O Grupo Têxtil António Falcão, fundado em 1957, estreou-se na Première Vision Yarns (ver Première Vision une fileira lusa) em fevereiro último, onde mostrou as suas mais recentes valências, com artigos de valor acrescentado – como fios com lurex e fios estampados, de poliéster ou poliamida – em grande destaque.
Com 20% de exportação direta de fios técnicos, o Grupo Têxtil António Falcão está empenhado em aumentar as exportações, ao mesmo tempo que prossegue os investimentos em novas tecnologias e fontes de energia limpas.
Que balanço faz da estreia na Première Vision Yarns?
Como foi a primeira vez, fomos apalpar terreno e estamos satisfeitos. Fomos com um stand pequeno e decidimos levar apenas algumas novidades. Não levámos os fios básicos, levámos os fios que nos pareceram mais indicados para esta feira.
Não fomos com a expectativa de ter grandes encomendas ou até encomendas, porque era uma primeira presença, mas estamos muito satisfeitos, contamos voltar e, então aí, ter um stand maior e uma gama de produtos mais alargada.
Estamos muito otimistas em relação a resultados. Vários contactos estrangeiros que fizemos já estão a pedir amostras, muito entusiasmados, porque realmente apresentámos produtos muito interessantes.
Que produtos interessantes foram esses?
Há alguns anos, mudámos muito a nossa estratégia. Hoje praticamente só trabalhamos fios técnicos, de valor acrescentado.
Levámos fios com lurex, que foram uma novidade na feira, fios estampados, que já temos há algum tempo, mas continuamos a ser líderes.
Mas temos outros fios: os antibacterianos, os ignífugos, os biológicos, os reciclados – na área dos poliésteres somos líderes com este tipo de fio, que são fios com certificado. Não apresentámos na Première Vision Yarns porque são fios que já temos há algum tempo, não é novidade para nós.
Posso dizer que, por exemplo, no caso dos biodegradáveis, temos este tipo de fios com o poliéster e a poliamida até num outro sector que é muito importante para nós, as meias de senhora. Já estamos a apresentar as meias de senhora com fio biodegradável e a lançá-lo com alguns clientes de exportação. Isto é novidade: desenvolvemos o fio em parceria com uma empresa estrangeira e estamos já a apresentar o produto final.
O que ditou a mudança em termos de produto?
A empresa estava a definhar por insistir em tipos de produtos altamente concorrenciais, que não eram inovadores, não traziam valor acrescentado nenhum – não estou a falar de valor acrescentado económico mas valor acrescentado ao mercado. Portanto, era cada vez mais difícil estar no mercado e competir. Tivemos necessidade de fazer uma mudança, quer com tecnologia que nos pudesse diferenciar, quer também motivar as pessoas para, com estes equipamentos, elaborar coisas novas e fazer um trabalho junto dos nossos próprios clientes no sentido de serem nossos parceiros, desafiando-nos a fazer coisas diferentes – estarmos mais próximos dos clientes de forma a podermos ser mais inovadores e estarmos à frente dos nossos concorrentes.
Ainda há dias falava com um cliente numa das feiras e ele estava muito motivado e dizia-me “estamos com este artigo e vamos fazer um negócio bestial. O problema é que daqui a seis meses os nossos concorrentes já vão estar a fazer o mesmo que nós”. E é verdade. Ou seja, vamos à frente e daqui a seis meses já vêm outros fazer o que fazemos. O que é difícil, e isso às vezes é desanimador, é que o investimento que fizemos em inovar é muito grande e os seis meses que estamos à frente não são suficientes para nos compensar esse esforço, o investimento em amostras, o que se estragou, os desperdícios, as pequenas produções,… Depois quando vem realmente o período em que podemos ganhar um bocado mais de dinheiro, já aparecem outros que não investiram como nós, não fizeram o que fizemos e facilmente reproduzem. Ficamos tristes, mas é o caminho que estamos a seguir, correndo esses riscos.
