«Queremos crescer mais com os sectores da saúde e da proteção»

Em entrevista ao Portugal Têxtil, o CEO da Fitexar, António Alexandre Falcão, explica que a produção de fibras e fios de alta performance destinados a sectores dos têxteis técnicos está mais voltada para a exportação, que atualmente representa cerca de 20% das vendas da empresa.

António Alexandre Falcão

A Fitexar apresentou os seus novos produtos de maior valor acrescentado na recente edição da Techtextil, onde é presença habitual há vários anos. Segundo o CEO António Alexandre Falcão, trata-se de mais uma aposta para reforçar o caráter inovador da produtora de têxteis lineares filamentares e fibrosos.

Quais são as mais recentes novidades no portefólio da Fitexar?

Não temos nada que seja assim uma grande novidade, que não tenhamos já apresentado em feiras. Mas um dos artigos que foi desenvolvido recentemente é o fio recoberto com fibra de vidro, que é um fio anti-corte, ou seja, é um fio muito técnico. Pode ser aplicado numa luva para fazer uma luva anti-corte. Hoje em dia também podemos fazer este tipo de fios técnicos com fibras sustentáveis. Podemos comprar matéria-prima reciclada e depois trabalhá-la para tentar fazer um fio com a mesma qualidade de um fio de matéria-prima virgem.

Qual é o principal mercado da empresa?

Portugal ainda é o principal mercado. Neste momento exportamos mais ou menos 20% e o objetivo é exportar cada vez mais.

Em que mercados gostariam de crescer?

A Alemanha é um mercado que nos interessa bastante, até porque trabalhamos muito o sector da saúde, um sector muito forte neste mercado. Estamos até em desenvolvimentos com alguns clientes nessa área, por exemplo, temos um cliente para quem estamos agora a iniciar a produção de filtros, com fios de poliéster, para hemodiálise. Andámos os últimos dois anos, mais ou menos, a desenvolver estes fios. Não podem ter químicos, porque vão estar em contacto com o sangue, não podem levar qualquer tipo de óleo, é tudo feito com produtos especiais para o sector da saúde. Portanto, requer aqui uma grande especialização e, mesmo a nível de processos produtivos dentro da fábrica, tivemos de mudar muita coisa, porque são fios muito delicados.

Que outras aplicações podem ter os vossos fios técnicos?

Temos fios para luvas para o trabalho com máquinas pesadas, de corte, também trabalhamos, por exemplo, com luvas para o sector automóvel, para quem trabalha na parte mecânica, por exemplo. Cada um destes artigos requer uma atenção especial e específica. Temos a área do desporto, que é uma área muito importante para nós, onde fazemos praticamente tudo, tanto fio de exterior das peças, como fios de poliéster tingidos, como poliamidas, como também fazemos a parte de interior das peças, que são os fios com elastano, para dar elasticidade às peças de desporto.

Dentro de todos esses sectores, qual tem mais expressão nas vendas?

Neste momento, é a área do desporto. Tem sido uma área que tem vindo a crescer muito, tal como esta área de trabalho e proteção também tem vindo a crescer bastante. Mas o segmento do desporto tem-se revelado nos últimos cinco anos, mais ou menos. Temos tido bastantes empresas em Portugal a crescer neste segmento e nós estamos a acompanhar esse crescimento. Na exportação, queremos crescer mais com os sectores da saúde e da proteção.

Como foram os dois últimos anos para a Fitexar?

O ano da pandemia foi muito complicado, tivemos de recorrer ao lay-off. Não na totalidade, tivemos sempre algum trabalho, principalmente para a área do desporto. Trabalhando essa área, conseguimos aguentar, minimamente. Depois houve um crescimento muito grande nas encomendas têxteis no final do ano de 2020. No início de 2021, houve outra vez uma quebra bastante grande, tivemos outra vez de recorrer ao lay-off. A partir daí, fomos trabalhando. A guerra voltou a mexer um bocado com as coisas, mas de uma forma completamente diferente, se calhar pior até, porque as questões das matérias-primas e aumentos de custos têm sido uma loucura.

