«Como podem ver, ainda estou aqui», brinca o designer, vestido com fato, gravata e sapatilhas, enquanto evoca memórias, projetos e até comenta a crise dos coletes amarelos, numa conversa informal com a AFP. «Atualmente cansado», o designer já não se desloca ao seu estúdio localizado por cima da loja Pierre Cardin, em frente ao Palácio do Eliseu [a residência oficial do presidente francês], mas continua «sempre, sempre, sempre» a desenhar. «É a minha razão de viver, a minha realidade, a minha droga», revela.
Até ao momento, o designer evitou todas as questões relacionadas com o futuro da sua marca, que tem perdido dinâmica em França, apesar de ainda manter a sua vivacidade na Ásia e nos EUA. Três meses após o desaparecimento de Karl Lagerfeld, Pierre Cardin aprovou a produção de um filme acerca da sua vida e confessa estar a pensar na sucessão. «Quando eu morrer, claro que haverá sucessores… Tenho três jovens muito bons, mas não quero que repitam o que já fiz», assegura.
Pierre Cardin não vai parar
Contudo, o designer garante que ainda tem muito para fazer. Atualmente, está a preparar um desfile, que se realiza em maio no Palácio Bulles, a sua residência de férias em Cannes, e vai receber a artista Mireille Mathieu a 26 de julho no Festival Lacoste, criado por si, no sul de França.
O Brooklyn Museum, em Nova Iorque, vai apresentar um trabalho de retrospetiva do designer, este verão, destacando o seu caráter vanguardista e a sua influência para além da moda. «Fui bem-sucedido em tudo o que fiz. Fui um privilegiado», reconhece Pierre Cardin, que lidera um império que vai desde a moda a restaurantes, passando por perfumes, hotelaria e viagens, presente em 140 países.
Mas, qual é segredo do seu sucesso? «Sempre fui independente e livre, os outros são Arnault, Pinault», responde, referindo-se aos grupos de luxo como LVMH e Kering. «Sou fiel a mim próprio, mesmo que erre. [Porém] não me enganei. Eu acreditei na Cardin», explica. «É preciso ser profissional», sublinha o ex-contabilista, que ainda supervisiona hoje as contas do seu império.
O negócio não está a correr bem para a sua loja nem para o restaurante Maxim, localizados na área onde têm decorrido, com regularidade, protestos do movimento coletes amarelos. «Eles têm as suas razões. Não os julgo e compreendo-os. No entanto, seria ridículo dizer que faço parte do movimento, não iriam acreditar em mim. Seria melhor dar-lhes mais 150 euros… Vejam quanto dinheiro já perdemos» admite, rejeitando a exigência de aumento dos impostos sobre as grandes fortunas. «Se não houver ricos, haverá ainda mais pessoas pobres», afirma.
Maryse Gaspard, ex-modelo e musa do designer, que gere a empresa Pierre Cardin, apresentou à AFP uma seleção de algumas novas criações: calças bicolores, um vestido trapézio, um casaco preto futurista e vestidos em crepe sintético para mulheres «modernas», que gostam de viajar.

No escritório de Pierre Cardin, há uma maquete de um centro cultural que quer construir, água de nascente de Toscana numa garrafa desenhada por si e um exemplar da revista Time de 1974, da qual foi capa. O criador de moda mostra ainda fotos suas com Fidel Castro e Benazir Bhutto, à medida que folheia as páginas da revista Orpheu de Jean Cocteau, que recebeu de presente de Christian Dior quando saiu da empresa. «Fui eu que fiz o fato Bar (modelo emblemático da Dior)», garante. Contudo, atualmente, não segue aquilo que a Dior faz. «Não é como era antes. Felizmente», declara.
A moda do futuro
Não obstante, há duas exceções: Jean-Paul Gaultier, que começou a sua carreira na Pierre Cardin, e o jovem designer Jacquemus, cujo desfile de moda viu em 2018. «Jean-Paul tinha 17 anos quando entrou para a minha empresa, fui eu que lancei a sua carreira, acreditei nele e continuo a acreditar. Foi o único a quem dei um pouco de apoio», confessa. «No meu estilo, eu sou recatado, ele é mais provocador», compara.
Há mais alguma coisa que lhe falte explorar na moda? «Os vestidos pintados no corpo são uma coisa do futuro. Se tivesse 20 ou 30 anos é o que faria», adianta.
Pierre Cardin define elegância numa palavra: «sobriedade». Quando vestiu mulheres como Jeanne Moreau, Charlotte Rampling or Maïa Plissetskay, tentou «destacar as suas características com simplicidade», reconhece.
«Tenho 20 pares de calças iguais, material igual e corte igual. Os casacos também são iguais, é o meu estilo, exceto as sapatilhas», conta. O criador de moda adotou um elemento sportswear, porque é «confortável».