Temos clientes que vêm aqui e querem amostras e mais amostras, nós desenvolvemos as amostras e depois quando vêm as encomendas grandes eles vão a um “vizinho”, pode ser no estrangeiro ou aqui, e fazem mais barato – vão fazer o artigo porque copiaram-no, é fácil. Também temos clientes que, felizmente, reconhecem o nosso trabalho, até porque sabem que amanhã vamos desenvolver outro produto e estamos ao lado deles.
Oferecer produtos mais diferenciados mudou o perfil do cliente?
Também mudou. Temos alguns clientes com quem trabalhávamos produtos mais básicos que, quando começámos a apresentar artigos novos, estão abertos e estão também a fazer os seus desenvolvimentos, a apostar nessa mudança. A mudança é um bocado horizontal, felizmente o mercado português está a mudar muito, não somos só nós, outros também mudaram. Portanto, há clientes que também estão a mudar e estão a sentir que também os incentivamos a mudar. E temos outros que eram clientes que já só trabalhavam com produtos inovadores e, naturalmente, quando viram esta nossa mudança começaram a acreditar em nós e estão a dar-nos essa oportunidade de começarmos a trabalhar. Aqui também há uma questão, no sentido de política industrial, que está a mudar, felizmente, mas ainda há empresas que têm alguma dificuldade e, em determinado tipo de produtos de valor acrescentado, caros, têm algum receio de desenvolvê-los com indústrias nacionais. Estamos a ganhar credibilidade, estou a falar no sector dos fios, mas ainda há muitas empresas que não têm a mesma recetividade que têm em relação a empresas estrangeiras, muito embora façamos o mesmo e até façamos melhor – e podemos fazer muito melhor porque temos um serviço que os outros não têm. Agora, isso também demora – há algumas empresas que têm ainda enraizado que as empresas de fora são mais capazes. Temos de contrariar essa resistência e estamos a fazê-lo.
Nos últimos anos começaram a apostar em feiras, mas mais técnicas, como a Techtextil e a Ispo Munich. De que forma a Première Vision Yarns, uma feira mais voltada para a moda, se enquadra nessa estratégia de internacionalização?
A nossa presença nas feiras poderá ter mais do que um objetivo. Por um lado, é darmos apoio e uma colaboração mais próxima a clientes com quem trabalhámos já no passado em termos de exportação direta, quer clientes com quem já trabalhamos no passado com exportações indiretas – e aí temos muitos clientes portugueses, boas empresas, com quem trabalhamos e, como tal, sentimos que é uma obrigação estarmos próximo deles para podermos acompanhá-los nos desenvolvimentos. Uma vez que temos uma política de parceria com os clientes, temos que estar onde eles estão.
Por outro lado, a nossa presença nas feiras é para apresentarmos tudo aquilo que vamos desenvolvendo, porque hoje a nossa política em termos industriais realmente mudou, fazemos produtos muito inovadores. Hoje temos pessoas dentro da empresa que estão todos os dias à procura de fazer novos desenvolvimentos e, portanto, a inovar, para levarmos aos nossos clientes, primeiro àqueles que estão mais próximos e que estão cá e depois também àqueles que estão lá fora. Nestes últimos meses, com a nossa presença na Techtextil, na Ispo Munich e na Première Vision, apresentámos produtos completamente diferentes. A Techtextil e a própria Ispo são mais vocacionadas para os produtos técnicos, para o desporto, e depois temos a moda, mas nós temos produtos para cada segmento.
Pela dimensão da própria empresa e também pelo custo das próprias feiras, não temos ainda condições de estar nestas feiras com stands muito grandes, em que, independentemente do produto específico para essa feira, possamos ter outros produtos. Gostava muito de estar com um stand três ou quatro vezes maior do que aquele onde estivemos e aí podíamos dar uma imagem diferente até da empresa.
Nas feiras têm assumido a identidade Grupo Têxtil António Falcão em vez de, neste caso dos fios, Fitexar. Porquê?
