O Origin Africa 2015 teve lugar em Adis Ababa, a capital e maior cidade da Etiópia, relançando, uma vez mais, a Etiópia no mapa do sourcing de vestuário mundial.
Os rankings comparativos de países, como o Índice de Facilidade para Fazer Negócios, elaborado pelo Banco Mundial, o Índice Ibrahim de boa governação e o Índice de Perceções de Corrupção não incentivam as empresas estrangeiras a estabelecerem-se na Etiópia.
No entanto, no que diz respeito à produção de peças de vestuário para os mercados dos Estados Unidos da América (EUA) e União Europeia (EU), os especialistas de sourcing asseguram que a Etiópia é o destino certo.
«Visitei diversos países asiáticos e africanos e a minha conclusão é que a Etiópia é o destino número um», disse Kumara Kahadugoda, diretor de sourcing e operações da empresa de vestuário de sourcing Duty Free Sourcing Inc. O empreendedor Siddharth Sinha, fundador e proprietário dos grupos Vogue e Velocity, concorda que nenhum outro país pode, atualmente, superar a Etiópia.
Os principais argumentos a favor da relocalização de unidades de fabrico estrangeiras na Etiópia estão bem documentados, e incluem a abundante disponibilidade futura de algodão e hidro energia, o acesso gratuito de produtos têxteis e de vestuário etíopes ao mercado dos EUA, sob o AGOA (a Lei de Crescimento e Oportunidade em África), e mercado europeu, sob o esquema EBA (Everything But Guns), o forte envolvimento do governo etíope, conforme descrito no seu Segundo Plano de Crescimento e Transformação, em vigor de 2015/16 a 2019/2020, e o custo laboral muito competitivo.
Paralelamente, a Etiópia procura atrair produtores de algodão sul-africanos experientes. A reforma agrária iminente na África do Sul exigirá uma redistribuição de 50% das terras pelos trabalhadores, a par da contínua violência contra os fazendeiros brancos (mais de 2.000 mortos desde 1994), pelo que estes fatores poderão persuadir alguns a considerar a oferta de terra vaga na Etiópia, aventurando-se nesse território.
Manogya Sharma, gestor de exportação da Inviya, uma marca do Indorama Group, a maior produtora integrada de poliéster do mundo, revelou que a empresa está, atualmente, em negociações com o governo etíope, pretendendo configurar de unidade de produção de poliéster na Etiópia – a primeira em África.
A extensão de dez anos do AGOA, acordada em junho de 2015, detém uma importância crucial para ambos os grupos de fabricação têxtil e de vestuário estrangeiros, bem como para os compradores americanos, que pretendem investir na Etiópia no longo-prazo.
Os investidores estrangeiros da indústria têxtil e do vestuário etíope elogiam, de uma forma geral, o apoio que receberam das entidades governamentais.
Porém, são ainda identificados alguns desafios. Kerstin Venhoven, gestor de produto para o segmento de moda da Hellmann Worldwide Logistics GmbH, aponta a discrepância existente entre o tempo de desembargo de expedições chegadas ao porto de Djibouti para fabricantes de vestuário free on board etíopes, demorando duas a três semanas, enquanto a expedição de peças de vestuário pode ser efetuada em apenas um dia.
Os custos laborais etíopes, notoriamente baixo – os fabricantes de vestuário presentes no Origin Africa citaram salários médios mensais de 46, 50 e 57 dólares – são, no entanto, significativamente ofuscados pela baixa produtividade e rotação elevada de pessoal. Todos os fabricantes de vestuário devem investir, permanentemente, na educação e formação dos trabalhadores.
Pioneiros do sector
As empresas têxteis turcas Ayka Adis e Saygin Dima, que entraram simultaneamente na Etiópia em 2008, são entidades pioneiras essenciais no investimento direto estrangeiro no sector.
