A evolução do metaverso apresentará, segundo o gabinete de tendências WGSN, uma série de oportunidades comerciais para o retalho. Nos próximos anos, a chamada “metaconomia” abrirá novas possibilidades de produtos, recursos para o comércio e canais de distribuição.
Embora um terço da população dos EUA ainda não conheça o termo metaverso, o conceito tem vindo a ganhar força, em parte depois de, em outubro de 2021, o Facebook ter alterado a sua designação para Meta como parte do seu plano de abandonar o mercado das redes sociais e se tornar uma empresa do metaverso. Em novembro, a Microsoft anunciou o lançamento do seu próprio metaverso, a plataforma interativa Mesh, direcionada para as empresas.
Grandes nomes de outras indústrias também estão a preparar-se para o mundo digital, aponta o WGSN. A Nike já registou patentes de algumas das suas criações digitais, entre elas o “cryptokicks”, um sistema de lançamento de ténis digitais, e uma série de modelos virtuais que serão vendidos como NFTs (tokens não fungíveis). A empresa também inaugurou o Metaverse Studio e está a recrutar “meta-funcionários” para a sua equipa.
Oportunidades no retalho
As novas tecnologias estão a ajudar marcas e retalhistas a aproveitar as opções de comunicação e vendas que o metaverso oferece.
A lista inclui tecnologias como blockchain, realidade aumentada e realidade virtual, computação espacial, criptomoedas e finanças descentralizadas, comércio descentralizado (dCommerce), tokens não fungíveis, identidades digitais (ou avatares) e organizações ou comunidades não governadas conhecidas como DAOs (organizações autónomas descentralizadas).
O comércio descentralizado usa a transparência do blockchain para dar mais poder aos pequenos negócios, explica o WGSN. No comércio eletrónico tradicional, compradores e vendedores costumam pagar a intermediários para legitimar transações e arcar com possíveis riscos. Em geral, os vendedores acabam presos a esses intermediários, que podem ser o eBay, a Amazon, a Etsy, o Meta (Facebook), Stripe, PayPal, Shopify ou qualquer outro gigante do e-commerce que faz a mediação das vendas e oferece uma garantia de segurança.
Esses intermediários têm desvantagens. Os principais controlam os preços do mercado, as redes de distribuição, as opções de pagamento e as cadeias de abastecimento. Além disso, os vendedores sofrem com restrições, taxas e perda de autonomia e visibilidade. Questões éticas são também um possível problema.
Embora novo, o comércio descentralizado oferece uma solução para as questões enumeradas anteriormente, refere o WGSN. No entanto, acrescenta, inspira uma nova pergunta: “como posso confiar em alguém que não tem uma identidade?”. A resposta é dada através múltiplas camadas de responsabilidade, partes e compromissos: o dCommerce usa tecnologias de rastreamento via blockchain, inteligência artificial, partilha opcional de dados e contratos inteligentes que firmam uma relação de segurança entre vendedor e comprador, que são, contudo, escondidos do utilizador no final.
A Boson Protocol é uma plataforma descentralizada com protocolos detalhados sobre automação, redução de riscos e execução de contratos tokenizados. O sistema usa NFTs codificados com base na teoria dos jogos, que prevê as variáveis de futuros contratos. O seu objetivo é ligar o comércio virtual a uma variedade de sistemas de pagamento e bases de dados, criando incentivos que aumentam a segurança e igualdade desses sistemas, diminuem custos e ajudam os negócios a crescer.
«O que vai acontecer se gigantes como a Amazon continuarem a controlar as redes de distribuição? Vão acabar por dominar todo o mercado, o sector das finanças e as cadeias de aprovisionamento. O objetivo da Boson é construir a infraestrutura necessária para a criação de um novo tipo de economia», afirma Justin Banon, cofundador da Boson Protocol, citado pelo WGSN.
Entre o físico e o digital
Para atrair um público cada vez mais habituado ao comércio eletrónico, as lojas físicas estão a oferecer experiências que vão além das compras.
A pandemia, que teve o seu auge em 2020 e 2021, acelerou a adoção mundial do comércio eletrónico, tornando as compras online uma nova experiência. Apesar dessas mudanças, muitos consumidores ainda se sentem divididos na hora de escolher onde comprar. Nos EUA, 46% das pessoas preferem comprar em lojas físicas, ao passo que os consumidores britânicos e chineses demonstram preferências pelas compras virtuais.
À medida que tecnologias como renderização, realidade aumentada e realidade virtual se tornam mais baratas e acessíveis, cresce o número de ferramentas capazes de integrar experiências virtuais e físicas, tanto na internet quanto na vida real. Nesse cenário, as empresas mais preparadas irão criar experiências figitais – uma mistura de físico e digital – inesquecíveis e adequadas à sua marca, respondendo às exigências do consumidor de forma natural, salienta o WGSN.
A Etsy entrou no mercado de lojas digitalizadas com o lançamento da The Etsy House. A casa virtual hiper-realista está decorada com produtos vendidos na plataforma Etsy. Os consumidores podem passear pela casa e clicar em itens para obter informações, fotos, links para compra e aceder a uma ferramenta 3D que permite vê-los de todos os ângulos.
Em outubro, a Selfridges fez uma parceria com a designer Charli Cohen para lançar uma experiência de compra figital para comemorar os 25 anos dos Pokémon. O lançamento aconteceu no Electric/City, um mundo virtual que convidava os utilizadores a criar avatares, experimentar peças de vestuário digitais com a ajuda de um filtro do Snapchat e a comprar artigos através de blockchain. A retalhista também organizou um evento presencial numa das suas lojas para ajudar os clientes a criarem carteiras de investimentos digitais.
