A 24 de fevereiro, a Rússia invadiu a vizinha Ucrânia, alegando que a ocidentalização dos valores do país liderado por Volodymyr Zelensky eram uma ameaça. O impacto na indústria e no mercado da moda foi sentido quase de imediato e ainda hoje os mercados mundiais sentem os seus efeitos, com destaque para a Europa.
De acordo com o “The Ukraine Conflict Executive Briefing”, publicado pela GlobalData, a Rússia era o quinto maior mercado de vestuário na Europa e o 10.º no mundo em 2021, com vendas de 46,4 mil milhões de dólares (cerca de 42,7 mil milhões de euros). O mercado ucraniano estava avaliado, no mesmo ano, em 3,5 mil milhões de dólares.
Apenas um mês antes do início da guerra, as vendas de vestuário da Rússia tinham caído para 31,76 mil milhões de dólares, uma perda de 14,64 mil milhões de dólares. A GlobalData estima que o conflito Rússia-Ucrânia irá reduzir em 18,8 mil milhões de dólares o mercado russo de vestuário em 2022, com o consumo a dever manter-se abaixo das previsões pré-conflito até 2025.
Pippa Stephens, analista de vestuário na GlobalData, explicou ao Just Style que o aumento dos preços das commodities como resultado do conflito afetou a indústria têxtil e vestuário por toda a Europa. «O impacto tem consequências mais vastas na cadeia de aprovisionamento e no preço dos têxteis. Está igualmente a contribuir para uma pressão inflacionária adicional nos bolsos dos consumidores, que irá fazer com que o consumo divirja das compras de vestuário para artigos mais essenciais», aponta.
A analista revela ainda que, apesar da Alemanha, da Itália e do Reino Unido serem os maiores mercados para o vestuário da Europa, o estudo “Apparel Market in Europe 2020-2025” mostra que o maior crescimento nos próximos três anos deverá acontecer nos mercados menos desenvolvidos. «A Turquia deverá registar o maior aumento nas vendas até 2025, enquanto os países da Europa de Leste como a Roménia, a Polónia e Bulgária vão ter performances fortes. A Rússia e a Ucrânia terão dificuldades devido à guerra, que afetou a confiança dos consumidores e levou muitos retalhistas a parar as operações nestas regiões», afirma Pippa Stephens.
O desafio dos custos e da sustentabilidade
Para além da guerra e da inflação, nomeadamente ao nível das matérias-primas – as cheias no Paquistão, por exemplo, deverão afetar o mercado do algodão – e da energia – que levou a que muitas empresas efetuassem investimentos em caldeiras de biomassa e painéis fotovoltaicos –, as preocupações com a sustentabilidade dominaram 2022 e deverão continuar em 2023, especialmente tendo em conta a Estratégia Europeia para os Têxteis.
Na 37.ª Convenção Mundial de Moda da International Apparel Federation (IAF), em novembro, Dirk Vantyghem, diretor-geral da Euratex, explicou que a Europa está a repensar as suas interações com os parceiros mundiais, para ter uma relação mais crítica com terceiros e em respeito dos direitos humanos, do ambiente e dos regulamentos químicos.
Um dos objetivos da nova política europeia é, de resto, assegurar que todos os produtos têxteis que estejam no mercado europeu sejam duráveis, reparáveis e recicláveis e, em grande medida, sejam fabricados com fibras recicladas, sem substâncias perigosas e produzidas com respeito pelos direitos sociais. «Vamos trabalhar em conjunto para construir uma indústria têxtil e vestuário mundial sustentável», apelou Dirk Vantyghem.
Neste âmbito, a recolha seletiva de têxteis deverá ser obrigatória a partir de 2025 em todos os países da UE, sendo que muitos começam a implementar sistemas de responsabilidade alargada do produtor. França, Alemanha e Países Baixos têm já nova legislação para 2023 nesse sentido.