Denim a seco

A seca na Califórnia ameaça a capital do denim mundial e obriga a repensar os processos utilizados na sua fabricação. O sector depende intensamente dos recursos hídricos para o cultivo do algodão e obtenção do look sofisticado que caracteriza o denim, um dos principais atores da indústria da moda dos EUA.

Em abril, pela primeira vez na história da Califórnia, o governador Jerry Brown decretou o estado de emergência devido à seca e ordenou um corte de água generalizado de 25%. A decisão do executivo surge na sequência do agravamento da seca que assola o estado americano há quatro anos, em resultado da reduzida queda de neve registada durante o último inverno, que se fixou nos valores mais baixos alguma vez registados. A região sul da Califórnia produz 75% de todo o denim fabricado nos EUA e é um elemento-chave no ecossistema da moda de Los Angeles – um mercado que gera anualmente 10 mil milhões de dólares em receitas – contribuindo em cerca de 10% para as suas vendas anuais.

Os pioneiros
Uma das principais entidades no universo do denim californiano, a Levi’s, preparou-se em antecipação. A marca de jeans lançou o seu processo de finalização “Water<Less” em 2011 e poupou, desde então, mil milhões de litros de água. Em março deste ano, a Levi’s expandiu a iniciativa, estendendo-a a outras categorias de produto além do denim, tendo por objetivo aplicar o processo na fabricação de 80% dos seus produtos até 2020. A empresa estima que são utilizados 3.800 litros de água no ciclo de vida do denim, com 68% aplicados na produção de algodão, 9% na fabricação e 23% na utilização feita pelo cliente final. A Levi’s encoraja, também, o consumidor a reduzir o seu próprio uso doméstico de água, limitando o número de lavagens dos jeans.

Inovações
As máquinas de ozono, que substituem o processo de branqueamento de máquinas de lavar tradicionais, oferecem uma alternativa às marcas premium de denim na redução do consumo de água, uma vez que o processo exclui a sua utilização. A marca de denim Citizens of Humanity usa máquinas de ozono há mais de cinco anos. «O nosso compromisso na preservação dos recursos naturais começou anos antes da implementação das mais recentes medidas de emergência. Nos últimos anos, aumentamos o nosso investimento em tecnologias inovadoras de forma a reduzir o consumo, não apenas de água, mas também de gás e eletricidade», explica a presidente, Amy Williams.

A produtora de denim Eco Prk, sediado em Los Angeles, tem investigado formas de replicar a lavagem do denim tradicional, utilizando ozono, e introduziu a nova tecnologia “Wiser Wash”, que usa menos 80% de água face aos métodos tradicionais. «O ozono é usado já há muito tempo, mas ninguém foi capaz de atingir um look desbotado bonito com ozono até agora», afirma Kevin Youn, CEO da Eco Prk. O processo tem o benefício adicional de permitir a reciclagem de 99% da água usada, que pode ser reutilizada em futuras lavagens.

A utilização de máquinas de ozono implica o acréscimo de um dólar ao preço final de um par de jeans premium e, até ao momento, as marcas têm absorvido este custo suplementar. As máquinas de ozono custam habitualmente 65.000 dólares cada. «Este sistema requere um investimento inicial mas o custo é muito mais barato e o ambiente de trabalho é melhor – não há água quente nem químicos», revela Youn. Adriano Goldschmied, o designer italiano responsável pela criação das marcas Diesel e AG, acredita que as inovações de empresas como a Eco Prk podem ajudar pequenas marcas da indústria californiana a sobreviver à ameaça de seca através de tecnologias pioneiras. «A Eco Prk pode ajudar diretamente pequenas marcas a alcançarem os seus objetivos, mas elas podem também ser um exemplo a seguir por toda a indústria, não apenas na Califórnia, mas em todo o mundo», advoga.

A lavandaria de denim Blue Creations, cujos clientes incluem as marcas Frame Denim, CJ by Cookie Johnson e BCBG, usa a tecnologia de ozono desde 2011 e planeia adquirir outra máquina no próximo ano. «Várias marcas procuram, cada vez mais, usar máquinas de ozono. Eventualmente, queremos usar ozono em quase todas as nossas lavagens de denim», refere Oscar Quintero, diretor de vendas e marketing da empresa. «Até ao momento, poupamos cerca de 50% de água em comparação com os métodos tradicionais, permitindo-nos a poupança de 15.000 a 20.000 dólares», acrescenta. As marcas estão, simultaneamente, a testar outros métodos limitadores do uso de água, entre eles as técnicas de laser.

De acordo com Lynda Grose, professora associada de Design de Moda da California College of Arts e especialista em marketing no Projeto Algodão Sustentável, esta tecnologia pode ser usada para criar diferentes variações de cor. «A Levi’s já trabalhou com isso», indica. «Eles usaram [essa tecnologia] para obter um efeito estampado em t-shirts, mas pode ser usada em qualquer tecido ou em denim, é verdadeiramente boa». Williams revela que a Citizens of Humanity usa o laser para replicar lavagens vintage no denim e está também a desenvolver tecidos que requerem menor quantidade de água no seu fabrico. «Neste momento, todos os tecidos são fabricados para lavagem com água», refere o CEO da Eco Prk. «Mas se os produtores de tecido compreenderem o novo processo de lavagem sem água e se fabricarem tecidos que necessitem menos água, seremos capazes de fazer jeans sem água».

O que se segue
Enquanto a chuva se nega a cair, os fabricantes preocupam-se sobre a futura imposição de normas mais rígidas. «Se forem impostos custos ou normas restritas, teremos de recusar ciclos futuros de produção ou investir fortemente em mais máquinas de ozono e outros métodos que permitam a poupança de água», sustenta Quintero, acrescentando que a Blue Creations está atualmente a executar testes em laboratório que procuram determinar qual a água que é reciclável. No entanto, as marcas continuam determinadas em manter a sua produção na Califórnia. «Ficar na Califórnia significa que as marcas aceitam jogar o jogo da qualidade e da inovação de produto», aponta Adriano Goldschmeid. «A água é um problema global, não apenas da Califórnia», sublinha.