O metaverso é ainda uma boa forma de atrair consumidores chineses interessados em novidades, sublinha o gabinete de tendências, dando como exemplo a exposição de arte no metaverso organizada pelo Alibaba, o gigante chinês de e-commerce, nas plataformas Taobao e Tmall. O evento virtual, que foi apresentado por Ayayi, o avatar-funcionário do Alibaba, ofereceu aos consumidores a oportunidade de comprar NFTs criados por marcas como Burberry, Coach e Longines.
O comércio direto a avatares (ou D2A) está igualmente a emergir como um modelo de negócio, devendo gerar um mercado avaliado em 400 mil milhões de dólares até 2025.
Inspirado em estratégias usadas há décadas nas plataformas de jogos, onde os jogadores podem comprar “skins” para expressar a sua individualidade, o crescimento do D2A está ligado ao avanço das plataformas imersivas. Há os jogos como o Roblox, Fortnite e Animal Crossing, ou apps menos populares como o Aglet (conhecido como o “Pokémon Go dos ténis”). Embora startups como a Crucible estejam a desenvolver tecnologias que permitem usar um mesmo avatar em diferentes sistemas, atualmente as marcas têm meios limitados para testar plataformas específicas. Entre os exemplos constam as parcerias Louis Vuitton x League of Legends, Gucci x Roblox e Balenciaga x Fortnite.
O WGSN salienta ainda que o mercado de itens digitais também é interessante do ponto de vista da sustentabilidade. As estimativas apontam para que o modelo direto ao consumidor tenha desmaterializado a cadeia de aprovisionamento em 40%, mas o comércio D2A pode ajudar a acabar com todas as redundâncias. «Este modelo de vendas dá às marcas a possibilidade de testar protótipos e designs sem a necessidade de produzi-los ou transportá-los, além da oportunidade de vincular vendas de produtos virtuais e reais», explica o gabinete de tendências.
Centros comerciais imersivos
À medida que o metaverso amadurece, os retalhistas que tentam expandir a sua presença no mundo virtual ganharão acesso a novos pontos de venda. Embora já existam lojas no Decentraland, o preço dos terrenos e imóveis virtuais (conhecidos dentro da plataforma como LAND) está em alta, variando entre 3 e 60 mil dólares. Em junho, uma empresa de investimento com sede nos Estados Unidos comprou 259 terrenos virtuais por mais de 900 mil dólares, o maior valor gasto numa transação deste género até hoje.
A Everyrealm (ex-Republic Realm), uma empresa de investimentos especializada em NFTs que compra e constrói imóveis digitais, adquiriu um terreno no Decentraland que hoje abriga o Metajuku, um centro comercial virtual inspirado no bairro de Harajuku em Tóquio. Na data do seu lançamento, o centro comercial já contava com uma série de lojas, como as das marcas de moda digital Tribute Brand e DressX. Os utilizadores podem entrar nessas lojas e conhecer os seus produtos, sendo direcionados para o comércio eletrónico das marcas ao clicar no artigo escolhido.
«Tal como no mundo real, as marcas interessadas em comprar imóveis no metaverso devem ter em consideração fatores como localização, design de loja, experiência do cliente e uma estratégia omnicanal de comunicação e serviço para garantir os melhores resultados de vendas», resume o WGSN.
Um lugar para os NFTs
Além de provar que os NFTs não são apenas imagens colecionáveis, há novas estratégias que mostram como as marcas podem usar estes tokens digitais para aumentar as suas vendas, incentivar a fidelização e estimular o engajamento do público.
Os NFTs, imagens digitais colecionáveis que carregam características únicas e costumam ser comercializadas através da plataforma Ethereum, cimentaram a presença das criptomoedas no imaginário popular. Após um breve período de queda na segunda metade de 2021, a venda de NFTs cresceu 704%, para 10,67 mil milhões de dólares, no terceiro trimestre em comparação com o trimestre anterior.
Atualmente, refere o WGSN, udo pode ser tokenizado e vendido: de nomes de domínios descentralizados e itens de jogos a tweets e memes. À medida que o blockchain e os tokens digitais passam a fazer parte da cultura de massa, surgem novas formas de combater a falsificação e garantir o engajamento do público, como souvenirs digitais, brindes tokenizados e itens digitais colecionáveis.
Atualmente, 40% dos millennials nos EUA sabem o que são NFTs, 38% dos consumidores do país acreditam que são um bom investimento e 27% dizem já ter comprado algum token. Muitas marcas recorreram a marketplaces de NFTs para lançar os seus próprios tokens não fungíveis, seguindo os passos de artistas visionários que lucraram com essa tecnologia (uma obra do artista Beeple, por exemplo, foi vendida por 69 milhões de dólares num leilão em março). Esse sucesso incentivou marcas de quase todas as áreas – da Pizza Hut Canadá à Coca-Cola, passando pelos brinquedos Mattel Hot Wheels e ao papel higiénico Charmin, da Procter & Gamble – a surfar na onda dos NFTs para criar estratégias de venda e marketing experimentais e lucrativas.
«A próxima evolução do mercado de NFTs terá início no carrinho de compras, com o surgimento de novos protocolos que permitem aos retalhistas acrescentar tokens a produtos físicos, criar NFTs comemorativos e desenvolver serviços que irão aumentar o engajamento do público e criar novas fontes de rendimento», acredita o gabinete de tendências.