O ciclo de seis colóquios sobre «Questões de Moda», organizado pelo ICEP, CENESTAP e pela Fundação Ciência e Desenvolvimento encerrou em beleza na noite de 19 de Dezembro no Teatro do Campo Alegre, no Porto, com o tema «A Moda e a sua Imagem». Um ciclo que «esteve acima de todas as expectativas segundo as pessoas com quem fui falando nestas semanas», afirmou na abertura Manuel Serrão, empresário do mundo da moda que já não precisa de apresentações, responsável por moderar as cinco intervenções da noite. «A imagem vale por mil palavras, e estão aqui cinco pessoas que o podem confirmar», salientou para apresentar a jornalista de moda Ana Mesquita (cuja empresa de design ganhou este ano o concurso público para as fardas da Galp), Alexandra Macedo, directora da agência Best Models, e responsável pela direcção de manequins em diversos desfiles nacionais, a ex-manequim Vera Deus, Victor Nobre, galardoado no ano passado com o prémio Carreira Optimus 2000, por todo um percurso ligado à direcção e produção de desfiles e formação e direcção de empresas da ITV, e finalmente Mário Matos Ribeiro, criador do Moda Lisboa e professor de design de moda na FAUL. Depois de um ecléctico vídeo das mais representativas imagens de moda correntes, Ana Mesquita frisou que «todos somos veículos de moda», que se apresenta das mais variadas formas, culturais e multi-raciais. A imagem de moda que nos é veiculada por todo o tipo de mass-media (e recordemos os já frequentes investimentos de publicações semanais nesta matéria, como o Expresso ou a Pública), «vive de códigos elitistas e vende o luxo, e o luxo de se ter antecipado ao tempo e celebrá-lo. E o tempo é o maior luxo». A democracia cria a ideia de igualdade de oportunidades, e democratizou-se o luxo, «as pessoas lêem na Vogue e compram na Zara para se aproximarem das personagens da Vogue», salientou. Na publicidade de moda, uma das mais reconhecidas formas de arte (faleceu recentemente Herb Ritts, um dos seus ícones), que vemos na tv, jornais, revistas e outdoors , reconhecemos presentemente os conceitos de festividade, erotismo, esperança (gravidez), família, infância, descontracção, revivalismo, tendências e até a morte. Finalizou com o lamento de não haver mais jornalismo de moda, pois «todos ganharíamos mais com isso» Para Alexandra Macedo, enquanto que há uns anos atrás a beleza era um conceito estereotipado, a gora a beleza é um conceito mais complexo que inclui conjuntamente um ar, uma ideia, uma roupa. Como directora de uma agência de modelos, acrescentou ao debate a necessidade diversificar a carteira de manequins em termos de imagem e de salvaguardar os seus direitos de imagem, várias vezes não respeitados. A manutenção da imagem dos manequins assume obviamente particular importância, incluindo a cuidada alimentação e exercício físico e a necessidade de quebrar os tabus da estética e da correcção. «Trabalhar e corrigir a imagem é facturar mais». Neste âmbito, a ex-manequim Vera Deus recordou a todos o seu percurso de manequim, e confessou o seu investimento nesta alteração estética que a empresa onde trabalhava inicialmente julgou necessária. «Disseram na altura que tinha um nariz complicado, com muitos ângulos e muitas sombras». E, assim, saíu uma operação ao nariz. E depois de anos com o cabelo curto em que acabou por ficar com aquela imagem em termos comerciais, quando mais tarde a quis alterar, teve de fazer extensões. Victor Nobre surpreendeu a audiência pela objectividade e acutilância da sua visão empresarial. «A moda é apenas um negócio. No actual contexto de adversidades, as empresas aperceberam-se da necessidade de criar mais-valias. A mais potenciadora delas é a marca própria, que deve ser testada no mercado nacional, aliada à capacidade intelectual de criar moda». Ao contrário da doutrina que a generalidade da imprensa da especialidade tem publicado, o empresário acredita que os criadores e