reino Unido com quem trabalha para «responder às potenciais fraquezas» da sua cadeia de aprovisionamento.