No ano em que comemora 35 anos de atividade, a Becri recebeu o prémio de maior crescimento de volume de negócios do CENIT, e promete não ficar por aqui. Em 2018, a produtora de vestuário sediada em Barcelos adquiriu uma empresa de confeção em Esposende, a somar aos investimentos realizados no ano anterior em Vila Verde, que fazem com que o grupo contemple agora quatro unidades industriais e empregue diretamente 400 pessoas.
José Costa – que partilha a administração com os irmãos Jorge Costa e Paula Alves e o cunhado Américo Alves – revelou, ao Jornal Têxtil, os passos que conduzem o grupo Becri ao futuro, sem perder de vista o tempo passado nem o espaço presente.
O que retém em especial destes 35 anos de história da Becri?
O caminho longo que se percorreu, o trabalho árduo que se realizou, e se continua a realizar, e o espaço que se conquistou no mercado. A equipa, da qual nos orgulhamos muito. É um efetivo que tem crescido sempre de forma positiva e os resultados devem-se única e simplesmente a esta força de trabalho.
Como começa a ser trilhado esse caminho?
O meu pai era alfaiate mas durante um incêndio – era bombeiro em Barcelinhos – lesionou-se na coluna. Foi aconselhado pelos médicos a mudar de profissão, porque o trabalho de alfaiate exigia muito da coluna. Então o mais próximo de alfaiate era a produção em série de vestuário. Porque é que o meu pai, sendo alfaiate, não enveredou pela confeção em tecido? Por uma questão muito prática: quando foi apreçar as máquinas, as de costura para tecido eram bastante mais caras que para malha. O meu pai não tinha dinheiro – tinha era vontade de trabalhar. E só conseguiu graças ao José Maria Rodrigues, o representante em Guimarães das máquinas Brother que na altura deu algumas facilidades para concretizar a compra de quatro.
Quando sucede a mudança para as instalações atuais?
Mudámos em 1997 e é curioso que foi por imposição de um cliente, de Itália. Na altura, a qualidade para os clientes, principalmente italianos, estava nas peças mas também na apresentação da empresa. Então foi de um momento para o outro – viemos ver o primeiro pavilhão e fechámos negócio na hora. Três meses depois comprámos a primeira máquina de corte e começámos o pavilhão de cima. Esta mudança também trouxe outros clientes, abriu novas oportunidades no mercado e, ao mesmo tempo, criou melhores condições para os nossos trabalhadores. Mas ao ritmo que estávamos a crescer, o espaço logo começou a ser pequeno. Em 2008, em plena crise, comprámos o edifício adjacente. Há um ano atrás efetuámos um aumento de 5 mil metros quadrados, onde temos atualmente o corte, o showroom e o design. Estamos ainda a remodelar este segundo edifício, vamos remodelar outra vez o primeiro e comprámos o terceiro, que também vai ser remodelado. Quando tudo acabar, o que deverá acontecer em agosto de 2019, vamos ficar com uma área coberta de cerca de 11 mil metros quadrados, num investimento entre os 7 e os 8 milhões de euros.
Em 2017 adquiriram uma confeção em Vila Verde. O que motivou esta compra?
A Títulos e Rúbricas, como se chama agora, era uma confeção a feitio, que trabalhava também para nós. O dono pôs a empresa à venda e achamos que era o momento de aumentar a confeção, porque é um sector que todos sabem que vai encontrar algumas dificuldades por falta de costureiras. Portanto, era um momento propício para esta compra, que ficou concluída em setembro de 2017. Achávamos que ia ajudar, como está, a fazer o planeamento produtivo de forma mais assertiva. Hoje não se pode falhar. A Títulos e Rúbricas vem enquadrar também outra necessidade: as encomendas flash que aparecem no mercado. Ora, ou temos capacidade para responder ou perdemos negócios.
Qual é o efetivo de trabalhadores dessa unidade produtiva?
Hoje tem 95 pessoas, na altura eram 65. A ideia é ficar nos 100 trabalhadores. Já fizemos obras de remodelação do pavilhão e vamos agora criar uma parte social, que falta.
Como surge a Guay, a outra empresa de confeção localizada em Barcelos, próxima da Becri?
A Guay é mais antiga. A empresa foi constituída em 2010 e estava dentro da Becri. Em 2015 ganhou vida própria porque apareceu a oportunidade de comprar a empresa aqui em frente, que ia entrar em incumprimento. Também acabámos por ficar com os trabalhadores.
E a Gubec, a unidade de produção que acabam de adquirir em Esposende?
Foi igualmente uma oportunidade que surgiu. Era a antiga ForBody. Como estávamos a crescer e queríamos também crescer mais num determinado mercado, posicionamo-nos para fazer a compra e concretizou-se em março deste ano. Temos lá cerca de 80 trabalhadores. Estrategicamente era para o mercado francês, mas em poucos meses mudámos porque sentimos que não podemos deixar a empresa fechada só a esse mercado.
Algumas empresas estão a integrar outros processos industriais para se tornarem verticais. Esta possibilidade coloca-se no horizonte do grupo?
A história mostra-nos que as grandes empresas que existiam em Barcelos sucumbiram. Estamos a falar de uma Tor, de uma Tebe, de uma João Duarte, que tinham tudo dentro de portas. Acho que Portugal se tornou mais competitivo porque segmentou o negócio. Essa especialização foi o trunfo que levou a que Portugal desse a volta nestes últimos anos. A nossa forma de estar é não sermos verticais em termos de estrutura, mas somos verticais em termos de conhecimento e de competências. Dominamos todo o processo. Temos know-how nas malhas, na tinturaria, no corte, na confeção, na estamparia, nos bordados…
Onde são subcontratadas as restantes etapas produtivas?
