Os diferentes elos da cadeia

A escravidão moderna, a falta de informação sobre as práticas laborais dentro da cadeia de aprovisionamento e a supervisão inadequada dos fornecedores representam algumas das maiores ameaças à reputação das marcas em 2016, de acordo com um novo relatório.

O Human Rights Outlook 2016, publicado pela consultora Verisk Maplecroft, identifica as principais áreas de risco em crescendo para as empresas com cadeias de aprovisionamento globais. Em particular, o relatório destaca o recrutamento antiético de migrantes como um dos maiores desafios enfrentados pelas empresas, revela o Just-style.

De acordo com o documento, a reputação das marcas está sob ameaça crescente devido à nova legislação que obriga à divulgação de informação, tais como o Modern Slavery Act no Reino Unido (ver Sustentabilidade ao centro), a par de um maior escrutínio público em relação às cadeias de aprovisionamento. O relatório também reconhece a crise migratória da Europa como catalisadora do trabalho forçado.

Eis os 10 riscos destacados pelo Human Rights Outlook para 2016:

1 – Recrutamento – Construção de confiança no recrutamento ético

O impacto dos corretores antiéticos é flagrante nos corredores de recrutamento no Médio Oriente e na Ásia, onde os países dependem de trabalhadores migrantes. Os recrutados são especialmente vulneráveis ​​à exploração e ao tráfico em condições de trabalho forçado.

A alteração do comportamento dos corretores e um recrutamento ético exigem uma ação multilateral coordenada, encetada por governos, organizações intergovernamentais, sociedade civil e empresas.

Embora tais medidas estejam já a emergir ao nível internacional e regional, estas iniciativas estão apenas no início e necessitam de coordenação e investimento de tempo e dinheiro de todas as partes envolvidas.

2 – As cadeias de aprovisionamento – A rastreabilidade

As cadeias de aprovisionamento com vários atores envolvidos e muitas camadas apresentam dificuldades significativas para um mapeamento de precisão, especialmente quando incluem pequenos produtores e redes informais.

Mapear os principais fornecedores, que são influentes porque abastecem vários sub-fornecedores pode ser um primeiro passo eficaz para melhorar a rastreabilidade e a proteção dos pequenos produtores. Encontrar os fornecedores críticos dentro da cadeia de aprovisionamento também ajuda a assegurar que os produtos são produzidos através de práticas éticas.

3 – Além da auditoria – O aumento da responsabilidade da cadeia de aprovisionamento

Apesar do reconhecimento de que o processo de auditoria atual tem falhas, as auditorias permanecem como pedra angular dos sistemas de aprovisionamento responsáveis.

A curto prazo, no entanto, as empresas vão, provavelmente, precisar de investir em novas tecnologias, no diálogo aberto e em relacionamentos fortes. Os questionários via telemóvel aos trabalhadores, o diálogo social encorajador entre fornecedores e sindicatos, tal como a formação em direitos do trabalho exigem compromissos de longo prazo entre as empresas e respetivos fornecedores.

4: Comunicação obrigatória – A transparência da cadeia de aprovisionamento

Ter boa reputação pelo sourcing responsável vai tornar-se cada vez mais competitivo em 2016, com as empresas a serem medidas em relação aos seus pares.

O facto de as marcas serem agora obrigadas a apresentar um relatório sobre os direitos humanos ao longo das suas cadeias de aprovisionamento reflete o pressuposto público de que estas têm uma responsabilidade significativa pelas violações cometidas por todos os seus fornecedores.

As empresas que implementam programas que se aplicam apenas a uma pequena percentagem dos fornecedores podem enfrentar pressões para mapearem em pleno as suas cadeias de aprovisionamento.

5 – Migração – Prevenir o trabalho forçado em cadeias de aprovisionamento europeias

No início de 2016, a Turquia albergava quase 2,5 milhões de refugiados, a maioria proveniente da Síria. Até janeiro, esses homens e mulheres não foram autorizados a trabalhar de forma legal no país e, por isso, têm estado extremamente vulneráveis ​​à exploração (ver Refugiados ilegais na ITV). De acordo com dados divulgados recentemente, os refugiados estão a trabalhar informalmente em fábricas de vestuário onde recebem salários até 40% mais baixos do que os próprios turcos.

