Nos anos 90, quando muitos afirmavam já que a têxtil estava condenada, João Carvalho e dois sócios acreditaram que o futuro passaria pela indústria e, apesar dos exemplos à volta, com várias empresas a fechar portas, decidiram criar a produtora de lanifícios com valências na fiação, tecelagem, tinturaria e acabamentos. «Eu e os meus atuais dois sócios trabalhávamos na mesma empresa. Quando a empresa entrou em rutura – tinha algumas dificuldades financeiras – acabámos por adquirir os imóveis, os equipamentos e iniciar a atividade da Fitecom em 1993», conta João Carvalho ao Jornal Têxtil. «A nossa ideia quando iniciamos a Fitecom não era termos uma empresa vertical, nem era sermos empresários puros e duros, mas sim sermos sobretudo comerciais, ou seja, comprar matéria-prima, transformá-la a feitio e vender o produto acabado. Rapidamente nos apercebemos, embora na altura houvesse umas quantas empresas a trabalhar, que isso não era possível, pois não havia oferta de serviços suficiente para podermos fazer isso», acrescenta.
Com um efetivo a rondar as 200 pessoas, hoje a Fitecom «está amadurecida, sabe exatamente a direção em que deve caminhar», afirma o CEO. Conceitos como o “Five to Seven” – que na construção das propostas utiliza cinco a sete fios, cinco a sete cores por cada fio, cinco a sete padrões por cada desenho, cinco a sete cores por cada cartaz, a um preço de cinco a sete euros, para entregar produção de cinco a sete semanas e entregar cartazes de cinco a sete dias – ilustram a capacidade de criar novas propostas e de garantir um lugar na moda a cada estação.
«Acho que tudo aquilo que é novo, tudo aquilo que é criação, move toda a gente. A dinâmica das coisas passa por apresentar constantemente algo que seja novo e diferente. Se não houver novidades nem diferenciação, também não há forma de cativar o cliente», assegura João Carvalho, que sublinha que «acabamos por marcar a moda, pelo menos a nível da Europa».
De resto, praticamente toda a produção (98%) que sai dos teares da Fitecom tem como destino os mercados externos, com um portefólio de 600 clientes ativos em mais de 20 países, dominado por mercados como Espanha, França, Inglaterra, Alemanha e Escandinávia, embora haja igualmente clientes nos EUA e no Japão.
Com uma linha estratégica que segue a teoria de Darwin de que «o sucesso não está no ser mais inteligente, nem no mais trabalhador, nem no mais perspicaz mas sim naquele que mais facilmente é capaz de se adaptar à mudança», a Fitecom procurou, ao longo dos anos, acompanhar o mercado. «Pautamos por estar na crista da onda no que toca a inovação, quer em termos da tecnologia que utilizamos, quer em termos do produto que desenvolvemos», afirma o CEO. Para isso, todos os anos a empresa investe em tecnologias novas, para manter o parque de máquinas atualizado. «Substituímos as máquinas quando estão a meio da vida útil delas», explica João Carvalho.
Investimentos a caminho
Para 2019, está já planeado um investimento à volta do meio milhão de euros para renovar a secção de acabamentos, nomeadamente substituir a prensa por um equipamento mais sofisticado, e, eventualmente alguns teares. «É possível que invistamos também em energia solar, estamos a fazer estudos nesse sentido. Estamos a preparar uma área de cerca de 5.000 metros quadrados de painéis fotovoltaicos», adianta o administrador. A ideia subjacente é fornecer 30% a 35% do consumo energético da empresa. «Trata-se de um investimento que se amortiza em quatro a cinco anos. Se falarmos de um investimento que pode ter uma durabilidade de 15 anos, digamos que para além da recuperação do investimento, e se tudo correr normalmente, haverá uma mais-valia de cerca de 200%», admite o empresário.
O desafio da mão de obra
O facto de haver cada vez menos pessoas disponíveis para trabalhar na indústria têxtil e vestuário impulsiona igualmente os investimentos. «Temos secções praticamente todas computorizadas, como é o caso da tinturaria, onde se vê máquinas, não se vê pessoas. Cada vez mais a indústria tem de caminhar no sentido da robotização. Isso vem colmatar a falta de pessoal e eficiência, e o aumento dos custos que já se começam a falar… Está um pouco na ordem do dia o debate sobre o aumento de salários. E, de facto, a forma é cada vez produzir mais com o mínimo de pessoas possível», reconhece.
Com efeito, realça João Carvalho, a falta de mão de obra pode mesmo comprometer o crescimento da empresa. «A maior preocupação que tenho é recrutar mão de obra qualificada», revela.
Nos últimos anos, a Fitecom tem recrutado engenheiros químicos em detrimento de engenheiros têxteis, que não encontra no mercado. «Temos dado bastante formação a esses quadros que vão entrando e que vêm de outras áreas, mas temos a noção de que não é a mesma coisa que ter um engenheiro têxtil de raiz», confessa o empresário.
A formação interna, em parceria com o Modatex, tem igualmente ajudado a colmatar as necessidades. «Neste momento temos um curso a decorrer de metedeiras de fio, para ficarem todas a trabalhar na Fitecom», adianta João Carvalho. Contudo, «a apetência da juventude em trabalhar no mundo laneiro não é grande, e não é grande porque essa juventude também não é grande. Penso que é um problema não só existente na região da Covilhã mas por todo o Interior e tem a ver com a desertificação. A oferta de mão de obra é francamente reduzida. E este é um problema de hoje e do futuro próximo», afiança.
Os preços mais altos da lã têm igualmente agitado as águas, sobretudo nos últimos dois anos. «Os anos de 2016 e 2017 tiveram uma turbulência devido ao aumento dos preços das lãs e o mercado, nalguns casos, substituiu as lãs por outras fibras e, consequentemente, houve alguma quebra nas vendas», esclarece o CEO. Mas as expectativas para 2018 são positivas. «Em 2017, acabamos com um volume de negócios de 12 milhões de euros. Este ano está substancialmente melhor, com mais 25% relativamente ao ano passado», elucida.
Futuro assegurado
Embora concentrado na Europa e com o investimento «mais virado para o mercado americano do que para a Ásia», João Carvalho acredita que o futuro poderá passar pelo continente asiático. «Foi uma ameaça mas hoje em dia está a tornar-se uma oportunidade, porque efetivamente a classe média tem crescido a grande velocidade. Ou seja, é uma oportunidade não só por se recuperar algum mercado que foi ocupado pelos asiáticos, como também por os próprios asiáticos serem consumidores de volumes consideráveis daquilo que é europeu. Aliás, já começamos a assistir a isso», sustenta. «Mesmo que haja um país ou outro mais empobrecido, esses mercados já não são tão fechados como antes e as sinergias de uns empurram os outros», considera.
Quanto à Fitecom, a segunda geração está já envolvida no negócio, o que abre os horizontes para o futuro. «Espero que eles tenham a vontade necessária para continuarem a desenvolver um trabalho capaz de superar todas as irreverências do meio», declara. «Sinceramente não sei como vai estar a empresa nessa altura. Como hoje não estará certamente porque acho que as coisas não podem estar estáticas», conclui o CEO.