Energia mina competitividade da indústria do vestuário

Os preços da energia na União Europeia são seis vezes superiores aos centros de produção de vestuário concorrentes nos EUA, China e Ásia em geral, levando as associações a questionarem se, face a este cenário, as confeções europeias serão capazes de sobreviver.

Os preços da energia na União Europeia rondam atualmente os 0,56 euros/kWh, ou 0,60 dólares/kWh em comparação com os 0,10 dólares/kWh em centros de produção de vestuário concorrentes, de acordo com os dados da UE.

Paolo Sandri, responsável sénior de política para o comércio e indústria da Euratex, a confederação europeia do têxtil e vestuário, alerta que as importações de têxteis e vestuário da UE aumentaram 35% em 2022 em termos anuais. Juntamente com o aumento dos custos energéticos, que estão a afetar o negócio, a subida das importações e o consequente declínio da procura por artigos produzidos na Europa levaram confeções da UE a operar com prejuízo ou mesmo a fechar, explica. «Se não for tomada uma ação imediata pela UE e pelas autoridades nacionais, muitas empresas irão sair do mercado e a UE irá perder a sua capacidade de produzir artigos essenciais de uma forma sustentável», sublinha, em declarações ao Just Style.

A Euratex quer uma abordagem mais proativa para ajudar os produtores da UE a aprovisionar matérias-primas e produtos semiacabados, reduzindo os preços da energia – com um teto de preço não superior a 80 euros/MWh (um valor consideravelmente mais baixo do que o teto de preço grossista na UE de 180 euros/MWh) e apoio a longo prazo para assegurar energia barata e sustentável. Esta abordagem deve ser europeia e deixar «muito menos espaço para a ação individual dos estados-membro», acrescenta Paolo Sandri.

Deve ainda haver «investimentos ambiciosos» com uma mudança radical em relação à posição da UE sobre apoios estatais para ajudar os negócios de vestuário a sobreviverem à crise energética, considera o responsável da Euratex, salientando, no entanto, que isso não significa «simplesmente permitir que os estados-membro gastem o que achem que é necessário, o que iria desestabilizar o mercado interno da UE».

Marcas podem sair da Europa

Antonio Franceschini, secretário-geral da CNA Federmoda, a associação italiana de PMEs que produz moda “made in Italy”, adverte que as empresas de vestuário e calçado podem ter de parar a produção na UE ou relocalizar devido a energia insuficiente e custos elevados.

«Os aumentos de preço são inevitáveis, mesmo em encomendas já colocadas», realça Antonio Franceschini ao Just Style. «Em alguns casos, as organizações preferem bloquear a produção e o processamento de encomendas existentes. Globalmente, as empresas não conseguem lidar com o planeamento a curto prazo, não podem produzir com prejuízo e, dessa forma, arriscar o encerramento», esclarece.

O secretário-geral da CNA, sediada em Roma, adverte que se a UE não agir rapidamente, «o cenário pode ser dramático: mais um enfraquecimento de algumas partes da cadeia de aprovisionamento, com uma dependência ainda maior das importações, energia e matérias-primas de fora da UE».

Opções para o futuro

Apesar deste cenário de aumento da concorrência e das crises da energia e custo de vida, com medidas inovadoras de poupança de energia e apoios da UE, o sector pode conseguir sobreviver, acreditam os especialistas contactados pelo Just Style.

Lutz Walter, secretário-geral da Plataforma Têxtil Europeia para o Futuro dos Têxteis e Vestuário, garante que «as empresas usaram todo o tipo de estratégias e medidas temporárias para poupar energia» e sobreviver. «Algumas ainda beneficiaram de contratos a longo prazo de fornecimento de gás e eletricidade, outras de várias medidas de apoio dos governos e sempre que possível tentaram passar a subida dos custos de produção, pelo menos parcialmente, no preço dos seus produtos», aponta.

Como resultado, «a longo prazo vai haver novas estratégias em termos de combinação de energia, incluindo, quando possível, alguma geração local de energias renováveis», revela Lutz Walter ao Just Style. «Alguns processos que são alimentados a gás atualmente podem tornar-se eletrificados, mas esta é, sobretudo, uma solução a médio e longo prazo», considera.

Na produção de vestuário, o impacto do preço da energia é mais indireto e menos significativo do que no processamento e acabamentos de têxteis, destaca. «O impacto será mais sentido através de uma diminuição nas vendas, devido ao facto de que os consumidores afetados por contas de eletricidade mais altas e pela inflação geralmente não estarem dispostos ou serem capazes de gastar tanto em roupa», afirma Lutz Walter.