Estamos a fazer uma reorganização grande, em que a Fitexar existe, e vai existir se Deus quiser durante muitos anos, mas apenas como unidade produtiva, sendo que a António Falcão além das unidades produtivas que tem e da parte comercial e de desenvolvimentos que faz do sector, vai também fazer a parte comercial da Fitexar. É por uma questão apenas de reorganização e de racionalização interna, nada mais do que isso.
Que investimentos efetuaram recentemente?
Nos últimos dois anos temos feito muito investimento em substituição de equipamento muito vocacionado para inovação. Investimos dois milhões de euros e, paralelamente, os sócios – eu e os meus filhos – fizemos uma injeção de capital de dois milhões de euros, um capital suplementar para apoio à empresa para investimento, tesouraria. O objetivo é dar mais solidez à empresa e permitir que ela tenha melhores condições.
Que capacidade de produção têm na área dos fios? E no segmento dos collants?
Em produção, devemos fazer hoje talvez, em média, cinco ou seis toneladas por dia de fio e de meias de senhora, porque mudámos para artigos de valor acrescentado, hoje somos capazes de fazer 50 a 60 mil pares por dia.
Que papel tem a diferenciação na oferta de collants e meias?
Fazemos as clássicas, de moda, mas estamos também a fazer muitas meias inovadoras: meias biodegradáveis, meias com fios reciclados, meias massagem, meias anticelulite, antimosquito… Fazemos para o mercado europeu, quer Europa Central e Escandinávia, quer para o mercado nacional. Também somos líderes nas meias de senhora, temos as nossas marcas – a Maggiolly e a Náná, muito viradas para o mercado nacional –, mas também trabalhamos as marcas dos clientes. Na exportação fazemos tudo com a marca do cliente e no mercado nacional trabalhamos para as grandes superfícies com a marca deles.
Qual é o peso das marcas próprias?
No sector das meias e collants, que representa 40% na empresa, as nossas marcas próprias representam 10%. Somos uma empresa vertical, produzimos a matéria-prima, fazemos as meias, temos tinturaria e até fazemos, para alguns clientes, a gestão do stock.
Que quota de exportação tem cada área de negócio?
Nos fios, exportamos sobretudo indiretamente. Mas em fios técnicos – essencialmente para o desporto, para a saúde e também para o automóvel e vestuário de trabalho – já estamos a exportar diretamente 20% da produção, sobretudo para Espanha, Alemanha e Itália. Nas meias de senhora, 60% a 70% da produção é para exportação direta.
Que balanço faz de 2017?
Estes dois últimos anos foram de grandes mudanças na nossa empresa, quer na própria sociedade, quer na estratégia. Investimos muito e naturalmente o resultado financeiro sofreu, fruto de investimentos e mudanças. A expectativa é começarmos a ter os resultados em 2018, 2019, 2020.
Quais são as perspetivas para o corrente ano?
Temos duas: uma é começar a sentir que estes produtos novos entram num ritmo regular; a outra é um crescimento também no negócio.
Tem-se destacado não só como empresário, mas também como dirigente associativo. Que análise faz do sector na atualidade?
Realmente, até me custa dizer, já sou velho no sector, tenho uma experiência muito grande, são muitos anos, não só de industrial e empresário, mas também como dirigente associativo. Já passei variadíssimas fases na indústria, altos e baixos, bons e maus momentos. Acontece que, felizmente, o sector tem vindo a ter um período bom, os números traduzem isso, mas talvez por ser muito experiente, sou um pouco cético e preocupo-me com esta realidade e até em relação a alguma euforia que se vive. Porque as empresas têm trabalho, é o primeiro passo, é muito importante, mas não sei até que ponto estão a conseguir capitalizar-se para poder suportar um eventual momento de crise. Há trabalho, mas os clientes estrangeiros vêm cá comprar porque já confiam no mercado português, porque já compram nas indústrias portuguesas, mas não compram caro, compram barato. E tem-se feito muito investimento. E este tipo de investimento que se tem feito, para ter um retorno, para que as empresas se recapitalizem fruto do investimento que fizeram, são necessários muitos anos. E não se passaram assim tantos anos ainda de período áureo da indústria e, portanto, tenho alguma preocupação que este entusiasmo que está a acontecer com alguns empresários e com o sector, investimentos que se estão a fazer agora, e grandes investimentos, possam sofrer se houver uma crise. Por exemplo, infelizmente começa a anunciar-se que pode haver alguns sectores do têxtil que já estejam até a sofrer com encomendas. Se isso se confirmar, pode não ser bom para alguns sectores aqui da nossa região. Espero sinceramente que estes primeiros meses do ano que se estão a viver em alguns sectores, e em particular mais especificamente numa região como é Barcelos, onde predomina um sector importante do têxtil, que seja momentâneo.