Cerca de 95% são matérias-primas e fornecedores locais, na zona de Barcelos. Aproximadamente 5% é fora da nossa linha normal de fornecedores, em que um cliente utiliza determinada matéria-prima importada, que faz parte da coleção dele.
Com que volume de negócios deverão fechar 2018?
O grupo fatura atualmente 45 milhões de euros. No final de 2019, com as obras concluídas, acredito que vamos estar com potencial para subir para 60 milhões de euros, que é o nosso objetivo.
Esse incremento passa pelo aumento do número de clientes ou pelo crescimento dentro dos atuais clientes?
Passa por ambos: crescer dentro dos clientes que temos, desde que não ultrapasse 15% por cliente, e conquistar novos clientes. Mas a ideia é ir ao encontro dos clientes que melhor correspondem à nossa estratégia de média-alta gama e, no futuro, queremos que todos estejam alinhados com essa estratégia.
Que perfil tem o cliente Becri?
Trabalhámos para o grupo Inditex há uns 15 anos, mas chegámos a uma altura que deixámos, porque não havia um ajuste direto entre esforço e recompensa. Então decidimos enveredar por clientes de mais valor acrescentado e diferenciados. Portanto, a nossa aposta é em clientes que precisem de um serviço e de um fornecedor que tenha disponibilidade, capacidade e que consiga fazer a leitura no momento certo daquilo que precisam. Hoje não vendemos somente minutos – vendemos serviço, design, capacidade produtiva ao momento, o que faz com que nos distingamos e sejamos realmente uma mais-valia para os clientes.
Quantos clientes contempla atualmente o portefólio?
No grupo estamos a trabalhar à volta de 30 clientes, em mais de 30 mercados. Estamos a falar da Europa toda e do Canadá
Há novos mercados na linha de mira?
Os EUA. Vamos participar na Magic Las Vegas, em fevereiro. Vai ser uma primeira experiência, queremos tirar bastantes ilações no fim desta feira sobre o mercado americano. A nossa estratégia foi sempre dividir o risco, nunca pôr todos os ovos no mesmo cesto. O nosso mercado estratégico é o continente europeu e, em termos locais, estamos a falar mais do Reino Unido, França, Alemanha e Itália. Há também o mercado holandês, que temos vindo a explorar e em 2019 vamos tentar consolidar com algumas marcas, como a Calvin Klein e a Tommy Hilfiger. Mas consideramos que um novo mercado pode abrir-nos portas para solidificar o nosso grupo de empresas.
Como está a Becri a assimilar a Indústria 4.0?
O futuro está na flexibilidade das empresas, que têm de se adaptar. A Becri procura clientes de média-alta gama, não esquecendo que tem de ter alguns clientes-suporte, fortes, para poder rentabilizar a sua estrutura. Por isso, a estratégia passa por ter uma empresa que tanto está a produzir encomendas de 100 mil peças como de 100. E a nossa estrutura já está preparada para isto. Neste momento temos seis mesas e duas máquinas de corte – dizem-nos que temos das melhores salas de corte da Europa a nível têxtil. Na indústria 4.0, estamos mais focados na digitalização dos processos, o que faz com o tempo e o espaço fiquem mais curtos. Porque há uma coisa que não podemos esquecer: pomos muitos minutos em cima de peças.
No entanto, até termos robôs a fazer toda a roupa, acho que ainda faltam muitos anos. Sabemos que existem bons exemplos de automatizações, mesmo na indústria têxtil, mas nós trabalhamos vocacionados para o cliente. A diferença faz-se pelo know-how que temos e adquirimos, não pela automatização; vai ser pela otimização de processos, pela velocidade com que a informação passa de um lado para o outro, pela rapidez com que executamos o que o cliente quer.
Que papel cabe ao design dentro dessa estratégia?
É um sector que temos vindo a desenvolver ao longo dos últimos anos e que faz parte do serviço que apresentamos ao cliente. Antigamente, o cliente trazia-nos as encomendas e nós limitávamo-nos a executar. Hoje temos que dar sugestões, até porque as ideias começam a ficar desgastadas e, com a nossa vivência, conhecimento global da moda e das especificidades de cada cliente, temos que trabalhar o design.

Há novos projetos em incubação?
Temos vindo a trabalhar num programa na área da sustentabilidade. Sustentabilidade em tudo: na empresa e naquilo que produzimos. O meio ambiente é realmente a nossa preocupação mais premente. Não é só nossa, felizmente começa a haver uma consciencialização global da sustentabilidade e fico feliz que toda a gente olhe para o futuro das gerações vindouras. Os nossos planos passam por apresentar ao cliente um produto reciclado e 100% sustentável, que incorpora o desperdício que sai do corte juntamente com outra matéria-prima. É algo muito específico e estamos à procura do cliente estratégico. Temos neste momento apontados dois ou três clientes para apresentar-lhes este projeto.
Quais são os maiores desafios que se colocam hoje ao grupo Becri?
O maior desafio é manter a mente aberta. Porque se as pessoas estiverem de mente aberta, conseguem alcançar tudo. Os clientes podem vir com novas exigências, mas se a estrutura for aberta, consegue rapidamente absorver as transformações que o mercado traz.