Riqueza multiplica-se

Os super-ricos da América Latina estão a multiplicar-se mais rapidamente do que em qualquer outro lugar do mundo, cobiçados por marcas de luxo, que pretendem explorar o seu poder de compra, mas criticados pela baixa contribuição fiscal, numa região afetada pela desigualdade.

A região da América Latina é habitada por 600 milhões de pessoas, entre as quais 15.000 detentoras de um património líquido considerado «muito elevado», com fortunas pessoas de pelo menos 30 milhões de dólares, como revelado pela consultora da indústria de luxo Wealth-X. Este valor subiu 5% no ano passado, enquanto o número de multimilionários aumentou para 151, representando um acréscimo de 38%, a taxa de crescimento mais rápida do globo.

A empresa Natixis Global Asset Management, especializada em gestão de grandes fortunas, inaugurou recentemente as primeiras delegações latino-americanas, na Cidade do México e em Montevideu. «Nós identificamo-la claramente como uma das regiões onde a riqueza pessoal está numa fase de crescimento excecional», reconheceu Sophie del Campo, diretora da divisão ibérica da empresa em Madrid.

Escondidos pelos altos muros das suas moradias de luxo, os magnatas da mineração e das telecomunicações, os grandes proprietários de terras e outros que pertencem à elite económica da América Latina são menos visíveis do que as classes mais desfavorecidas da região. Estas são apenas o outro lado da desigualdade social. Os seus estilos de vida luxuosos e números de crescimento atraem o interesse da indústria de luxo global, ávida por se expandir a novos mercados e clientes. A marca Porsche é um exemplo. Desde a sua chegada à América Latina há 15 anos, o construtor de carros desportivos alemão aumentou significativamente as vendas anuais na região, superando os quase 300 veículos iniciais, para 3.900 veículos, revelou George Wills, presidente da divisão latino-americana da Porsche, que tem sede em Miami.

As maiores economias da região, o México e o Brasil, continuam a ser os «drivers de volume», aponta Wills. «Mas se considerarmos em termos dos próprios mercados, aqueles que estão a disfrutar de um bom crescimento são mercados como o Peru, Colômbia, Panamá, com 60% de crescimento em alguns deles», destaca. De acordo com os dados divulgados pela Euromonitor, o mercado de luxo da América Latina totalizará 26.500 milhões de dólares em 2019, um aumento de 88,8% face a 2014 – o maior crescimento mundial. Este crescimento aplica-se, também, a luxos caros. O México é o segundo maior mercado do mundo de jatos particulares, superado apenas pelos EUA, que será ultrapassado pelo Brasil em apenas 10 anos, de acordo com um estudo de mercado recentemente realizado pela construtora de aeronaves brasileira Embraer.

Justiça fiscal
Os super-ricos têm perfis variados, desde o magnata das telecomunicações mexicano Carlos Slim, cuja fortuna, a segunda maior do mundo, está avaliada em 77 mil milhões de dólares, ao magnata da cerveja brasileiro Jorge Paulo Lemann, com um património líquido de 25 mil milhões, a herdeira da mineração chilena Iris Fontbona, com 13.500 milhões de dólares e o banqueiro colombiano Luis Carlos Sarmiento, que soma 13,4 mil milhões de dólares. Os seus números estão a crescer em alguns casos, porque as fortunas familiares foram divididas entre herdeiros, refere Mykolas Rambus, presidente-executivo da Wealth-X, sediada em Singapura.

«O número de pessoas ricas está a aumentar globalmente e isso verifica-se na América Latina: está a crescer a um ritmo muito bom», acrescenta. Mas os super-ricos enfrentam, também, um escrutínio crescente em países como a Nicarágua, onde 42,5% do país vive abaixo do limiar da pobreza, mas 210 indivíduos controlam uma fortuna combinada de 30 mil milhões de dólares, o equivalente a 2,5 vezes o produto interno bruto anual do país.

«A principal característica da desigualdade na América Latina não é o facto de existir um elevado número de pessoas pobres, mas sim o de existirem algumas pessoas que têm imenso», afirma Juan Pablo Jimenez, economista da Comissão Económica da ONU para a América Latina. Em acréscimo, estes últimos «pagam impostos muito baixos, em termos internacionais e em comparação com o que deviam pagar», indica. «Os impostos sobre a riqueza são muito baixos na América Latina, e os impostos de herança são quase inexistentes».

No ano passado, o grupo humanitário Oxfam exigiu mais «justiça fiscal» na região, de forma a combater a desigualdade. Mas é mais fácil dizer do que fazer. O presidente socialista do Equador, Rafael Correa, foi recentemente obrigado a recuar nos planos de tributação de heranças superiores a 35.400 dólares, na sequência de protestos provenientes do mundo dos negócios.