Para que sectores olha com mais preocupação?
Por exemplo das malhas. O sector têxtil é muito interessante pela diversidade que tem, abrange áreas muito diferentes. Também é normal que, num período, uma área viva melhor do que outra, e ainda bem que assim é. Mas há alguns sectores que têm um peso maior e, pelo peso que têm, podem afetar de uma forma mais direta os outros. As malhas não é só tricotagem – as malhas vão afetar o produtor de fios, a confeção, a tinturaria… Portanto, um subsector importante como este, se volta a sofrer uma quebra, as empresas, com os investimentos que fizeram, ficam naturalmente afetadas. Agora espero que as empresas estejam suficientemente capitalizadas, que a quebra não seja tão acentuada e que seja um período transitório.
Como sente este início de ano comparativamente ao mesmo período de 2017?
Sinto que num determinado sector há uma quebra. Isso não significa, por exemplo, que o meu sector particular dos fios esteja a atravessar uma quebra. Agora, nos fios que produzimos destinados a um determinado sector, confirma-se que é verdade, que há uma quebra. Agora, como também fazemos fios para outros sectores, naturalmente estamos a tentar compensar e até a conseguir. Até estamos a vender mais fio do que vendemos no ano passado, em valor e em quantidade, porque entretanto, resultado de fazermos fios diferentes, mais inovadores, muito técnicos, estamos a conseguir entrar em áreas que não tínhamos no passado. Mas preocupa-me o que se passa à minha volta. Eu preocupo-me com os meus vizinhos.
Nos seus sectores de atividade, que desafios se colocam no curto/médio prazo?
Aquilo que mais me preocupa, no caso das minhas empresas, é a falta de apoios em termos ao investimento, apoios financeiros ou apoios em termos de tesouraria a uma empresa que investe. A banca não está a apoiar suficientemente bem as empresas que estão a investir. Não tenho sentido os apoios que acho que a empresa merecia ou que deveria ter em relação aos produtos que tem. Os próprios apoios do Estado, a nós particularmente não nos chegam. A banca continua a ser cara quando faz apoios em relação àquilo que acontece noutros mercados nossos concorrentes, por um lado. Por outro lado, no nosso caso particular, os custos de energia são extremamente elevados e também nos afetam a competitividade. Resumindo, o apoio ao investimento não tem sido suficiente, os custos do dinheiro são caros, a energia é caríssima e temos também a parte da formação, que é importante.
É por isso que investiram em painéis fotovoltaicos?
Fiz um investimento em fotovoltaico e vou fazer mais porque é uma forma de poder reduzir aos custos de energia, que para nós são muito importantes, mas não há apoios para este tipo de investimento. A energia, e neste caso energia limpa, é uma área que merece ser apoiada, seja para produzir para consumo próprio nas empresas, seja para produzir para venda à rede, porque é uma energia limpa e merecia apoios e não os há.
Qual foi a ordem de grandeza desse investimento?
Em energia, investi cerca de 300 mil euros e vou investir agora mais 200 mil euros. A primeira fase ficou terminada em meados de janeiro. Neste momento posso dizer que já estou a reduzir a fatura em quase 4.000 euros por mês. A segunda fase é um investimento que vamos fazer agora. No final, sou capaz de conseguir produzir pelo menos 10% da energia que consumo.