Esta tendência deverá manter-se em 2016. Os refugiados não deverão conseguir autorizações de trabalho uma vez que têm de solicitar e utilizar essas licenças na província onde se registaram pela primeira vez.

Monitorizar e gerir os riscos de associação com trabalho forçado e trabalho infantil – e ao mesmo tempo respeitar os direitos dos refugiados – representa um desafio considerável para a ​​reputação das empresas.

6 – Salário mínimo – Corresponder às expectativas

As mudanças nos valores pagos aos trabalhadores refletem a consciencialização entre as partes interessadas de que o cumprimento do “salário mínimo” – que pode não ser suficiente para providenciar um padrão de vida digno – nem sempre é o bastante para combater a pobreza.

Pagar um salário que cubra os custos dos trabalhadores com saúde e edução é reconhecido como uma ferramenta que pode proteger os trabalhadores da escravidão moderna. Deste modo, o escrutínio público de saber se as empresas estão a pagar um salário justo vai continuar em 2016. Inicialmente exigido em grande parte por sindicatos, o salário mínimo está a tornar-se uma exigência mainstream.

Uma abordagem coordenada no cálculo do salário justo – envolvendo governos, trabalhadores e empresários – é essencial para atenuar as preocupações dos fornecedores face a custos mais elevados com os trabalhadores poderem prejudicar a competitividade.

Será necessária uma estreita colaboração com os fornecedores para garantir que os valores pagos são o suficiente para suportar um aumento nos custos de laboração.

7 – As condições de trabalho – Os direitos dos trabalhadores na Parceria Trans-Pacífica (TPP)

O crescente reconhecimento de que os direitos dos trabalhadores são uma questão importante no comércio global foi destacado pela inclusão de um capítulo relativo aos direitos laborais na TPP (ver Os detalhes do TPP). Embora as disposições do capítulo não sejam vinculativas, podem aumentar o controlo nos direitos dos trabalhadores nas cadeias de aprovisionamento nos países membros.

No caso do Vietname, Malásia e Brunei, os acordos bilaterais estipulam reformas de direitos laborais como condição de acesso ao pleno dos benefícios da TPP – o que significa que as reformas são prováveis.

Independentemente das medidas adotadas pelos países, as empresas podem obter publicidade negativa se as condições das suas cadeias de aprovisionamento violarem as disposições da TPP.

8: Responsabilidade social corporativa – Desaceleração do preço das matérias-primas

Embora a desaceleração nos preços das matérias-primas deixe às empresas pouca opção a não ser cortar custos, as relações positivas com as comunidades locais são encaradas como fundamentais para o projeto da sustentabilidade a longo prazo.

9 – Paridade – Licença parental paga e o fim da discriminação

O escrutínio público das políticas de paridade das empresas irá aumentar em 2016, uma vez que a licença de maternidade financiada pelo governo tem recebido uma atenção sem precedentes nas eleições presidenciais dos EUA. A formação e o recrutamento de mulheres qualificadas será, portanto, um tema em destaque.

10 – COP 21 – Integrar os direitos humanos na questão das alterações climáticas

As conclusões do Acordo de Paris, assinado no final Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (COP 21), vão aumentar a pressão para as empresas explicarem todas as suas emissões de carbono, desde a fabricação até à embalagem, passando pelo descarte do produto (ver As conclusões da Cimeira do Clima).

Uma das principais mensagens sinalizadas no relatório é a de que as empresas são, agora, em última análise, responsáveis por todos os trabalhadores que contribuem para a extração das matérias-primas que usam nos seus produtos finais.

«As soluções para os desafios, tais como o recrutamento antiético, vão exigir uma responsabilidade partilhada e uma ação coletiva das organizações internacionais, governos, empresas e ONG’s», resumem os autores.