A chave do Peru para desbloquear os mercados europeus reside no alinhamento das suas iniciativas de sustentabilidade com a visão da UE. No entanto, há vários desafios que se colocam, incluindo as alterações climáticas, a instabilidade política e a concorrência mundial, nomeadamente da Índia e da China, destaca um artigo do Just Style.
A Estratégia da UE para os Têxteis Sustentáveis e Circulares prevê que o consumo de vestuário e calçado dispare 63% até 2030. O documento determina que os têxteis colocados no mercado da UE até ao final desta década sejam duráveis, recicláveis, sem substâncias nocivas na sua composição e produzidos com respeito pelos direitos sociais e ambientais.
O Peru espera conquistar um nicho neste mercado europeu em evolução, ampliando o alcance das suas fibras de camelídeo e vestuário acabado. Esse esforço está a ser liderado pelo Promperú, a entidade peruana de promoção das exportações e turismo, que lançou, ainda em 2019, uma estratégia de cultura sustentável, cuja implementação foi adiada pela Covid, mas que está agora em curso e visa incorporar a sustentabilidade no coração do sector de exportação do Peru, preservando tanto o ambiente como as comunidades locais. Através desta perspetiva, o Promperú procura garantir que os produtos não estejam relacionados com o desmatamento, manter a diligência na cadeia de aprovisionamento, adotar modelos de negócios circulares e manter práticas justas para as comunidades e criadores de alpacas.
O país está igualmente a integrar padrões de certificação que foram desenvolvidos pelo governo com parceiros privados. Estas certificações, que o governo considera serem «elementos críticos de diferenciação» deverão permitir que os produtos peruanos sejam uma classe à parte nos mercados internacionais, explica Carlos Penny, presidente do comité têxtil da ADEX – Asociación de Exportadores, ao Just Style, acrescentando que é necessário um apoio financeiro substancial para cumprir as normas de certificação da UE. «Estamos a recorrer a instituições como a USAID e a Swiss Cooperation [a divisão de cooperação económica e de desenvolvimento da Secretaria de Estado para os Assuntos Económicos da Suíça – SECO] para apoiar financeiramente as nossas pequenas e médias empresas durante esta jornada de certificação», indica.
O desafio das alterações climáticas
Segundo Carlos Penny, os produtores locais de fibra são o eixo fundamental desta estratégia, mas necessitam de uma base monetária para fazer esta mudança estratégica para as exportações focadas na sustentabilidade. A abordagem estratégica da ADEX integra ferramentas educacionais, como uma Escola ADEX e programas universitários relacionados para galvanizar os produtores locais. As autoridades compreendem também a necessidade de gerar apoio popular, uma vez que estas iniciativas se cruzam com as realidades complexas dos criadores locais de alpacas. «Um negócio lucrativo de camelídeos exige um rebanho de pelo menos 300. Convencer pequenas operações familiares a construir cooperativas, aumentando os seus rebanhos, ao mesmo tempo que promovemos a confiança continua a ser uma tarefa difícil», realça o responsável.
Os números das exportações provam esta complexidade. Em junho de 2023, de acordo com dados da ADEX, as exportações de fios do Peru totalizaram 57,8 milhões de dólares entre janeiro e junho de 2023, 76% dos quais resultantes da venda de fibras finas. No entanto, os envios de produtos de alpaca diminuíram 9% em relação ao ano anterior por causa das questões climatéricas, baixando para 85,1 milhões de dólares nos primeiros seis meses deste ano, em comparação com 93,8 milhões de dólares no período homólogo de 2022.
Ameaças da Ásia
Felizmente, acredita a ADEX, a colaboração proativa está a dar frutos, com a junção de forças com a Promperu a permitir o fortalecimento das relações comerciais com os principais países importadores, como Itália e os países nórdicos, garantindo, ao mesmo tempo, a integridade dos fios de alpaca peruana nas peças de vestuário feitas na China.
Há, no entanto, um desafio que vem da Ásia, nomeadamente no que diz respeito ao algodão e às importações provenientes da Índia que ameaçam os produtores peruanos. «Antecipamos taxas governamentais para proteger a nossa indústria do algodão de uma potencial inundação por importações indianas», sublinha Carlos Penny.
Contudo, decisões como essa terão de ser resultantes de um governo sólido e o Peru ainda se debate com turbulências internas. O ex-presidente Pedro Castillo foi destituído do cargo em dezembro do ano passado após uma tentativa de autogolpe, que teria fechado o Congresso do Peru. A sua sucessora, a Presidente Dina Boluarte, declarou a 18 de setembro o estado de emergência em três distritos da capital Lima assolados pela criminalidade, uma medida que permite aos militares ajudar a reforçar a segurança.
Alimentada pela agitação política e social, a estagnação económica está a lançar sombras sobre as perspetivas de crescimento do país. O Banco Central do Peru reviu em baixa as previsões de crescimento do PIB para 2023 de 2,6% para 2,2%, enquanto o BBVA Research prevê uma economia ainda mais lenta, projetando um crescimento de apenas 1,6% em 2023 e a possibilidade de um crescimento de 2,6% em 2024.
«Os desafios do Peru são assustadores», admite o responsável da ADEX. «Mas o otimismo prevalece. Como disse certa vez Jorge Basadre, o reputado historiador peruano: “O Peru é maior que seus problemas”», conclui Carlos Penny.