Lacoste afina estratégia

A marca francesa que tem o leme artístico nas mãos do português Felipe Oliveira Baptista tem vindo a agitar as águas da moda, num esforço para se reposicionar no mercado, adaptar-se a uma paisagem de retalho em constante mutação e apelar ao guarda-roupa dos millennials.

A marca de lifestyle erguida em 1933 pelo “crocodilo original” René Lacoste está atualmente presente em 114 países e dois produtos Lacoste são vendidos a cada dois segundos nas suas lojas, corners ou rede de distribuição selecionada.

Entretanto, analisa o portal de moda Fashionista, passaram 14 anos desde que a Lacoste começou a desfilar na semana de moda de Nova Iorque, interrompidos em setembro pelo regresso a casa – Paris –, a propósito do 85º aniversário.

Passerelle em mudança

O desfile teve lugar no Jardin des Tuileries, onde se ergueu uma estrutura branca para um campo com as linhas de diferentes modalidades desportivas.

Para a ocasião, a primeira fila incluiu uma grande parte da família Lacoste, assim como o atual embaixador da marca, Novak Djokovic.

«É uma coleção que reescreve com humor e inventividade a herança da marca, sem a santificar ou cristalizar, muito pelo contrário, será sempre mantida em constante movimento», destacou a Lacoste em comunicado.

Os crocodilos dourados nas fivelas dos mocassins, os botões dourados de um casaco canelado e um blazer cortado a partir de uma sweatshirt sublinharam a interseção do formal e informal na coleção.

«Todos os limites entre o que é sportswear e o que usamos para o trabalho estão a cair. Como designer, é um momento muito interessante para impulsionar ainda mais essas reflexões», reconheceu o diretor criativo Felipe Oliveira Baptista nos bastidores.

No centro do bolo esteve o polo branco, a “obra-prima” criada há 85 anos, que serviu de vela à comemoração. A peça voltou para uma vida fora dos courts de ténis e prestou-se a propostas ousadas. Para os homens, surgiu oversized em cima de uns jeans ou, então, ganhou a visão de um clássico subvertido. Para as mulheres, envolveu o corpo, descobriu o ombro e tornou-se num vestido de noite.

Os artistas Mathias Augustyniak e Michael Amzalag da M/M (Paris) foram convidados pelo diretor criativo para desenvolver um padrão para a coleção, dando continuidade às várias alianças criativas estabelecidas pela Lacoste na era de Baptista.

Em termos dos desfiles da marca, Thierry Guibert, o novo CEO recrutado em 2015, está ainda a repensar o calendário e a geografia. Em vez de desfilar duas vezes por ano, o CEO adiantou que esse investimento de marketing poderá vir a ser distribuído por outros eventos em diferentes mercados, como Los Angeles.

Retalho com novo rosto

A entrada de Thierry Guibert na empresa francesa coincidiu não só com um ambiente de retalho desafiante, mas também com a proeminência de algumas tendências com as quais a Lacoste tem procurado equipar-se: athleisure, logomania e nostalgia.

Para a decoração dos espaços de retalho da marca, pelo menos, Guibert parece estar a preferir o desporto em relação à moda.

A loja recentemente inaugurada em Beverly Hills, que mereceu destaque em todos os portais da especialidade, brinda à herança desportiva da Lacoste, sendo preenchida por vários pormenores de design que rementem para o ténis. Outro dos elementos de decoração que mais se evidencia no novo espaço de vendas da marca no estado norte-americano da Califórnia é a paleta de cor, que honra a bandeira francesa (azul, branco e vermelho).

Ainda no retalho, a Lacoste tem vindo a aplicar a estratégia de marcas de luxo como a Michael Kors ou gigantes desportivas como a Nike, apostando nas vendas diretas ao consumidor e cortando nos intermediários, isto é, retalhistas multimarca que praticam o desconto excessivo ou descuram o branding da marca. Recentemente, a Lacoste retirou inclusivamente muitos dos seus artigos das prateleiras de grandes armazéns como a Macy’s e a Nordstrom, diminuiu a sua atividade promocional e concentrou-se no seu produto principal.

O CEO da Lacoste revelou que a marca, que não divulga números de vendas, assistiu a um crescimento na ordem dos dois dígitos em vendas comparáveis como resultado desta estratégia de retalho.

Ainda assim, em lojas operadas diretamente, a Lacoste teve declínios no tráfego devido às compras online. Thierry Guibert espera que os investimentos em tecnologia centrada no cliente, como o check-out via iPad e a capacidade de encomendar tamanhos e cores não disponíveis em loja, ajudarão a marca a recuperar – assim como as colaborações já referidas.

A Lacoste está também à procura de desenvolver a sua categoria desportiva, que desfruta de um crescendo de popularidade graças à tendência do athleisure.

Guibert recuperou ainda os negócios de calçado e artigos de couro da Lacoste na esperança de reconstruir essas categorias – especialmente o calçado desportivo. Um «produto moderno para consumidores jovens», nas palavras do CEO, que espera que o calçado, atualmente nos 15%, venha a representar 30% do negócio.

Relativamente aos público-alvo da marca, alguns dos esforços recentes da Lacoste foram feitos para atrair os millennials e alimentar uma imagem de marca mais “cool”.

«A Lacoste era, há alguns anos, considerada uma marca que os pais usavam», reconheceu Thierry Guibert. Para conquistar os consumidores mais jovens «é preciso fazê-los pensar que a marca está a evoluir, a [tornar-se] mais urbana, mais cool e casual, por isso as colaborações são muito importantes para nós», sublinhou.

Contudo, a principal prioridade de Guibert, antes dos desfiles e do retalho, é a própria marca.

«O mais importante para mim, desde que entrei na Lacoste, foi estabelecer valores dentro da empresa e fora dela, como o fair play e o compromisso – esse tipo de valores sem arrogância», diz. O CEO pretende que a Lacoste seja entendida como acessível e não como marca de luxo. «O tipo de arrogância das marcas de luxo – isso não é Lacoste», assegurou.