Caso seja aprovada a nova legislação comercial, designada por NPDA (New Partnership for Development Act), os Estados Unidos da América vão permitir a entrada isenta de tarifas para produtos provenientes dos países mais pobres do mundo. Mas a bem intencionada legislação, que pretende corrigir algumas das piores injustiças no sistema de comércio mundial, parece não ser consensual. Os direitos de importação de vestuário dos EUA estão entre os mais elevados do mundo. Não são tão elevados como na Índia, mas são bastante mais elevados do que o considerado como necessário por parte dos outros países ricos. Os EUA tratam a maioria dos países mais pobres e vulneráveis do mundo tão duramente como trata os grandes concorrentes comerciais, como a China ou a Coreia do Sul. Por exemplo, a maior parte das blusas em tecido sintético que chegam aos EUA, independentemente de serem fabricadas no Bangladesh ou em Hong Kong, estão sujeitas a uma taxa de importação de 26,9 por cento. A União Europeia, por outro lado, aplica uma taxa mais moderada:12 por cento numa camisa feita na China. Em determinadas circunstâncias, não aplica qualquer taxa alfandegária como é o caso se a camisa for fabricada em mais de uma centena de países pobres ou em vizinhos desses mesmos países. Efectivamente, no âmbito do actual sistema de acesso privilegiado, o AGOA (African Growth and Opportunity Act), os EUA não abrangem o livre acesso à maioria dos países africanos. Esta situação vai ainda mais longe: até 2012, o vestuário abrangido pelo AGOA não possui qualquer taxa de importação caso seja fabricado com matérias-primas de países não abrangidos pelo AGOA, o que, quase sempre, significa China ou Taiwan. Acesso mais abrangente O NPDA pretende alargar a isenção de direitos aduaneiros e o regime especial para as matérias-primas provenientes de países do AGOA, para países fora da África classificados oficialmente pelas Nações Unidas como países menos desenvolvidos, ou seja, os países em que 80 por cento da população ganha menos de 2 dólares por dia. No entanto, a AMTAC (American Manufacturing Trade Action Coalition) apelida a proposta como “uma grande ameaça”. O director da AMTAC acrescenta que dois dos beneficiários propostos, Bangladesh e Camboja, são «super potências mundiais, em termos de exportações de vestuário». A posição da AMTAC acaba por ser algo discutível. Com os salários africanos tão baixos, a maior parte dos 5 dólares de custo de uma camisa reside no tecido, na linha e nos botões importados da China. Portanto, no caso de uma blusa de poliéster normal, fabricada no Quénia ou no Lesoto, os principais beneficiários da isenção de direitos de concessão são os trabalhadores fabris e os industriais chineses. Capacidade industrial limitada Os países abrangidos pelo AGOA possuem uma reduzida capacidade de produção de vestuário, e o motivo pelo qual eles estão autorizados a utilizar tecido chinês é porque as suas indústrias de tecelagem são ainda mais pequenas. Sem a concessão para a utilização de tecido estrangeiro, não existiria praticamente nenhuma exportação de vestuário de África. Independentemente dos benefícios que a concessão a países terceiros dá à China, traz emprego e desenvolvimento económico para alguns dos países mais pobres da África, os quais simplesmente não existiriam de outra forma. Mas os outros países menos desenvolvidos onde a nova proposta de lei tem aplicação são bastante diferentes. Fora de África, a maioria destes países não vão conseguir desenvolver indústrias transformadoras. Seja o que o futuro reserve para as Ilhas Salomão, para o Butão ou o Kiribati, não são certamente grandes empresas para o fabrico de t-shirts. Mas esta é uma questão a desenvolver na segunda parte do artigo.