Ayka Addis, atualmente o maior grupo têxtil presente na Etiópia, pretende realocar 20 empresas têxteis e de vestuário turcas no país. E o interesse turco pela Etiópia continua a aumentar, com o organizador da feira Ladin, proveniente de Istambul, a reunir 27 expositores turcos no evento Origin Africa 2015.
Apesar dos percalços iniciais enfrentados pelo fabricante Saygin Dima na Etiópia, o CEO Fatih Mehmet Yangin mostra-se otimista face ao futuro da empresa, acreditando que, no decorrer dos próximos dois anos, poderá obter uma faturação de 150 milhões de dólares. A Saygin Dima pretende, também, alargar as suas atividades de fabricação de vestuário, o que irá duplicar o número de postos de trabalho atuais, de 1.200 para cerca de 3.000 trabalhadores.
Os retalhistas e marcas de vestuário europeus e americanos têm agido lenta e cautelosamente. O retalhista de moda H&M iniciou testes de produção em três fábricas da Etiópia em 2012, e, em seguida, através de uma parceria com o Swedfund – que terá injetado 8,6 milhões de dólares, apostou na atualização dos seus fornecedores etíopes e «no desenvolvimento de uma indústria têxtil responsável na Etiópia».
O grupo americano PVH Corporation, que detém marcas como Calvin Klein e Tommy Hilfiger, reuniu alguns investidores asiáticos experientes, que auxiliaram na construção da sua cadeia de fornecimento no leste do continente africano.
Roy Ashurst, líder do hub de sourcing da PVH para África e subcontinente indiano, disse: «Trouxemos três investidores para o Quénia e cinco para a Etiópia. Um dos investidores, na Etiópia, é uma fábrica têxtil chinesa que confeciona camisaria. Contribuímos para a construção de um hub de fornecedores no Parque Industrial de Awasa, uma cidade localizada 270 quilómetros a sul de Adis Ababa, que deverá estar operacional em fevereiro de 2016, com 32 fábricas».
De acordo com fontes etíopes, uma empresa chinesa está a construir o Parque Industrial de Awasa por 246 milhões de dólares.
Concorrentes africanos
Durante o evento Origin Africa 2015, a cooperação regional e, até mesmo, a cooperação pan-africana, dominaram os temas de conversa. Na prática, porém, os serviços de promoção de investimento de cada país africano estão em concorrência direta pela atenção de investidores têxteis estrangeiros, não para África como um todo, mas para os seus respetivos países.
O Quénia, a maior economia da África Oriental e o maior exportador de vestuário sob o AGOA na África Subsariana, ao longo dos últimos cinco anos, apresenta uma força de trabalho mais dispendiosa, mas mais capacitada do que a Etiópia. Está, ainda, a atrair novos investimentos de fábricas de vestuário, ainda que menos face à Etiópia.
De acordo com Tim Armstrong, diretor de promoção de investimentos da Unidade de Desenvolvimento Têxtil da Tanzânia, o país é, efetivamente, o melhor destino para o fabrico de vestuário no continente africano.
Com um custo médio mensal de trabalho de 70 dólares, este é superior ao praticado na Etiópia, mas está mais próximo de um salário mínimo, pelo que não será suscetível de aumentar tão rapidamente como provavelmente ocorrerá na Etiópia.
Entre os principais argumentos apresentados por Armstrong a favor da Tanzânia, destaca-se o facto deste país possuir a maior produção de algodão do leste do continente africano, disponibilidade de malhas e tecidos locais, a par de um novo gasoduto para Dar Es Salaam, que foi recentemente ativado, e um novo porto eficiente – Bagamoyo Portside – recém-inaugurado.
Os países sem litoral, como o Uganda e o Ruanda, também competem pela atenção dos investidores têxteis.
Após sete anos de produção de vestuário no Quénia, o grupo chinês C&H Garment estabeleceu uma fábrica no Ruanda, prometendo criar 20.000 postos de trabalho (atualmente existem cerca de 300 trabalhadores). O governo ruandês está, atualmente, a analisar formas de acesso ao mercado de exportação para a fabricação em massa de vestuário de qualidade.