As marcas e retalhistas ocidentais cujas encomendas foram apanhadas nos violentos protestos que ocorreram em Junho último, por parte dos trabalhadores de vestuário do Bangladesh, vão sem dúvida ficar reconfortadas com as notícias de que centenas de fábricas de vestuário já reiniciaram a sua actividade. Mas o alívio é provavelmente de curta duração, a menos que as questões no cerne desta instabilidade de longo prazo e latente – aumento do salário mínimo nacional e melhores condições de trabalho – sejam abordadas. Os protestos, que mais recentemente se centraram na zona de produção de Ashulia, a 32 km ao norte de Daca, onde os proprietários foram obrigados a fechar todas as 250 fábricas de vestuário após os trabalhadores entrarem em choque com as forças de segurança, marca uma escalada da violência na indústria do vestuário no Bangladesh. Com efeito, as condições salariais e laborais nas fábricas do país têm sido uma fonte de preocupação, com os trabalhadores – que estão facilmente entre os mais mal pagos do mundo – a ganharem actualmente apenas 1.662 takas (24 dólares) por mês. Este salário mínimo nacional, que foi fixado pelo governo em 2006, foi considerado insuficiente para satisfazer as necessidades básicas nessa altura. E, hoje em dia, fica muito aquém de cobrir os crescentes preços dos alimentos e imóveis, empurrando muitos trabalhadores para baixo da linha de pobreza. Para outros, a situação é considerada ainda mais desesperada. Não apenas os trabalhadores tiveram que enfrentar o aumento da inflação nos últimos quatro anos, como as fábricas reduziram os salários em 20% a 30%, numa tentativa de competir por encomendas com países como Vietname, China e Índia. Os trabalhadores não qualificados no sector de vestuário estão pior ainda, recebendo apenas 800 takas (11,5 dólares) por mês, sendo frequentemente forçados a trabalhar arduamente durante 14 a 16 horas por dia. Os grupos laborais também afirmam que, em muitos casos, os salários não são pagos a tempo, com atrasos de até dois meses para receber os vencimentos. Os manifestantes têm exigido que os vencimentos de base sejam aumentados para 5.000 takas (72 dólares) por mês para capacitar os trabalhadores a acompanharem o ritmo das despesas, incluindo alimentação, habitação, vestuário, educação, saúde e transporte. O vestuário é a principal exportação do Bangladesh e, como tal, é fundamental para a economia do país, com cerca de 4.000 fábricas que empregam 2 milhões de pessoas, sendo responsáveis por mais de 80% das receitas anuais de exportação de 15 mil milhões de dólares. Alguns dos principais nomes do retalho norte-americano e europeu, incluindo Marks & Spencer, H&M, Zara, Primark, Asda, Tesco, Gap e Wal-Mart, subcontratam empresas no país, atraídos pelos custos que estão entre os mais baixos do mundo. No entanto, muitas dessas empresas também estão a ter problemas com os baixos salários dos trabalhadores, entre receios de que as alegações de más condições laborais possam manchar a sua reputação como empresas socialmente responsáveis. Com efeito, um grupo de retalhistas internacionais aconselhou em Fevereiro o primeiro-ministro do Bangladesh de que era necessária uma “acção rápida” para resolver o problema. Parte da resposta do governo foi a criação de um conselho de salário tripartida, com representantes do governo (Ministério do Trabalho / Ministério do Trabalho e Recursos Humanos), proprietários de empresas (como a Bangladesh Garments Manufacturers and Exporters Association) e sindicatos de trabalhadores. Mas os sinais ainda não são promissores. Os trabalhadores afirmam que os proprietários das fábricas estão em falta por cortarem os preços para competir uns com os outros e que são frágeis nas negociações com compradores/importadores nos assuntos relacionados com preços. Os industriais, por outro lado, dizem que só podem aumentar o salário mínimo em 3 a 5 dólares e estão a negociar intensamente para manter os salários abaixo dos 30 dólares por mês. Não surpreendentemente, existem preocupações de que se não se chegar a acordo, as manifestações e paralisações são susceptíveis de aumentar novamente e os retalhistas e importadores não terão outra opção senão encontrar fontes alternativas de produção. No entanto, para os compradores, deixar o Bangladesh seria agravar o problema, de acordo com Mike Flanagan, presidente-executivo da Clothesource. «Mais do que em qualquer outro lugar no mundo, a economia do Bangladesh depende das peças de vestuário de baixo custo para os europeus, norte-americanos e, cada vez mais, as cadeias de japoneses», afirma Flanagan. «Não existe uma origem alternativa real para o vestuário de malhas de volume de baixo custo e as empresas estrangeiras continuam a investir na capacidade de produção. Manter o apoio aos produtos do país – mas, devidamente controlados – ainda é uma estratégia comercial inteligente», conclui.