as empresas têm caminhos paralelos e que em Portugal a imagem do estilista não é reconhecida. A moda de autor tem um passado recente no nosso país (10-15 anos), e tem tido muito pouca projecção, à excepção da Ana Salazar. «Há boas escolas e bons designers», mas porventura não será suficiente para que se destaque um caso de sucesso. «À semelhança do que se fez nos anos 70, quando se trouxeram para cá técnicos de produção, porque era necessário produzir a feitio e bem, vamos ter de importar designers seniores, focalizados nos mercados alvo de cada empresa», apresentava como solução. «O designer deve trabalhar para o conceito e filosofia da marca, e ter no mínimo uma experiência de 10 anos no mercado alvo da mesma», acrescentou. Para Victor Nobre, a estratégia que importa definir para a marca, com a componente moda, envolve dois passos fulcrais: os pontos de venda próprios e a internacionalização. Em relação ao primeiro, por um esforço conjunto dos criadores e de todas as organizações envolvidas, têm-se criado os pontos de venda. Mas as tentativas de internacionalização das marcas têm fracassado. O que fazer? Sobreviver com parcerias internacionais… embora a exiguidade do mercado não ajude e ainda termos «um problema cultural, pois julgamos que apenas o que é estrangeiro é que é bom». Finalizou com algumas advertências. «A imagem de Portugal lá fora é que Portugal sabe fazer bem, mas ainda temos a imagem de sub-contratados a feitio e as empresas que só trabalhem a feitio vão todas fechar», augura Victor Nobre. Se não foi possível criar marcas em tempo de vacas gordas, não vai ser agora». «E com a queda do acordo de multi-fibras e com a globalização, diz-se que a China vai fazer dentro de poucos anos 50 por cento do vestuário mundial», acrescentou. Ao contrário do anterior interveniente, Mário Matos Ribeiro afirmou que é preciso estratégia e rigor para lançar marcas portuguesas, mas é possível, embora tenhamos um défice de ambição e de estratégia que nos compromete. E a respeito do conceito de moda estabeleceu a clivagem: «a moda é criação e a indústria é a resposta às exigências dos consumidores». Recuperando o tema em debate, a moda é indissociável à fotografia e a fotografia de moda tem um estatuto de arte maior. «Mas a moda alterou-se profundamente, e hoje em dia é mais a imagem que se constrói à volta da roupa. A moda é cada vez mais um resultado de uma equipa maquilhador, set designer, fotógrafo, manequim, guarda-roupa – gira em torno de um negócio e é cada vez menos criação e cada vez mais registo via fotografia». «A moda não é portuguesa, francesa ou inglesa. É mundial e anda sempre à volta do vestuário», acrescentou o professor de design. Antes de iniciar o debate que se seguiu, Helena de Matos, comissária desta iniciativa e professora no Citex, quis salientar que não concorda com Victor Nobre em relação à pouca notoriedade dos estilistas nacionais, pois não será por acaso que alguns deles trabalham hoje em dia nas maiores casas de costura mundiais. O estilista Nuno Baltazar colocava então a grande questão da noite: Porque é que a moda portuguesa não vende, mesmo quando se vêem os desfiles cheios? Para Mário Matos Ribeiro trata-se de um fenómeno cultural nacional. «A Bélgica é um país que inova na moda e tem tradição têxtil como nós, mas tem o chauvinismo que lhes é característico e que dá muito jeito». E realçou que a realidade externa difere dos apoios a nível nacional, pois a Áustria, por exemplo, financia um criador e um desfile na integra numa temporada, e depois eles têm de se esforçar sustentadamente. «Em Portugal os estilistas concentram as suas energias nos desfiles e depois não pensam no resto. A moda serve de relações públicas e nesse segmento os estilistas fazem pouco por eles próprios. Tem de haver um esforço das organizações, mas elas não podem fazer tudo. Tem de se investir na imagem de marca. Toda a gente sabe quem é a Ana