Durante muitos anos bastião da produção de fast fashion barata, uma nova geração de designers está a tentar transformar a etiqueta “made in Vietnam” e salvar a rica herança étnica do país no processo.
Nas colinas remotas de Cao Bang, a cerca de 300 km a norte da capital Hanoi, a designer vietnamita Thao Vu está a fiar algodão à mão, que coloca num grande balde com folhas de indigo fermentadas. A sua marca, a Kilomet 109, está na vanguarda do novo movimento de “moda ética” no Vietname – uma abordagem ao design que procura maximizar o benefício para as comunidades ao mesmo tempo que minimiza os danos ambientais.
A designer de 38 anos tem respondido a esta crescente tendência mundial trabalhando com cerca de 54 grupos étnicos minoritários no Vietname, cada um dos quais tem os seus próprios têxteis e designs de vestuário tradicionais. «Aprendo as técnicas com eles», revela Thao Vu à AFP, explicando como se inspirou nas mulheres Nung na aldeia de Phuc Sec, que usam corantes naturais e fazem a tecelagem em teares manuais. Depois acrescenta «um toque mais moderno e contemporâneo» ao estilo da peça de vestuário, que se torna mais atrativa para clientes em capitais da moda como Berlim e Nova Iorque.
Mas juntar estas duas vertentes nem sempre é fácil. A designer revela que as mulheres Nung ficaram chocadas quando ela sugeriu experimentarem cores fora do tradicional tom escuro de indigo. «Elas disseram-me: “se vivesses aqui não encontravas marido”», afirma, ao mesmo tempo que explica que encontrar um corante perfeito de indigo para o tecido é um pré-requisito para o casamento naquela comunidade.
Thao foi persistente e usa agora raízes e folhas tradicionais para colorir seda orgânica, algodão e cânhamo, que são também produzidos do zero, numa gama de tons que vai do indigo profundo ao cinzento claro e cores térreas de laranja e castanhos.
Regresso às origens
Nas últimas décadas, o Vietname tornou-se um centro de enormes confeções que produzem pilhas de roupas baratas o mais rapidamente possível para gigantes da moda como a Zara, a Mango e a H&M.
O sector, avaliado em muitos milhões de dólares, ajudou a impulsionar um enorme crescimento económico, mas também atraiu críticas devido à fraca regulamentação em termos ambientais e de direitos dos trabalhadores.
No entanto, os produtos feitos pelas fiações tradicionais do país são inerentemente amigos do ambiente – são feitos com corantes e têxteis naturais, não incluem químicos agressivos nem fibras sintéticas e não se vê fábricas com más condições de trabalho, reporta a AFP.
«Inicialmente, só queria manter as técnicas tradicionais vivas, mas depois percebi que temos de estar preocupados com o lado ambiental e ético (da moda) agora ou será demasiado tarde», afirma Thao Vu.
A designer já chamou as atenções, tendo ganho prémios internacionais de design e vende as suas criações a compradores de moda de gama alta.
As mulheres locais que trabalham com ela, como Luong Thi Kim, de 40 anos, afirmam ter beneficiado da sua colaboração. «Antes tecia para uso pessoal, mas agora os nossos produtos de tecelagem podem ir para outros países. Quero ganhar dinheiro para educar os meus filhos», revela à AFP.
Na zona central de Huo – a anterior capital imperial do Vietnme – outra marca está a ajudar os artesãos locais a vender as suas capacidades na indústria mundial da moda. A fundadora da Fashion4Freedom, LanVy Nguyen, ex-refugiada que saiu do Vietname após a guerra num barco de madeira e conseguiu ter uma carreira bem sucedida em Wall Street, regressou ao Vietname em 1998 e decidiu usar o seu conhecimento em capital de risco para salvar técnicas artesanais antigas. «Sabíamos que estas pessoas tinham gerações de conhecimento, só tínhamos de destrancá-lo para que o mercado o pudesse apreciar como nós», explica LanVy à AFP.
A Fashion4Freedom nasceu para ajudar, dando formação a carpinteiros tradicionais, que esculpem pilares ornamentais em pagodes ou casas locais, sobre como fazer sapatos plataforma que custam cerca de 600 dólares o par.
Do Quang Thanh, carpinteiro, revela que a ideia de fazer sapatos inicialmente lhe pareceu «estranha», mas que está contente por ter dado uma hipótese. «No passado fazia casas tradicionais em madeira agora faço sapatos num estilo moderno – adoro o trabalho», confessa.
Apetite internacional
Jimmy Lepore Hagen, vice-presidente de estratégia para a linha de vestuário americana de gama alta Nanette Lapore, afirma estar a ponderar a colaboração com a Fashion4Freedom, que vende igualmente joalharia de luxo e vestuário. «Pegar na ideia e estética de design de uma marca e fazer corresponder isso com pessoas que têm uma cultura e uma história incrível e estão a tentar construir algo novo e entusiasmante para o mercado americano é uma verdadeira oportunidade», acrescenta.
O diretor da associação de exportadores de artesanato, Le Ba Ngoc, vê a ligação dos artesãos vietnamitas com os designers de moda estrangeiros como uma oportunidade para abraçar designs mais sofisticados – o que ele afirma ser o elo fraco na cadeia de produção artesanal no país. «É um fator importante que está a travar as vendas internas e internacionais», aponta.
Assegurar uma qualidade consistente é igualmente um problema. Mas a sua organização está a tentar trabalhar com grupos étnicos para encontrar formas de modernizar as suas técnicas – como desenvolver um corante indigo em pó – ao mesmo tempo que se mantêm fiéis ao seu estilo.