Num passado não muito distante, os retalhistas detinham o controlo sobre os clientes sempre que estes entravam nas suas lojas. Mas a ascensão dos smartphones veio alterar esta dinâmica. Os clientes podem estar fisicamente presentes numa loja e averiguarem, simultaneamente, os preços praticados pela rival através da Internet, analisando quais as melhores ofertas.
A conveniência das compras online tem potenciado o sucesso da Amazon nos EUA e da plataforma Alibaba na China. Porém, a popularidade crescente dos smartphones fomentou, também, o surgimento de um outro desafio para os retalhistas físicos e online. Os consumidores despendem cada vez mais tempo nos media sociais. Por conseguinte, as redes sociais estão a tentar adicionar o denominado comércio social às suas operações, seduzidas pela receita adicional que isso poderá trazer.
As redes sociais, como o Facebook, Twitter e Instagram, apressam-se a incluir funcionalidades que permitem que os consumidores efetuem compras através das suas redes. Os analistas do SunTrust Robinson Humphrey, um banco de investimento americano, estimam que a inclusão desta funcionalidade no Facebook poderá aumentar a sua receita anual entre 5% a 10%.
Nick Beighton, diretor-executivo da retalhista online Asos, considera que o comércio social é a última etapa da evolução do retalho digital. As fases anteriores focaram-se na escolha de produtos online e na conveniência da entrega. «A terceira onda é o grande E no e-commerce – comércio emocional e ligação emocional com o cliente», afirma Beighton. «O que representa e porque é que os clientes se devem relacionar com a proposta apresentada, além dos requisitos das transações de compra? As redes sociais e as compras sociais são uma parte disso», refere.
Mike Moriarty, associado na AT Kearney, uma empresa de consultoria de gestão, destaca que «há dois tipos de vendas nas redes sociais. O Etsy, o eBay e o Alibaba fazem a ligação entre os vendedores e os compradores. O Facebook e o Pinterest conduzem os compradores aos sites dos vendedores».
Para os retalhistas, o Instagram é encarado como o Santo Graal do comércio social, uma vez que esta aplicação de partilha de fotografias se presta ao ato de fazer compras. O Instagram ainda não armazena detalhes de pagamento que permitam efetuar compras diretamente a partir de uma fotografia, mas os retalhistas e as empresas de tecnologia estão a desenvolver os seus próprios sistemas de compras, tornando possível a realização de compras a partir do Instagram. Alguns estão a transformar as fotografias publicadas pelos clientes em plataformas como o Instagram em algo “comprável” a partir dos seus próprios websites, com a sua própria tecnologia ou recorrendo a empresas de software como a Olapic. A Olapic, cuja tecnologia é já usada por mais de 200 marcas e retalhistas para disponibilizar selfies dos clientes nos seus próprios websites comerciais, estima que as compras efetuadas a partir de selfies pode aumentar a proporção de visitantes de um website que avançam posteriormente para a compra, de 5% para cerca de 10% a 12%.
A procura de compras através da internet não denota sinais de abrandamento. De acordo com a AT Kearney, o segmento online representa cerca de 7,5% das vendas mundiais. Neste contexto, o Reino Unido lidera com cerca de 13,5%, face a 10% nos EUA. Em contrapartida, cerca de 4% das vendas japonesas são feitas online, mas 90% destas ocorrem através de dispositivos móveis.
Os retalhistas físicos também têm reagido a esta tendência. Primeiro, estão a tentar envolver os seus clientes através das redes sociais. A Burberry liderou esta transformação, criando a sua própria rede social, Art of the Trench, em 2009. Foi também uma das primeiras empresas a vender através de um tweet (publicação na rede social Twitter). Paralelamente, recorreu, também, ao Periscope, uma aplicação de transmissão de vídeo em tempo real, transmitindo eventos e, mais recentemente, tornou-se a primeira marca a divulgar a sessão fotográfica da sua campanha de publicidade através da plataforma social Snapchat.
A retalhista online de moda Asos, com uma forte procura junto dos jovens adultos, recorre aos media sociais para interagir com os seus clientes tecnologicamente experientes. «Se existe uma plataforma que os nossos jovens, na casa dos vinte anos usam, e que é popular, tentamos aderir», confirma Beighton.
No entanto, existem regras de envolvimento quando se trata de estabelecer uma relação e servir os clientes através dos media sociais.
Felix Scarlett, diretor na GDR Creative Intelligence, uma empresa de consultoria de tendências de retalho, destacou a existência de regras no que diz respeito ao envolvimento do cliente. Uma das regras de ouro, sustenta, é que apenas uma em cada quatro ou cinco mensagens deve ser relativa a vendas, e não de forma demasiado evidente. «Dessa forma, a marca está a falar como um amigo», afirma. «Os seus amigos não lhe tentam vender coisas constantemente. Eles têm conversas amigáveis consigo», sublinha.
Os retalhistas tradicionais estão ainda a tentar combater os gigantes da tecnologia de outras formas. Por exemplo, a Amazon tem-se focado na conveniência, garantindo períodos de entrega de uma hora através do seu serviço de assinatura Amazon Prime. A retalhista britânica Argos está a transformar-se, abandonando o seu posicionamento de negócio de catálogo para uma empresa digital, tendo introduzido um serviço de entrega no mesmo dia da encomenda em todo o território do Reino Unido.
Simultaneamente, alguns gigantes da tecnologia e retalhistas online optam pela criação de espaços físicos. A Amazon inaugurou recentemente uma livraria física em Seattle, nos EUA, e tem vindo a testar o segmento de retalho físico com quiosques Kindle e máquinas de venda automáticas em locais como centros comerciais e aeroportos. A Google, por sua vez, inaugurou em Londres uma shop-in-shop na Currys, uma cadeia britânica de eletrónica e eletrodomésticos.
A Farfetch, a plataforma online de retalho de luxo, adquiriu a Browns, uma das boutiques de moda mais conhecidas de Londres e retalhistas online americanas, como a Bonobos e a Warby Parker, também inauguraram lojas físicas.
«As marcas digitais progressivas, concebidas com o intuito de criarem novas formas de envolvimento com os clientes e fomentarem a compra de produtos online, estão a deslocar-se para o denominado mundo offline tradicional», afirma Michelle DuPrât, diretora da agência de design de retalho Household. «É o local onde as compras em qualquer canal podem ser realizadas de forma imediata e simples. Onde os produtos podem ser testados junto dos consumidores antes de irem para o online. Onde as experiências de descoberta divertidas, táteis e educativas podem potenciar o valor da marca e impulsionar as vendas, e onde o foco na experiência do serviço é a chave para a conversão», acrescenta.
Para Paul Schottmiller, estratega de retalho na consultora Kurt Salmon, a abertura de lojas físicas pelos retalhistas online reflete, também, uma tendência crescente de fomentação do contacto humano na trajetória online. Outros elementos incluem a disponibilização de pessoas que auxiliem o percurso até à finalização da compra e ofertas e promoções personalizadas. «Isso faz a diferença em termos de nível de satisfação», destaca.
Richard Hyman, analista de retalho independente responsável pelo website Richard Talks Retail, acredita que a tecnologia não será a vencedora desta batalha pela atenção do cliente, mas sim a compreensão do que o cliente pretende, construindo as várias etapas do percurso para trás tendo como referência esse ponto de partida. «A tecnologia é um elemento de apoio em tudo isto. Não é o mais importante», assegura.