O presidente da APT, apoiante do Movimento Têxtil e do Vestuário desde a primeira hora, lembra que já existiu uma Federação Intertêxtil em 87 que nunca teve grande actividade e também por isso esta solução não lhe parece a mais indicada
Jornal Têxtil – Que opinião tem relativamente à criação da Federação e porque é que a APT não participa? José Alexandre Oliveira – Para se perceber a nossa posição é preciso relembrar o que se passou desde 1998 quando se iniciaram reuniões entre todas as Associações do sector e o Prof. Augusto Mateus. Tinha-se chegado à conclusão que o Prof. Augusto Mateus poderia desempenhar um papel relevante na construção de um projecto de união das várias Associações. Recorde-se que ele tinha acabado de sair do Governo, o que era uma mais valia dada a experiência que tinha vivido. No essencial e após diversas reuniões entre o Professor e as Associações chegou-se a um acordo sobre um projecto gradual de construção da voz única. E ficou combinado que cada associação promoveria uma assembleia geral junto dos seus associados, mais ou menos seguidas, para que se aprovasse o modelo que estava mais ou menos definido pelos presidentes dessas associações. A primeira Associação a realizar a sua assembleia geral foi a APT, que teve uma frequência excepcional, tendo sido a proposta aprovada por unanimidade. Depois ficou-se a aguardar as assembleias gerais das outras associações. Pelo que sei, na assembleia geral APIM, ao que ouvi dizer com muitos poucos associados, o projecto da voz única não foi aprovado. Em seguida a assembleia geral da ANIVEC, condicionou a participação desta associação à participação de todas as outras associações. Logo estava tudo bloqueado por causa da APIM. A partir daí houve uma reunião com o prof. Augusto Mateus para dar conhecimento destes resultados, em que tiveram presentes quase todos os presidentes das várias associações. Nessa reunião concluiu-se que o projecto era credível e necessário para o sector, e desde o momento em que ele não foi aprovado pelas associações, poderia tomar outro rumo que seria perguntar às empresas directamente se concordavam com esta ideia e se queriam desenvolvê-lo. Isto passou-se porque as pessoas acreditavam que o que se tinha passado nas assembleias gerais de algumas Associações não era representativo da vontade da maioria das empresas do sector. Resolveu-se então convocar um grupo significativo de empresas, pequenas, médias e grandes, e num encontro em Famalicão, com a presença do Prof. Augusto Mateus, fez-se uma apresentação e as empresas imediatamente disseram que queriam avançar para o projecto da voz única.
JT – Foi nessa reunião que nasceu o Movimento Têxtil e do Vestuário (MTV)? JAO – Foi exactamente aí que nasceu o MTV e foi também nesta reunião que foi nomeada uma comissão instaladora do projecto MTV, suportada por um grupo de empresas (pequenas, médias e grandes) que representam todos os sectores da têxtil e do vestuário e até eram associados das várias associações. Esta comissão instaladora trabalhou durante oito meses e elaborou um projecto de acção e estatutos, que foi apresentado a todo o sector, empresas e associações . Refira-se que a APT não fez parte desta comissão. As empresas do MTV fizeram depois mais uma tentativa de voltar a convidar as associações a participar neste projecto de união. Quando menos se esperava, dado que se estava a negociar como deveriam participar as Associações no MTV, algumas associações resolvem avançar para a criação de uma federação.
JT – Mas a APT foi convidada para participar ? JAO – Convidaram a APT para estar presente numa reunião inicial para esse objectivo. É óbvio que ficamos surpresos com o convite e com a ideia. Mas não discutimos se o modelo Federação é o melhor ou não. Pessoalmente acho que não, mas não poderíamos partir para um novo projecto quando estávamos em conversações para a possível participação no projecto MTV. Respondemos à carta de convite, exactamente com este argumento. Soubemos que entretanto foi constituída a federação. Mas quero lembrar que já existiu uma Federação constituída em 1987, e isto é bom que se saiba, e que se chamava Federação Intertêxtil Portuguesa, mas que nunca chegou a ter grande actividade. Esta é uma das razões pelas quais penso que a Federação eventualmente não seja o melhor caminho.
JT – Porque é que essa Federação falhou ? JAO – Não digo que o projecto falhou ou não, mas se ela não está activa foi porque algo se passou, que desconheço. Contudo, não gostaria fazer daí grande assunto. Futuramente se irá ver se a federação é o projecto ideal ou se será um movimento forte que englobe as empresas de toda a fileira têxtil.
JT – Que explicações encontra para esta sucessão de «desencontros»? JAO – Convém explicar que a APT tem sido acusada de ser a associação das grandes empresas. Este termo até é prestigiante para a associação, mas isso nem é verdade porque a APT é composta, em mais de 50%, por pequenas e médias empresas. Na direcção da APT participam vários empresários de pequenas empresas do sector. E gostaria de acrescentar que temos que ter uma visão não apenas local, mas pelo menos europeia para não dizer mundial, porque as chamadas grandes empresas em Portugal, que são nossas associadas, ao nível europeu, são pequenas e médias empresas. E é aí que reside o grande problema, é que só com a constituição de uma grande associação que possa ter uma voz única ao nível nacional, é que podemos tirar grandes proveitos para todo o sector têxtil. E há outro ponto onde eu penso que a APT tem uma grande vantagem que nos leva a pensar que é possível a criação da associação única: é bom que todos saibam que a única associação têxtil que tem todos os sectores da fileira têxtil representados entre os seus associados é a APT. Por isso, se nós ao nível da APT conseguimos ter as fiações, as tecelagens, as unidades verticais, as tinturarias, os acabamentos, os texturizados, as alcatifas, os têxteis-lar, as malhas e o vestuário, com excelentes resultados, discutindo assuntos e políticas globais e quando necessário específicas para cada uma daquelas áreas, é a prova que este modelo funciona e poderá ser aplicado a todas as empresas do sector. Este é um dos grandes argumentos que me leva a dizer que é possível uma associação única.
JT – Pode então concluir-se que a APT não prevê para já aderir a esta Federação? JAO – Pessoalmente, acho que será difícil participar na Federação. Só aceitei assumir a presidência da APT com o objectivo da união e continuo a dizer que se não o conseguir, não me interessa continuar, porque penso que as ameaças que o sector enfrenta e vai sentir ainda mais, exige que estejamos todos unidos, na prática e não no papel, e que se trabalhe no sentido de tentar antecipar os acontecimentos e não reagir só depois das coisas acontecerem, como tem acontecido até agora. E deixe-me acrescentar que provavelmente a federação nasce como resposta para impedir o nascimento do MTV, já que a maioria dos presidentes das associações aceitaram inicialmente o projecto, por ocasião da reunião em Famalicão com o Prof. Augusto Mateus. Essa é que é a grande verdade. E é por isto que acho estranho esta Federação. Talvez, tudo isto da federação seja um projecto mais de protagonismo de alguém nas associações do que do interesse da maioria das empresas dessas associações.
JT – Mas não acha que a federação pode ser, de facto, um primeiro passo? JAO – Vamos ver. Mas eu gostava de saber o que é que as associações vão passar em concreto para a Federação. É toda a política internacional? É toda a política ambiental? É toda a política laboral? É toda a política industrial? Eu gostava de saber se todas as associações estão capazes neste momento de delegar isso na Federação. Caso contrário questiono a utilidade da constituição da federação.