Como tem sido feita essa gestão?

É uma gestão muito difícil. Diariamente falamos com os clientes, explicamos a situação. Por exemplo, uma encomenda que poderíamos executar numa semana, passou a ter um prazo de três semanas, porque, por exemplo, podemos ter algum stock de um fio, mas não temos do outro para fazer a mistura. Ou seja, estamos sempre muito dependentes de alguns fios e de algumas matérias-primas que atrasam três meses o contentor. Às vezes nem se sabe onde é que está o contentor. Isso mexe muito, às vezes perdemos encomendas porque não conseguimos executá-las a tempo. O nosso cliente também acaba depois por não conseguir fazer e perde a encomenda para o seu cliente. Para não falar dos preços que estão constantemente a aumentar. Também temos de estar constantemente a tentar aumentar os preços aos nossos clientes, o que é sempre difícil. Estamos a passar uma fase muito inconstante, não sabemos como vai evoluir, mas temos uma relação muito próxima com os clientes e tentamos cada vez mais desenvolver uma relação de parceria com eles – temos de tentar sempre negociar com eles, uma parte fica do nosso lado, outra parte tem de ficar do deles. Felizmente temos bons clientes, que são compreensivos, e tentamos gerir isto da melhor forma com eles.

Tendo esses fatores em conta, como está a correr este ano?

Podia ser melhor se não tivéssemos estes constrangimentos das matérias-primas, mas dentro dos possíveis está a ser um bom ano. Estamos com um crescimento entre os 15% e os 20% face ao ano passado.

Têm feito investimentos?

Independentemente da pandemia, decidimos que deveríamos continuar a investir. No último ano investimos, à vontade, entre 300 a 500 mil euros em máquinas, o que nos aumentou a capacidade produtiva, porque tínhamos necessidade. Este ano investimos ainda mais noutro sector, o dos fios recobertos por jato de ar. Queremos crescer muito nessa área. E tem-se já notado o aumento de faturação devido a essas máquinas.

Que expectativas têm para a totalidade do ano ao nível do volume de negócios?

Temos vindo todos os meses a faturar 15% a 20% mais do que no ano anterior. Portanto, pensamos fechar o ano com, mais ou menos, 5 milhões a 5,5 milhões de euros de faturação.

Quantos trabalhadores tem a Fitexar?

Temos cerca de 70 trabalhadores neste momento. Temos tido muita dificuldade em arranjar gente nova para trabalhar na indústria. Temos que recorrer a pessoas que vêm de fora: têm aparecido muitos venezuelanos, brasileiros, agora, por exemplo, temos um trabalhador do Bangladesh. Pomos anúncios e aparecem. Às vezes também vêm por recomendação de trabalhadores, mas ainda não estamos a ir diretamente lá fora. Já pensámos nisso, mas, para já, ainda não.

Como é atualmente trabalhada a inovação dentro da empresa?

Na inovação, temos três pessoas que estão nesse departamento, não a 100% porque não justifica, mas são pessoas que estão constantemente a desenvolver coisas novas. Todos os dias desenvolvemos coisas novas com os clientes. Depois temos outro lado, que é a parte dos projetos de inovação com consórcios, como o que fizemos no Texboost, que já terminou. Agora estamos noutro projeto, o NEO4Future, com o CITEVE, o CeNTI, universidades e empresas, para desenvolver encapsulados que vão ser introduzidos na própria fibra para depois produzir um fio já com esses encapsulados na fibra, ou seja, é uma propriedade permanente do fio, não sai com lavagens.

Há outros projetos pensados para o futuro?

Estamos num projeto PRR [Plano de Recuperação e Resiliência] que, para já, tem passado todas as fases. Chama-se Pacto da Bioeconomia Azul. Basicamente, o objetivo é produzir fio a partir de algas marinhas e redes de pesca. É um consórcio muito grande e engloba vários sectores, não só o têxtil. Nós estamos no têxtil, que é gerido pela TMG. Para já, ainda estamos a concorrer. Mas se andar para a frente vai ser bastante interessante.