Indústria perde jovens

No painel do iTechStyle Summit ’22 dedicado às competências para a indústria, os especialistas abordaram o envelhecimento dos trabalhadores dos sectores têxtil e do vestuário, os novos perfis de emprego e as estratégias que podem ajudar a reter talentos.

Augusto Lima

Como frisou Augusto Lima, vereador da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, que ocupou o papel de moderador neste painel da iTechStyle Summit, um dos grandes desafios da indústria têxtil e vestuário é «atrair e reter pessoas e talentos». Efetivamente, ressalvou, «sem as pessoas não podemos atingir resultados e, por isso, é fundamental conhecermos aqueles que são os principais obstáculos que podemos ter nos dias de hoje para continuarmos a apostar nas pessoas e termos cada vez mais e melhores trabalhadores no sector».

Os números apresentados por Alessandro de Rosa, gestor de educação superior e formação no Polo Universitario Città di Prato, mostraram um cenário de envelhecimento da mão de obra, com «uma grande diferença entre o número de pessoas que se vão reformar e as novas que estão a chegar ao sector», apontou. Os dados entre 2010 e 2019 indicam que número de pessoas entre os 50 e os 64 anos aumentou quase 20% no sector têxtil e 30,5% no sector do vestuário, comprovando que «a força de trabalho envelhecida está a aumentar», referiu Alessandro de Rosa.

Alessandro de Rosa

Estudos realizados nos últimos anos, o mais recente dos quais em 2021, revelam ainda que os trabalhadores da indústria têm falta de qualificação ao nível da digitalização e da transição para a sustentabilidade.

«Penso que o que temos de fazer é criar um novo sistema, um novo enquadramento para desenvolver novos projetos e ações», continuando a fazer a monitorização da situação, com a interpretação das estatísticas, para planear boas iniciativas ao nível da UE, indicou Alessandro de Rosa. «Temos de rever os currículos e criar novos perfis de emprego», como profissionais de marketing digital, mencionou.

Reter talentos

Salientando a necessidade de uma aprendizagem contínua ao longo da vida, Isabel Paiva de Sousa, diretora de programas e docente na Porto Business School e na faculdade de Economia da Universidade do Porto, centrou-se na atração e retenção de talentos, para o qual é fundamental uma ligação entre o bem-estar do trabalhador e os resultados. «Se queremos reter as pessoas, claramente temos que dar um sentido de propósito e um sentido muito forte de unidade», sublinhou.

A felicidade no local de trabalho está relacionada, segundo Isabel Paiva de Sousa, que há quase duas décadas se tem dedicado ao estudo desta questão, com três conceitos: positividade, colaboração e propósito.

Na primeira questão, «um indivíduo que experiencia melhores níveis de bem-estar, é um indivíduo que está mais vezes alegre, entusiasmado e tem um pensamento divergente. Não é um pateta alegre. Não é um indivíduo que nega que não há matérias-primas, não é um indivíduo que nega que há crise e também não é um indivíduo que nega que estamos com um problema em termos da cadeia alimentar. Esse é o desprevenido. Um indivíduo que tenha positividade vivencia mais emoções positivas do que negativas, mas também vive as emoções negativas», destacou.

Isabel Paiva de Sousa

O segundo «capítulo», como lhe chamou Isabel Paiva de Sousa, está relacionado com o facto de que «ninguém faz nada sozinho. Temos de criar ecossistemas de inovação, redes de cooperação», seja com centros tecnológicos ou universidades. «É sermos nós agentes de mudança. Nós temos de ser o exemplo da colaboração. Não há melhor teoria do que liderar pelo exemplo», explicou.

Quanto ao último tema, «o propósito é o que torna a empresa única, para além de ganhar dinheiro», esclareceu a diretora de programas e docente na Porto Business School. «Felizmente, nesta indústria, temos empresas que têm este legado que é “eu recebo da geração anterior e entrego à geração seguinte melhor do que aquilo que eu recebi”. E este é que é o propósito, sentir que estou a criar para algo que é maior do que nós próprios. É isto que, muitas vezes, as pessoas dizem que as gerações mais novas buscam», exemplificou.

Positividade no trabalho

No conjunto, «se desenvolvermos indivíduos, equipas e organizações com mais positividade, mais colaborativos e com sentido de propósito, teremos melhores níveis de bem-estar», algo que é difícil porque «em Portugal temos uma matriz de desconfiança e, por isso, quando dizemos sê colaborativo, vamos criar parcerias, ecossistemas, cocriação, desenvolve a tua empresa, criamos juntos, temos esta lógica do mais vale só. Até que provem em contrário, a gente desconfia sempre».

Isso faz, muitas vezes, com que as pessoas não levem novas propostas para a administração das empresas, crentes de que vão ser recusadas, e que percam o entusiasmo inicial. «Aprendemos a estar desanimados» e isso «leva a que as pessoas saiam das empresas», salientou.

Para Isabel Paiva de Sousa, «o micro management, a gestão pequena que vai e que quer saber, ao detalhe, tudo o que se passa, é uma gestão que não permite às equipas florescerem, crescerem e serem mais autónomas, serem mais autênticas e provocarem aquilo que a gente quer dos negócios, que é ter equipas que se destacam e que se diferenciam».