A escalada do Vietname

Seguindo um percurso semelhante ao trilhado por países como a Coreia do Sul, Taiwan e China, o Vietname está a juntar os ingredientes certos para um caldo de crescimento rápido e sustentado.

Em 2015, o investimento direto estrangeiro no Vietname atingiu um recorde e, este ano, voltou a subir. Os negócios somaram 11,3 mil milhões de dólares (aproximadamente 10,1 mil milhões de euros) no primeiro semestre de 2016, um aumento de 105% em relação ao mesmo período do ano passado, apesar do abrandamento da economia mundial. Os acordos de livre comércio assinados pelo país explicam parte do apelo. Mas, ainda assim, há algo mais profundo em curso, antevê a The Economist

O Vietname tem um historial interessante, muitas vezes subestimado. Desde 1990, o crescimento do país por pessoa foi, em média, de cerca de 6% ao ano, sendo apenas suplantado pela China. Isto ajudou a que o país abandonasse a lista dos mais pobres do mundo e se posicionasse ao lado dos de rendimentos médios.

Além disso, se o Vietname conseguir apresentar um crescimento de 7% durante mais uma década, a sua trajetória passa a aproximar-se da China e dos chamados “tigres asiáticos”. Todavia, se o crescimento cair novamente para os 4%, o país acaba no grupo da Tailândia e do Brasil.

Outro dos trunfos do Vietname, talvez o maior, é a sua geografia. A fronteira com a China, outrora ponto de fricção militar, é agora uma vantagem competitiva. Nenhum outro país está mais perto do coração da indústria transformadora do sul da China, com ligações por terra e mar.

Com os salários chineses em subida, o Vietname passa a ser o substituto óbvio para as empresas que se deslocam para destinos de sourcing de custo mais baixo.

A população relativamente jovem é outro dos atrativos do Vietname. Na China, a idade média ronda os 36 anos, no Vietname ronda os 30,7. Em pouco tempo, a população vai começar a envelhecer mais rapidamente, mas a sua força de trabalho urbana tem muito espaço para crescer.

Sete em cada dez vietnamitas vivem no campo, número semelhante ao da Índia e em comparação com apenas 44% na China. A reserva de trabalhadores rurais deve ajudar a amortecer as pressões salariais, dando tempo ao Vietname para construir indústrias de trabalho intensivo, uma necessidade para uma geografia que alberga quase 100 milhões de pessoas. A força de trabalho do Vietname não é apenas jovem, é experiente. O investimento público em educação é de cerca de 6,3% do PIB, dois pontos percentuais a mais do que a média dos países de baixos e médios rendimentos.

Em termos de poder local, já desde o início dos anos 1990 que o governo vietnamita tem favorecido o comércio e investimento internacionais. Esta atuação tem dado a confiança necessária às empresas estrangeiras que ali vão erguendo fábricas. Os investidores estrangeiros são responsáveis por um quarto dos gastos anuais de capital.

Os investidores beneficiam da estabilidade de um planeamento a longo prazo, tal como acontece na China, que tem apresentado exigentes planos quinquenais para o desenvolvimento. Tal como na China, o governo vietnamita deixa espaço para inovação: as 63 províncias competem entre si para atrair investidores.

Um modelo de desenvolvimento de parques industriais com financiamento e gestores estrangeiros começou em Ho Chi Minh City em 1991 e, desde então, tem sido replicado noutras localizações.

No topo desta sólida base, o país tem ainda vindo a colher os benefícios dos acordos comerciais que vai firmando. Espera-se que o Vietname seja o maior beneficiário da Parceria Trans-Pacífico (TPP), um acordo de 12 países que inclui EUA e Japão. À luz das últimas notícias, há risco de que o TPP possa falhar, mas mesmo que isso aconteça, aponta a The Economist, o Vietname vai prosperar – o TPP já ajudou a anunciar todo o seu potencial. E há outros acordos importantes: um pacto de comércio livre com a União Europeia está em andamento e outro com a Coreia do Sul entrou em vigor em dezembro.

No entanto, o Vietname também enfrenta uma série de desafios capazes de travar a sua expansão. Os excessos especulativos do passado ajudaram a alimentar uma bolha imobiliária, que rebentou em 2011, encerrando bancos com dívidas incobráveis. O Vietname criou um “banco mau” para abrigar os empréstimos fracassados e começou a limpar os seus bancos. No entanto, a injeção de capital novo nos bancos tem tardado.

Há, também, uma área crucial na qual o país perde para a China: tirar o máximo de partido do sector privado. No Vietname a produtividade do sector privado tem caído ao longo da última década para o nível de 0,7, o mesmo nível das estatais, segundo o Banco Mundial.

Além disso, embora o Vietname beneficie de investimentos estrangeiros, apenas 36% das suas empresas estão integradas em indústrias de exportação, em comparação com quase 60% na Malásia e na Tailândia, de acordo com o Banco Asiático de Desenvolvimento.

Ainda assim, há razões para um otimismo prudente. O Ministério do Planeamento e Investimento vietnamita, em parceria com o Banco Mundial, divulgou uma estratégia de mudança no início deste ano. O relatório conjunto, denominado “Vietname 2035”, detalha como o país pode tornar as empresas públicas mais comerciais e revigorar o sector privado.

A debilidade das finanças públicas – o défice fiscal deverá representar mais de 6% do PIB pelo quinto ano consecutivo em 2016 – está também a exercer pressão sobre o governo. Para reforçar as receitas, o governo vendeu ações em mais de 200 empresas estatais no ano passado, o que animou os investidores, esperançosos de que esta atuação tenha réplicas.