Desafios para uma década

Os custos de contexto, como a energia, as novas imposições dos consumidores e da legislação europeia sobre sustentabilidade são alguns dos desafios que a indústria têxtil e vestuário terá de ultrapassar para continuar a crescer até 2030.

Pedro Siza Vieira

No Simpósio da ITV promovido pela ATP – Associação Têxtil e Vestuário de Portugal, que nesta edição, a 29 de junho, assumiu o tema “Regenerar o Setor, Ganhar o Futuro: Uma visão estratégica para a década”, foi apresentado o estudo prospetivo para a indústria têxtil e vestuário para 2030. O documento faz a análise dos últimos anos e aponta caminhos para um futuro de crescimento, depois de uma crise provocada pelo covid que ainda está a abalar o sector.

«Fruto de uma pandemia que ninguém previu, mas que ainda hoje condiciona penosamente a nossa vida, o presente é instável, é incerto, pois a recuperação a que temos assistido ao longo de todo este ano anima-nos, mas não nos tranquiliza, uma vez que o futuro é algo a construir e que nenhum de nós, ao certo, pode antecipar com segurança», afirmou Mário Jorge Machado, presidente da ATP, durante o habitual Discurso do Estado do Sector, realizado perante o Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira.

Mário Jorge Machado

Realçando que na Europa há mais de 1,8 milhões de pessoas e mais de 115 mil empresas envolvidas nesta indústria, que é «uma das atividades mais exportadoras da União Europeia», Mário Jorge Machado salientou que «já nada nos assegura que os fatores críticos de sucesso que fizeram a competitividade do cluster têxtil nacional na passada década manterão a sua eficácia». Segundo o presidente da ATP, «estamos perante uma década em que os desafios serão muitos e que aquilo que serviu o nosso sucesso no passado, que nos alicerça, vai ser importante, mas temos agora que encontrar novas soluções».

Entre os fatores importantes para a competitividade nacional está a escala das empresas. «Senhor Ministro, foi aqui sugerido que deve ter uma intervenção, junto do seu colega das finanças, para haver mecanismos que promovam o crescimento das empresas, a fusão das empresas, diminuindo substancialmente o imposto nesta fusão, nesta aquisição entre pares, que permitam que o sector ganhe robustez», assinalou.

Ao Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital foi ainda pedido um maior apoio no financiamento e capitalização das empresas, nomeadamente com o fim das moratórias e os fundos provenientes do PRR, e atenção para o aumento dos custos energéticos. «A energia elétrica tem tido subidas muito importantes. Estamos a falar de subidas que atingem 40%-50% relativamente ao que era o seu custo há uns meses atrás. Vimos que em Espanha já foram tomadas algumas medidas, nomeadamente o Governo espanhol baixou o IVA da eletricidade para 10%. Nós também precisamos, a energia é um fator muito importante da competitividade das empresas», realçou Mário Jorge Machado.

Governo atento

Em resposta, Pedro Siza Vieira reconheceu a resiliência do sector e o trabalho desenvolvido pelas empresas e centros de competências e garantiu que «na perspetiva do Governo, os apoios aos segmentos mais afetados da nossa economia terão de continuar durante os próximos tempos», nomeadamente com apoios para «enfrentar o esforço acrescido sobre a tesouraria que o fim das moratórias poderá representar».

O Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital centrou-se, contudo, sobretudo no futuro e no papel que a indústria têxtil e vestuário poderá ter. «Sabemos que neste momento todo o percurso que foi feito por este sector não só representa um ganho de credibilidade e de confiança junto das autoridades públicas nacionais e europeias, como também demonstra que instrumentos de apoio ao investimento, instrumentos de apoio à modernização das atividades produtivas, instrumentos de apoio aos centros de competências, que são capazes de apoiar processos de inovação empresarial, são investimentos claros no futuro da nossa indústria».

Pedro Siza Vieira considera existir «desafios críticos» para esta indústria, nomeadamente ao nível da digitalização de processos e da sustentabilidade, mas acredita que a pressão dos consumidores no sentido da transparência pode ser uma oportunidade. «Este movimento só pode beneficiar a indústria europeia, só pode beneficiar a indústria nacional, que já utiliza padrões de exigência ambiental e outras muito superiores às de muitos países», apontou.

Quanto ao investimento, o Ministro lembrou que «vamos ter mais recursos destinados ao incentivo ao investimento produtivo e à inovação empresarial do que tivemos no quadro financeiro anterior», num valor de 800 mil milhões de euros, a que se soma o programa Next Generation EU, a chamada “bazuca” europeia, «com quase outro tanto». E, sublinhou Pedro Siza Vieira, «em termos proporcionais, Portugal é o país que mais recursos tem para apoio ao investimento empresarial», acrescentando que «em Portugal temos duas componentes que não existem noutros países – a componente de apoio ao investimento produtivo de empresas de todas as dimensões e de apoio à capitalização de empresas».

Para o Ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, «este é mesmo o tempo de investir, o tempo de ter foco e de fazer os movimentos de investimento que vão criar as bases para que, nos próximos anos, este sector, no seu conjunto, possa aparecer como forte, competitivo, distinto no panorama europeu e mundial, diferenciando-se pela qualidade, pela inovação, pela proximidade aos clientes, pela capacidade de responder rapidamente e de forma muito flexível às necessidades dos clientes, cada vez mais exigentes e mais ambientalmente responsáveis». Neste sentido, Pedro Siza Vieira deixou o apelo às empresas «a que se organizem, a que colaborem, a que invistam, a que cresçam».