Alunos fogem da engenharia têxtil

Há duas universidades em Portugal onde se pode aprender engenharia têxtil e de vestuário. A licenciatura de engenharia têxtil na Universidade da Beira Interior (UBI) não vai acabar, mesmo que continue a ter apenas um novo aluno por cada ano de acesso, garante ao jornal Público o reitor da instituição, Manuel Santos Silva. As duas únicas universidades portuguesas com licenciatura em engenharia têxtil – a UBI e a Universidade do Minho, desde 1975 -, têm um problema, comum à própria Europa e EUA, de fuga dos jovens das “engenharias”. O número de alunos vai diminuindo, ao mesmo tempo que o mercado de trabalho pede cada vez mais essas qualificações. A UBI é, no entanto, a mais afectada e, admitem os seus órgãos de administração, conta ainda com o peso da interioridade. A UBI tem hoje um departamento de ciência e tecnologia têxtil que desenvolve, neste momento, investigação de batas cirúrgicas, tecidos para pára-quedas e fardas militares, em associação com empresas portuguesas. São produtos com toda a probabilidade de utilização dentro de alguns anos. No entanto esta universidade não tem jovens para as vagas, apesar de se inserir numa região têxtil, com empresas do Norte ao Centro a implorar por licenciados. Há vários factores que explicam o fenómeno, segundo Santos Silva: uma crise de vocação dos jovens do básico e secundário que leva os jovens “mais para humanidades do que para engenharias”, tese que os responsáveis da Universidade do Minho também defendem. Além disso, há uma tendência dos jovens para áreas de moda, mas há também a ideia de que há uma crise têxtil na região. A Covilhã, diz, “nunca produziu tantos metros de tecido como actualmente”, sendo também a região que acolhe o segundo maior produtor de lanifícios da Europa. No actual ano lectivo, a UBI aceitou a entrada de um único aluno, o único entre vários candidatos, em “condições de entrar” com a nota mínima de 10 valores. Este aluno terá depois 14 professores por “sua conta”, tantos quantos os que compõem o departamento de ciência e tecnologia de têxteis da universidade. A média anual de licenciados neste curso tem sido até agora de 10. A falta de interesse por engenharia deve-se ao facto de ser pedida uma formação de base em matemática e física. “O que é preciso é existirem quadros que inovem”. Os jovens respondem fugindo para cursos “laterais”, o que a própria UBI testemunha através do seu curso de “design” têxtil. “Está sempre cheio, e a nota mínima de entrada é 14”, acrescenta. A Universidade do Minho, com um curso de engenharia têxtil e outro de engenharia do vestuário, não enfrenta falta de alunos no primeiro, mas mesmo assim “já teve muito mais candidatos”, afirma a directora dos cursos, Rosa Vasconcelos. No ano lectivo 2000/01, inscreveram-se 38 alunos para um total de 40 vagas, diz. Onde a falta de alunos é mais visível é no curso de engenharia do vestuário, não tendo conseguido preencher as respectivas 25 vagas, apesar dos “muitos pedidos da indústria”. A média estimada em Braga é de cinco pedidos por aluno. Face ao panorama negativo que a ausência de alunos terá no futuro da que já foi a maior indústria exportadora do país e hoje é a segunda, a Associação das Indústrias de Lanifícios vai conceder uma bolsa de estudo aos novos alunos da UBI, que se traduz no pagamento das propinas, para além de prémios aos que obtiverem melhores classificações. “Não há hoje vocação para as engenharias. As matemáticas e as físicas terão de ser ensinadas de outra forma, para que os alunos se sintam aliciados. Isto é preocupante para o país”, acrescenta Santos Silva. O “boom” registado então esteve também muito ligado aos anos sem notas mínimas. Mas os resultados não foram bons com a menor selectividade: “Esses alunos tiveram dificuldade em acabar o curso.” No caso da indústria têxtil, a escassez de quadros com capacidade de trazer inovação ao sector é agravada pelo facto de ter “deixado de ser uma indústria de mão-de-obra intensiva, para ser de capacidade e tecnologia”. As aplicações técnicas dos têxteis são crescentes tanto na indústria automóvel como na construção, por exemplo como a manta de geotêxteis que passou a ser obrigatória nos pavimentos das auto-estradas.