Os produtores, analistas e empresários ligados à moda italiana, reunidos na antiga bolsa de Milão no final do ano passado, no seu encontro anual, aperceberam-se de que a marca italiana Gucci já chegou onde a maior parte deles ainda tem de chegar. «O mercado asiático cresce rapidamente. Neste momento, 16 por cento do volume de vendas da Gucci vem daí, mas, nos próximos três anos, a marca vai atingir uma quota de 30 por cento», prevê Domenico De Sole, ex-director da Gucci.
Os produtores de artigos de luxo que, há pouco mais de uma década, não conheciam a palavra “dificuldades”, têm sido bastante prejudicados nos últimos tempos, mas agora o grande mestre do ramo – De Sole – prevê uma melhoria da situação. Ainda há poucos meses, a Gucci anunciava perdas de 18 milhões de euros, mas esses são já tempos passados. A procura dos seus artigos de luxo recomeçou, principalmente, no Japão e nos EUA. «As nossas previsões são positivas», revela um porta-voz da empresa. «Com câmbios estáveis, o volume de vendas aumentou 20 por cento nos EUA e 14 por cento no Japão».
Nos anos 90, o crescimento deste sector parecia não ter limites. Os volumes de venda mantinham-se permanentemente acima dos 10 por cento. Mas, após o 11 de Setembro, as cadeiras dos compradores americanos nas feiras de moda em Milão ficaram vazias e, quando o SRAS começou a propagar-se, os compradores asiáticos também começaram a faltar. O conflito no Iraque fez o resto. «As consequências desta guerra são imprevisíveis», sustentava Francesso Trapano, director da Bulgari, no início deste ano.
Entretanto, os negócios da Bulgari também correram melhor do que o previsto. No ano transacto, o seu volume de negócios diminuiu 6,6 milhões de euros, atingindo um total de 512 milhões de euros. Mesmo assim, a empresa conseguiu aumentar o seu lucro mais 20 por cento, atingindo um valor de 43,9 milhões de euros, em consequência de uma gestão de sucesso das despesas. Ao mesmo tempo conseguiu compensar as quedas nos negócios europeus. «O crescimento dos nossos negócios na Ásia encontra-se acima dos 10 por cento, o que nos deixa muito satisfeitos e os negócios nos EUA também retomam», afirma Trapano.
Os analistas também ganham cada vez mais confiança. Os analistas da Merrill Lynch, por exemplo, prevêem um crescimento anual até 8 por cento no volume de vendas dos artigos de luxo nos próximos três anos. Os lucros vão subir, em média, 13 por cento. «As tendências são, sem dúvida, positivas», declara Paolo Durante, analista da Merrill-Lynch em Milão.
Acrise chegou ao fim? Provavelmente ainda não. Também existem vozes críticas que chamam a atenção para o facto de a antiga fórmula de triunfo moda de luxo mais nome de marca igual a sucesso já não ser válida. Segundo a Pambianco, uma empresa de consultoria na área da moda, a baixa de, em média, 7 por cento nos 14 maiores grupos de moda italianos não é justificada apenas pela guerra, pelo SARS e pela situação económica. «As regras do jogo mudaram», diz Paolo Pambianco. Um nome bem conhecido já não é suficiente. «A crise apoia os concorrentes com produtos mais baratos e com uma frequência de fornecimento mais rápida».
Os argumentos de Paolo Pambianco parecem ser plausíveis: há pouco tempo abriu a primeira filial Hennes & Mauritz em Milão e entrou em concorrência directa com as lojas de luxo da proximidade. A imprensa local reagiu logo definindo a H&M como o McDonald’s da moda. Mas, apesar de páginas e páginas de críticas e difamações da empresa sueca, não conseguiram negar o facto de que os clientes italianos, em tempos de crise, procuram as ofertas das cadeias de moda como a H&M ou a Zara, mesmo no coração da moda – Milão.
Afinal, não foram as grandes empresas do ramo, como a Armani, Prada e Gucci, que indicaram o caminho quando começaram a produzir modelos menos exclusivos? «Hoje em dia, os clientes já não sabem porque devem participar nesta política das marcas exclusivas», declara um especialista da área. «Um grande nome já não anima ninguém a comprar».
Este facto já chegou há algum tempo aos gabinetes de marketing. Até agora, investiu-se sobretudo nas campanhas de publicidade e de imagem das marcas, mas isso está a mudar cada vez mais. «No hemisfério ocidental, a necessidade dos clientes em comprar marcas com nomes bem conhecidos desapareceu e é o próprio produto que está cada vez mais no centro das atenções», sustenta Diego Della Valle, director da empresa de calçado de luxo Tods.
Tods, Gucci e outras grandes empresas do luxo encaram o Extremo Oriente como a sua tábua de salvação, porque aí os seus nomes ainda valem muito. «Nos países como um crescimento económico rápido, as marcas são sinónimo de riqueza e influência. Por esta razão, o mercado chinês é extremamente importante», argumenta Della Valle. Nos próximos anos, os especialistas da área prevêem umboom dos produtos de luxo na China. Em seis anos, o volume de vendas das grandes cadeias de moda neste país vai ultrapassar o volume de vendas no Japão e atingir um total de 30 mil milhões de dólares. Actualmente, a Bulgari já obtém 44 por cento de seu volume de vendas na Ásia e a Hermès atingiu uma quota de 43 por cento.
No entanto, nem todos os produtores italianos vão conseguir entrar no mercado asiático. «O futuro das empresas italianas de moda não é muito prometedor», alerta Gregorio De Felice, analista da Banca Intesa, em Milão. Nos próximos anos, a indústria vai ter de se contentar com um crescimento inferior ao registado no passado. Uma taxa acima de 9 por cento, como em 1999, não é provável nos próximos anos. A indústria de moda encontra-se face a um processo de reestruturação muito doloroso que vai obrigar sobretudo as empresas familiares mais pequenas a uma grande capacidade de adaptação.
A necessidade de poupar está omnipresente – na aquisição, na produção e na publicidade. «As empresas têm de crescer mais e precisam controlar directamente a sua rede de distribuição para resistir à concorrência internacional», afirma De Felice. Mesmo assim, não há garantias de sucesso. «O crescimento na exportação depende do desenvolvimento económico mundial e, para a indústria italiana de luxo, isso significa uma erosão das suas quotas no mercado internacional».
Por esta razão, por exemplo, a gerência da Prada não quer falar sobre os seus planos para o futuro. Patrizio Bertelli, director do conselho executivo, já anunciou três vezes a entrada da Prada na bolsa e depois adiou-a. Há poucas semanas, confirmou novamente que tinha como objectivo o lançamento da Prada na bolsa, mas já não pareceu tão convencido como anteriormente. Este comportamento é sintomático em todas as empresas de moda italianas. Empresas como a Diesel afastam qualquer hipótese de entrada no mercado financeiro internacional. «Não tenho interesse nenhum nisso», declara Renzo Rosso, fundador e director da Diesel. «Apesar dos sinais positivos, o futuro mantém-se completamente imprevisível».